Sábado, 14 de Dezembro de 2024

Coluna Lettera: ‘Como nascem os leitores’, por Francielly da Rosa

2021-11-14 às 14:44

Como‌ ‌nascem‌ ‌os‌ ‌leitores‌ ‌

‌Aquele‌ ‌lugar‌ ‌parecia‌ ‌verdadeiramente‌ ‌um‌ ‌pedaço‌ ‌do‌ ‌céu‌ ‌na‌ ‌Terra. Lembro-me‌ ‌da‌ ‌sensação‌ ‌do ‌encantamento‌ ‌e‌ ‌da‌ ‌calma‌ ‌que‌ ‌repousava‌ ‌sobre‌ ‌nós.‌ ‌Lá‌ ‌tudo‌ ‌era‌ ‌real,‌ ‌os‌ ‌livros‌ ‌ganhavam‌ ‌vida,‌ ‌as‌ ‌fantasias‌ ‌e‌ ‌sonhos‌ ‌se‌ ‌realizavam,‌ ‌as‌ ‌tintas‌ ‌coloriam‌ ‌os‌ ‌papéis‌ ‌e‌ ‌também‌ ‌as‌ ‌almas‌ ‌infantes.‌ ‌A‌ ‌infância‌ ‌tem‌ ‌mesmo‌ ‌esse‌ ‌doce‌ ‌sabor‌ ‌de‌ ‌tudo‌ ‌o‌ ‌que‌ ‌é‌ ‌bom,‌ ‌porém,‌ ‌lá‌ ‌era‌ ‌especial‌, pois, ‌sentíamo-nos ‌em‌ ‌casa.‌ ‌

Os‌ ‌livros‌ ‌nas‌ ‌prateleiras‌ ‌tinham‌ ‌algo‌ ‌excepcional‌ ‌e‌ ‌indescritível. ‌Num ímpeto, tomávamos à mão um exemplar, folheando as páginas vagarosamente, depois nos acomodávamos nas almofadas que preenchiam o chão da sala, e, ali, permanecíamos extasiados.‌ ‌

As‌ ‌palavras‌ ‌soavam‌ ‌como‌ ‌doces‌ ‌melodias‌, pairando ‌sobre‌ ‌nossas‌ ‌cabeças‌ ‌como‌ ‌pequenos‌ ‌pássaros.‌ ‌De‌ ‌repente‌, víamo-nos ‌sobre‌ ‌alvas‌ ‌e‌ ‌macias‌ ‌nuvens,‌ ‌enquanto‌ ‌pequenos‌ ‌pontos‌ ‌luminosos‌ ‌nasciam‌ ‌das‌ ‌páginas‌, ‌percorriam‌ ‌o ambiente, ‌até‌ ‌repousarem‌ ‌no‌ ‌coração‌ ‌de‌ ‌alguma‌ ‌criança, fazendo despertar ‌um‌ ‌pequeno‌ ‌leitor.‌ ‌ ‌

As paredes da sala de leitura revestiam-se com a ternura e brilho infantil, e, todos, mesmo aqueles que não sabiam ler, sentiam-se acolhidos pela amabilidade das palavras da querida Lucélia Clarindo — coordenadora daquele pequeno grupo, conhecido como ‘Bando da Leitura’. Se‌ ‌existem‌ ‌diferentes‌ ‌formas‌ ‌de‌ ‌se‌ ‌tornar‌ ‌leitor,‌ ‌essa‌ ‌é‌ ‌a‌ ‌mais‌ ‌doce‌ ‌que‌ ‌experimentei!‌ ‌

Há leitores que nascem em casa, através do incentivo dos familiares, outros em bibliotecas, escolas, ruas etc. A verdade é que todos somos leitores, ainda que não tenhamos o hábito, pois, desde a tenra idade, aprendemos a ler o mundo, seja em imagens ou palavras.

Trago estas saudosas memórias, e, hoje, emociono-me ao ver outras crianças experimentarem a magia daquela pequena, mas, ao mesmo tempo, tão grande sala de leitura. Por um instante retorno aos meus oito anos, vejo-me diante daquele pequeno grupo, com os olhos maravilhados e a ânsia em desbravar o mundo através das páginas dos livros que encontrávamos lá.

Naquele tempo, não compreendia a importância daquele projeto, que, além de incentivar o hábito da leitura através de atividades lúdicas, construiu valores, além de viabilizar o acesso à literatura para muitas crianças que não tinham essa oportunidade.

Assim como as flores colorem a primavera, o Bando da Leitura coloriu e significou as páginas do livro de minha vida, fomentando em mim a vontade de fazer das palavras abrigo, barco com o qual navegarei e explorarei o mundo, levando sempre comigo esta belíssima história!

Coluna Lettera

por Francielly da Rosa

Francielly da Rosa é graduada em Letras Português e Inglês pela Universidade Estadual de Ponta Grossa. Atualmente, é mestranda do Programa de Pós-graduação em Estudos da Linguagem, com ênfase em estudos literários, também na UEPG. Ela é escritora, cronista e coautora do livro "Crônicas dos Campos Gerais". Descobre, entre as palavras que lê e escreve, a motivação que sustenta seu viver. Escreve crônicas, contos, poesias e, às vezes, se aventura no gênero romance. Além disso, participa de projetos de incentivo à leitura e de outras atividades culturais. Possui diversas crônicas premiadas e publicadas em jornais e sites locais. Em virtude de seu trabalho como escritora, recebeu duas moções de aplauso da Câmara Municipal de Ponta Grossa. Também foi premiada no Festival Literário de São Caetano do Sul, na categoria miniconto, sendo a única representante da cidade de Ponta Grossa.