No dia 25 de setembro é comemorado o Dia Internacional do Farmacêutico, profissional que, em 130 diferentes áreas de atuação, garante prevenção, cuidado, suprimento de produtos para a saúde, diagnóstico e apoio ao tratamento, além de contribuir nas pesquisas da vacina e da cura, segundo destaca o conselho da categoria. O presidente da Associação Ponta-Grossense de Farmacêuticos (Asponfar), José dos Passos Neto destacou o papel que esse profissional exerce diante da sociedade, em entrevista ao programa Manhã Total, apresentado por João Barbiero, na Rádio Lagoa Dourada FM (105,9 para Ponta Grossa e região e 90,9 para Telêmaco Borba), desta segunda (26).
Conforme o professor Everson Krum, duas datas são comemoradas no Brasil. Além do dia internacional, tem o Dia Nacional do Farmacêutico, fixado em 20 de janeiro, porque os profissionais do Rio de Janeiro, antiga capital do país, teriam estabelecido aproveitando o feriado de Sáo Sebastião, padroeiro da cidade.
O presidente da Asponfar já foi dirigente estadual e presidente do Conselho Regional de Farmácia do Paraná. É servidor de carreira, da Secretaria de Estado da Saúde (SESA), com atuação junto à Central de Medicamentos do Paraná.
Neto relembra as lutas da categoria por representatividade e para ocupar um espaço de direito dentro das farmácias. Segundo ele, nos anos 1970, a figura do farmacêutico apenas assinava como responsável para o estabelecimento ter permissão de funcionar, mas quem atuava no balcão era um comerciante. “Nessa época, apareceram colegas farmacêuticos que ficavam nas suas farmácias e que ficaram famosos, pois não existia um sistema de saúde adequado. Então, eles eram os ‘doutores'”, ressalta.
Entre eles, Neto cita Herculano Lisboa, Horácio Droppa e Sadi Ajuz Calil. “Eles se tornaram famosos porque eram poucos que exerciam a profissão. As décadas de 1970 e 1980, que eu vivi, foram muito difíceis para a profissão”, aponta.
O presidente da Asponfar conta que chegou a atuar no balcão por sete anos, quando foi proprietário de uma farmácia, no bairro de Oficinas. Ele se formou em 1981 e nos primeiros sete anos teve essa farmácia. Nessa época, o farmacêutico tinha o poder de dispensar o medicamento e fazer uma “consulta farmacêutica” ao paciente que chegava ao balcão.
Neto observa que, hoje, a legislação determina a obrigatoriedade de que, durante todo o horário de funcionamento, haja no mínimo um farmacêutico de plantão. “Hoje, algumas farmácias já notam que um só não mantém o estabelecimento funcionando da maneira adequada”, salienta.
Conforme o presidente da Asponfar, existe o costume da população de, muitas vezes, procurar a farmácia antes mesmo de ir à Unidade de Saúde. Cumpre ao farmacêutico, nesse caso, duas opções. A primeira é, a partir de uma entrevista chamada de “consulta farmacêutica”, dispensar a medicação que pode “facilitar a vida” do paciente. “Tanto que temos os medicamentos isentos de prescrição [médica]”, complementa. A segunda opção é encaminhar o paciente ao médico.
“Em cada farmácia vai ter um profissional formado numa universidade, no curso de Farmácia, que tem a capacidade de avaliar esses sintomas”, diz.
O professor Everson Krum aponta que, muitas vezes, o sistema público de saúde e até o privado favorecem esse comportamento do paciente, de ir direto ao local onde se vende o medicamento antes de consultar um médico. “A população não tem acesso a ir a um local e ter médico e consulta de imediato. Demora. Ela, naturalmente, vai procurar a farmácia”, avalia.
Neto considera que o poder público aproveita muito pouco o potencial das farmácias, nas três esferas, tanto pelo Ministério quanto pelas Secretarias Estadual e Municipal de Saúde. “Ainda não tem o entrosamento necessário. Ainda poderia existir o encaminhamento desse farmacêutico, uma super triagem que pularia etapas dentro de uma unidade de saúde”, diz.
Nesse sentido, já existe, através do Conselho Federal de Farmácia, um encaminhamento junto ao Ministério de Saúde para fazer com que esse procedimento possa existir. Segundo o presidente da associação da categoria, espera-se que, dentro do programa Farmácia Popular, o farmacêutico possa fazer o acompanhamento dos pacientes crônicos – hipertensos e diabéticos – por exemplo, para fazer seu encaminhamento ao médico quando ocorresse alguma alteração, seja da pressão arterial, seja da glicose, observar se o paciente está cumprindo uma dieta prescrita, enquanto a receita médica estiver dentro da validade de seis meses.
“Se ele não está fazendo o que o médico determinou, volta para o médico, senão, acompanharia por seis meses. Seria um grande alívio para o sistema de saúde, privado e público”, acredita.
Farmácia Solidária
No Rio Grande do Sul, um projeto de lei da deputada estadual Francis Somensi criou a Farmácia Solidária, que redistribui medicamentos que sobraram, de quem encerrou algum tratamento, para quem não pode pagar por eles, em vez de descartá-los. Iniciativa similar existe em Ponta Grossa, ainda como uma ação social e não um programa instituído em lei, na Paróquia São José, onde há a Farmácia da Partilha. Outros municípios têm ações parecidas.
“Como farmacêutico, garanto o medicamento na farmácia até a hora que eu o entrego. Se a pessoa levou para casa e conservou da maneira mais correta possível e ela retorna para a Farmácia Solidária, tudo bem”, comenta Neto, que também atuou na Vigilância Sanitária.
Neto considera que, por um lado, existe a questão técnica da conservação adequada dos medicamentos para garantir sua eficácia. Por outro, somos um país pobre, em que muitas pessoas têm dificuldade de acesso a medicamentos e essa redistribuição é a única alternativa.
“Um papel muito importante dos farmacêuticos é não deixar vencer o medicamento. Desde que sai da indústria para a distribuidora e da distribuidora para a farmácia, deve garantir que tenha o prazo de validade correto. Se vencer na prateleira ou na distribuidora, é perda para indústria, é uma perda econômica e uma perda para a população, porque ela não recebeu esse medicamento”, frisa.
Injeção
Questionado se farmacêutico pode aplicar injeção, Neto responde que a Lei 5991/1973 dá a ele essa atribuição. A lei dispõe sobre o Controle Sanitário do Comércio de Drogas, Medicamentos, Insumos Farmacêuticos e Correlatos.
O professor Everson Krum explica que hoje existem algumas restrições diante do risco de reações que a injeção pode ocasionar. “Os órgãos de controle têm protocolos que pedem que a farmácia tenha cuidados e que tenha as condições para dar atendimento se a pessoa tomar a injeção e tiver uma reação, pois pode não dar tempo de chamar outro serviço. A regulamentação sobre isso é que faz com que, às vezes, algumas farmácias tenham a opção de não aplicarem injeção”, justifica.
Neto acrescenta que a aplicação de injeções é um serviço que pode ser oferecido numa farmácia, mas que não é obrigatório que ela disponha desse expediente. “Antes não existia o SUS, então, se recorria às farmácias e o farmacêutico, dentro de sua ética profissional, assumia a responsabilidade de aplicar”, afirma.
Novas regras impostas acerca de cada tipo de injetável “retraiu” o farmacêutico que, de forma ética, acaba se recusando a aplicar pela falta de determinadas condições hoje exigidas.
Genéricos
Outra realidade que mudou, com o tempo e o avanço da ética profissional, é a prática antiga de donos de farmácia determinarem ao farmacêutico que batessem cotas de vendas, o que os impelia a “empurrar” para o cliente medicamentos de marcas previamente definidas. A própria regulação do mercado limitou essa prática, ainda mais depois que surgiu a opção do medicamento genérico.
Sobre o medicamento genérico, o professor Everson Krum reforça que o efeito é o mesmo, independente do laboratório que o produz. O que ocorre é que um laboratório determinado se debruça a pesquisar uma nova fórmula e registra a patente. Durante um tempo, esse laboratório tem o direito de explorar comercialmente essa fórmula com exclusividade, mas depois precisa dividir com os demais laboratórios, para fabricarem a fórmula genérica, com o mesmo princípio ativo. Na Inglaterra, o período de patente é de cinco anos, ao passo que, no Brasil, é de 15, compara Neto.
“O custo dele vai ser menor, porque não foi ele que desenvolveu, não foi ele que pesquisou, então o valor acaba sendo mais baixo”, explana Krum. O laboratório original passa a ter exclusividade apenas da marca ou patente do medicamento, não da comercialização de seu princípio ativo.
O presidente da Asponfar ressalta que a diferença entre o genérico e o medicamento referência é apenas o preço, porque a ação é a mesma. Ele também salienta que o medicamento genérico ajudou a desenvolver a indústria farmacêutica brasileira, pois, até 1999, quando ele foi criado, o que havia era a multinacional trazer uma fórmula desenvolvida fora do país para ser meramente embalada no Brasil, com uma bula em português.
Neto pontua que, ao longo da pandemia, uma importante atuação do farmacêutico foi o de servir de “barreira” contra a automedicação, provendo explicações e informações adequadas, uma vez que muita gente acaba recorrendo ao “Dr. Google” – o que não deve ser feito.
Redes farmacêuticas
Segundo o presidente da Asponfar, 30% do mercado está nas mãos de redes de farmácias e os outros 70% correspondem a farmácias isoladas ou associativas. “Ainda temos no Brasil e em Ponta Grossa esses 70% de pequenas farmácias. Acho que essas pequenas farmácias são mais importantes para o mercado, porque são isoladas e estão nos bairros. No centro se concentram as redes. Elas são de propriedade de farmacêuticos e geram uma economia para aquela família e para os poucos balconistas. Gera uma situação econômica mais favorável do que as redes, que vão fazer uma concentração”, compara.
Nos Estados Unidos, o dado se inverte, 70% são farmácias de rede, as famosas drugstores, como a Walgreens, a CVS e a Duane Reade – que são mais uma loja de conveniência que também vende remédio do que uma farmácia propriamente dita.
Confira a íntegra da entrevista: