Sábado, 24 de Maio de 2025

Coluna Draft: ‘A Volta à Quadrilha!’, por Edgar Talevi

2022-07-13 às 10:59

Sim, prezados leitores. Estamos de volta à Quadrilha, mas isso não é nada ruim, tampouco indigesto, como queiram pensar alguns. Tudo porque, segundo consta dos anais da Literatura Brasileira, a Quadrilha é uma genial invenção de um de nossos maiores poetas, a saber, Carlos Drummond de Andrade. Então, vamos a ela:

 

 

João amava Teresa que amava Raimundo
que amava Maria que amava Joaquim que amava Lili
que não amava ninguém.
João foi pra os Estados Unidos, Teresa para o convento,
Raimundo morreu de desastre, Maria ficou para tia,
Joaquim suicidou-se e Lili casou com J. Pinto Fernandes
que não tinha entrado na história.

Publicado em 1930, o poema acima representa a genialidade de um mago dos sentidos humanos, bem como um sensacional fenomenólogo que experienciou a arte e a cultura como poucos de sua época e, por que não dizer, a posteriori?!

Mas, afinal, em nosso contexto, no que tange a este artigo, o que vem a ser o sintagma que dá título ao texto?

Percebemos que a aprendizagem observa os sentidos como um todo. Quando aprendemos e apreendemos, voltamo-nos a nós mesmos in natura. Ao fenômeno da abstração, da subjetividade, do empirismo, da anarquização de ‘pré-conceitos’, do niilismo que ruptura as acéfalas decorebas de uma vida insossa e dos malabarismos ideológicos que, de tantos ismos, valem menos do que dizem ser, podemos chamar de “A Volta à Quadrilha”.

Um retorno ao pensamento arraigado no patamar do transcendente, do empírico, do filosófico, sem perder o equilíbrio do método e da técnica que dão rigor científico à objetividade acadêmica é que se estabelece, nas veias da Educação Brasileira, a volta a essa quadrilha que, metaforicamente, representa o trato ensino-aprendizagem com foco na construção de processos civilizatórios capazes de dirimir equivocidades e perpassar o conhecimento pela valorização do humano, do verdadeiro objeto máximo de conhecimento, que é a verdade.

Destarte, por que é tão impávido este retorno colossal às nuances mais performáticas da educação? A resposta está na crise da Pandemia da COVID-19, que arrebatou nossos estudantes das salas de aula, bem como outorgou a esses a pecha de descobridores de novos mares, no entanto, mares estes acidentados geograficamente, com turbulentas ondas de intempéries, quais sejam, a discrepância entre quem tem e quem não tem recursos basais de acesso a ferramentas tecnológicas que permitam plena navegação pelos oceanos dos componentes curriculares propostos nas escolas nada convidativas e pouco inclusivas.

Para efeito de análise, segundo o INEP, o Brasil registrou uma média de 279 dias de suspensão de atividades presenciais durante o ano letivo de 2020 somente. Sem levar em conta a continuidade da Pandemia, só esses números já servem de base para que voltemos o olhar para o desarraigamento da construção de conhecimento e a falta de perspectiva que muitos que estiveram à margem de todo o processo de Educação a Distância sofreram.

Ainda segundo o INEP, o rendimento educacional dos alunos brasileiros decaiu significativamente. Em Matemática, a queda foi de 17%. Já em Português, chegou ao patamar de 38%.

O período que vivemos, a que costumamos chamar de Pós-pandêmico, elevou os números devido às provas de análise que cada Estado atribuiu aos seus alunos, mas, em uma prévia, fez-se ainda mais ensoberbada a diferença entre ensino público e privado no Brasil, em que as diferenças se somaram ao déficit de igualdade de condições e estrutura de ferramentas que propiciem maiores oportunidades de aprendizagem a todos.

De acordo com o renomado escritor e apologeta cristão, C. S. Lewis, em sua obra “A Abolição do Homem”: “O que chamamos de poder do homem é, na realidade, o poder que alguns homens possuem de permitir, ou não, que os outros obtenham lucro. Lewis segue na linha da construção do espaço do homem quanto à sua ocupação da Natureza, sendo que esta é, segundo o autor, instrumento dos que possuem maior poder aquisitivo ou melhores condições de conquista.

Porém, existe um caminho que está sendo seguido no mundo Pós-pandêmico: a volta à Quadrilha. A Educação brasileira precisa alinhavar seus passos rumo à uniformização de oportunidades entre o público e o privado antes de desmerecer o público pela discussão da meritocracia vazia e ideologicamente firmada.

Voltar à quadrilha é, neste contexto, retornar às origens artísticas, culturais e subjetivas, das quais emanam abstrações e fenomenologias empíricas capazes de promover o homem a um ser humano espiritualizado consigo e com o próximo.

Não obstante, para quem duvidar do poder da subjetividade, da arte e da cultura, pelas próprias palavras de Carlos Drummond de Andrade, proponho uma reflexão. E se o introito deste texto fosse:

No meio do caminho tinha uma pedra
Tinha uma pedra no meio do caminho
Tinha uma pedra
No meio do caminho tinha uma pedra
Nunca me esquecerei desse acontecimento
Na vida de minhas retinas tão fatigadas
Nunca me esquecerei que no meio do caminho
Tinha uma pedra
Tinha uma pedra no meio do caminho
No meio do caminho tinha uma pedra
???

Coluna Draft

por Edgar Talevi

Edgar Talevi de Oliveira é licenciado em Letras pela UEPG. Pós-graduado em Linguística, Neuropedagogia e Educação Especial. Bacharel e Mestre em Teologia. Atualmente Professor do Quadro Próprio do Magistério da Rede Pública do Paraná, na disciplina de Língua Portuguesa. Começou carreira como docente em Produção de texto e Gramática, em 2005, em diversos cursos pré-vestibulares da região, bem como possui experiência em docência no Ensino Superior em instituições privadas de Ensino de Ponta Grossa. É revisor de textos e autor do livro “Domine a Língua – o novo acordo ortográfico de um jeito simples”, em parceria com o professor Pablo Alex Laroca Gomes. Também autor do livro "Sintaxe à Vontade: crônicas sobre a Língua Portuguesa". Membro da Academia Ponta-grossense de Letras e Artes. Ao longo de sua carreira no magistério, coordenou inúmeros projetos pedagógicos, tais como Júri Simulado, Semana Literária dentre outros. Como articulista, teve seus textos publicados em jornais impressos e eletrônicos, sempre com posicionamentos relevantes e de caráter democrático, prezando pela ética, pluralidade de ideias e valores republicanos.