Sexta-feira, 29 de Março de 2024

O exótico vinho Jerez!

2020-03-07 às 18:53

Trata-se de um vinho raro e, em minha opinião, também exótico! O vinho Jerez é genuinamente espanhol, tem uma história de mais de 2.000 anos. É produzido na região sul do país e apresenta peculiaridades que o distingue de outros vinhos, pois é fortificado e, em seu processo de elaboração, a fermentação da uva é interrompida com a adição de álcool vínico. Desta forma, o mosto[1] atinge um determinado grau alcoólico e mata as leveduras, o que mantém maior quantidade de açúcar residual proveniente da própria uva. 

Nesta semana, a convite da Família Scopel Cave & Empório, participei de uma Wine Experience na qual contamos com a presença do advogado e sommelier Eduardo Paes de Andrade – consultor de portfólio da Inovini Vinhos Finos – para um encontro de degustação com vinhos Jerez.  Na oportunidade foram degustados rótulos do estilo fino, oloroso e cream.

Confira no link abaixo o vídeo com Eduardo:

Todos os tipos de  Jerez vêm da mesma localidade: uma área demarcada ao sul da Espanha, na região da Andaluzia, nas cidades de Jerez de la FronteraSanlúcar de Barrameda e El Puerto de Santa Maria, bem próximas ao litoral. É, portanto, uma “Denominação de Origem”, chamada de Jerez – Sherry – Xérèz, reservando os nomes em espanhol, inglês e francês, respectivamente. É uma região quente, com invernos amenos e verões calorosos, com pouca chuva, mas com muita influência oceânica, que mantém alta umidade do ar e traz uma sensação salina a esses vinhos. O solo da região é chamado de albariza, um solo branco, composto majoritariamente de cálcio. As chuvas se concentram na primavera, e esse solo retém muita umidade, armazenando água para as videiras ao longo do verão.

Todos os Jerez são feitos de uvas brancas e a mais emblemática delas é a Palomino. Ela gera um vinho quase incolor, e sem muita acidez. Ela é sempre fermentada até o final, o que resulta em estilos secos (chamados de generosos). As outras duas variedades permitidas são a Moscatel e a Pedro Ximenes, que em Jerez são passificadas[2] para a produção de vinhos doces, com a fermentação interrompida no início do processo, retendo quase todo o açúcar das uvas. Em Jerez, esses vinhos são chamados de dulces naturales.

Outra característica importante do Jerez é o amadurecimento do vinho. Eles normalmente amadurecem em um sistema chamado de criaderas y solera. Esse sistema consiste em fileiras de barricas empilhadas, em que cada fileira é chamada de criadera; e a última (mais próxima ao solo) é a solera. Vinhos novos (recém-fermentados) são sempre adicionados na criadera do topo, e o vinho a ser engarrafado é sempre retirado da solera. No entanto, a solera nunca é esvaziada de uma vez. Retira-se apenas uma pequena parte e, na seqüência, ela é reabastecida com vinho da criaderaimediatamente acima, que, por sua vez, é reabastecida com o vinho da criadera acima, e assim por diante.

O tempo mínimo de envelhecimento é de 2 anos, mas há soleras produzindo vinhos com muito mais idade. Como há uma mistura constante de vinhos, a idade média é calculada pela quantidade de criaderas, e pela freqüência com que ocorre a saca (retirada de vinho para engarrafamento). Existem diversos estilos de Jerez, totalmente diferentes entre si. Podem ser totalmente secos, totalmente doces, totalmente oxidados, ou criados em um processo raríssimo, chamado crianza biológica. E podem ainda ser uma combinação desses fatores. Veja a seguir dois processos importantes para a produção dos vinhos Jerez.

Crianza Oxidativa

Eduardo Paes de Andrade – Sommelier

crianza oxidativa trata-se de um amadurecimento com intenso contato com oxigênio, o que causa a oxidação do vinho. Não é exatamente uma exclusividade do Jerez, é o mesmo processo dos vinhos Madeira, Marsala, e Porto Tawny, para citar apenas alguns exemplos mais famosos. No caso do Jerez, são usados barris de 600L, que, no entanto, são preenchidos apenas com 500L de vinho, deixando um espaço de 1/6 do barril repleto de oxigênio. Isso gera uma oxidação intensa e completa, resultando em vinhos de cor âmbar, e aromas que lembram frutas secas tostadas.

A flor e a crianza biológica

A maior singularidade dos vinhos de Jerez é o processo chamado de crianza biológica. Neste caso, forma-se uma camada de leveduras sobre o vinho. Essa camada é chamada de flor, e ela não é inoculada: o bodeguero (o responsável pela produção) precisa prover as condições para que ela se desenvolva naturalmente. Esse processo só é aplicado nos vinhos secos, totalmente fermentados. O bodeguero fortifica o vinho até 15% de álcool, e o coloca em barris, sempre deixando 1/6 do volume vazio. Esse espaço é fundamental para que se forme a flor.

Quando ela se forma, ela protege o vinho do contato com o oxigênio. Isso significa que não há oxidação, e a cor do vinho permanece um amarelo-palha bem claro, às vezes, quase incolor. Mas o mais importante é que a flor se alimenta de álcool e glicerina, presentes no vinho, e libera substâncias aromáticas, que dão um aroma muito peculiar, lembrando massa de pão crua, fermento de pão, ou ainda maçãs vermelhas.

Apenas vinhos AmontilladosOlorososPalo Cortados ou Pedro Ximénez podem ter safra ou indicação de idade. Para Finos, não é possível.

Fonte:  Eduardo Paes de Andrade e o site Sobre Vinhos e Afins.


[1]  Todo tipo de mistura açucarada destinada à fermentação alcoólica.

[2]  Consiste na desidratação da fruta para aumentar a concentração de açúcar.

Vinhos & Viagens

por Patrícia Ecave

Patrícia Ecave é jornalista, digital Influencer e sommelière paranaense. Trabalhou com radiojornalismo, assessoria de imprensa, eventos, produção de vídeos, funcionalismo público, gestão administrativa e gestão de pessoas. Realizou viagens enogastronômicas e cursos no país e no exterior, como Vale dos Vinhedos, Cone sul e Europa. Organiza workshops, cursos, jantares harmonizados, treinamento de equipes e consultoria geral. Escreve sobre viagens, vinhos e gastronomia.