Criada há quase cinco anos, a base aeromédica de Ponta Grossa opera através da equipe do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU), médicos e enfermeiros e com os pilotos do Batalhão da Policia Militar de Operações Aéreas (BPMOA). A unidade atua no resgate de acidentados, pacientes infartados, nascimentos prematuros, transferências de pacientes de toda a região, como por exemplo, Ponta Grossa, Irati, Guarapuava e Telêmaco Borba.
Em participação durante o programa Manhã Total, apresentado por João Barbiero, na Rádio Lagoa Dourada FM (105,9 para Ponta Grossa e região e 90,9 para Telêmaco Borba), desta terça (19), o médico Rafael Brandão revelou bastidores do atendimento de pacientes transportados pelos helicópteros.
Além de atuar como médico do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU), Rafael Brandão é também especialista em cirurgia vascular pela Santa Casa de Misericórdia de Ponta Grossa.
Atuar no serviço aeromédico, segundo Brandão, não foi algo “planejado”, pois na época em que ele cursou Medicina, ainda não se vislumbrava essa possibilidade no mercado de trabalho, pois era um serviço ainda em estágio inicial no Brasil. O médico se formou no ano 2000 e optou, inicialmente, por seguir carreira na área cirúrgica, com especialização em cirurgia vascular e residência em cirurgia geral.
“Sempre trabalhei com Pronto Atendimento, Pronto Socorro, com o SAMU. Sou médico do SAMU há cerca de 13 anos”, conta. O Estado do Paraná implantou uma unidade aérea pública, operada pela ANAC (Agência Nacional de Aviação Civil), que firmou parceria com os SAMUs Regionais. Hoje, o Paraná conta com cinco bases e a da região dos Campos Gerais é a de criação mais recente. As outras quatro ficam em Curitiba, Cascavel, Londrina e Maringá e estão posicionadas de forma estratégica.
“Em determinado momento, começamos um processo de capacitação para esse pessoal tripular essas aeronaves. Vi ali uma oportunidade e me interessei, porque sempre gostei de trabalhar com urgência e fiz os cursos necessários”, relata o médico.
Nessa preparação, os profissionais se submeteram, inclusive, a treinamento de rapel, porque precisam estar prontos para situações de resgate de pacientes em locais de difícil acesso. “Aprendemos uma série de técnicas de resgate e socorro, mas são coisas usadas mais raramente dentro de nossa atividade”, pontua.
A maior parte dos atendimentos prestados pelo serviço aeromédico, conforme Brandão, envolve a transferência do paciente de uma Unidade de Terapia Intensiva (UTI) para outra. “Temos que entender o helicóptero como uma ambulância avançada. Ele é uma UTI completa, tem toda a aparelhagem necessária, mas é um ambiente confinado. Temos um tempo exíguo para atuar. Não conseguimos manter o paciente por muito tempo lá, mas ele dá o suporte necessário para fazer o transporte”, explica.
A atuação do serviço aeromédico, em menor escala, engloba também o resgate de acidentados em avenidas, rodovias e em locais de difícil acesso. “A grande vantagem do helicóptero é a rapidez do atendimento e a possibilidade de levar o recurso que aquele paciente necessita – que, de maneira terrestre, demoraria muito – e ganhar tempo nesse transporte, minimizando o risco do transporte”, comenta.
Nesses resgates em locais de difícil acesso, o médico relata que já houve casos de a equipe precisar descer encosta, mata adentro, por horas, para conseguir resgatar pessoas feridas durante a prática de trekking (trilha) e escalada.
Encurtar distâncias e agilizar atendimento
O raio de ação da Base Campos Gerais do serviço aeromédico atende não só a Ponta Grossa, mas também a cerca de 57 municípios abrangidos por outras Regionais de Saúde, como a de Guarapuava, a de Irati e a de Telêmaco Borba e envolve uma equipe de cerca de 15 profissionais. “O helicóptero tem uma autonomia que ele pode fazer cerca de 250 quilômetros, ida e volta, sem precisar de um reabastecimento. Se fizer um círculo no mapa, vai ver que é um raio de atividade bem grande e esses círculos dessas bases se interconectam”, destaca.
Brandão relata que, recentemente, esse raio de atuação de 250 quilômetros da base foi ultrapassado quando foi necessário transferir um paciente para uma UTI em Cascavel. Em linha reta, a distância entre Ponta Grossa e Cascavel é de mais de 330 quilômetros.
Conforme o caso, esse transporte aeromédico pode ocorrer diante da necessidade de “repatriamento” de um paciente. Por exemplo, se uma pessoa sofre um acidente e já foi estabilizada em um hospital, há a possibilidade, de acordo com as circunstâncias, de que ele seja transferido para um hospital mais perto de casa, desde que atendidas todas as condições necessárias de suporte à vida.
Brandão frisa que é necessário entender a rede hospitalar de forma mais complexa. “Você não vai ter todos os recursos em todos os lugares. Conforme o nível de complexidade, existem algumas demandas de pacientes do interior serem transferidos para regiões de maior complexidade dentro da rede.
Diante de ocorrências cardiovasculares, como um acidente vascular cerebral (AVC) ou infarto agudo do miocárdio (AVC), o acionamento do atendimento aeromédico vai depender da distância. “Normalmente, algum solicitante no local vai entrar em contato pelo 192, cai dentro da Regulação, que analisa os recursos que ela tem dentro da rede. Às vezes, dependendo da distância, uma ambulância terrestre, se estiver próxima, é até mais rápida. Mas ela vai avaliar os recursos que tem e encaminhar uma equipe para lá. Superando os 40 quilômetros, que é um número que consideramos um divisor de águas, já vale a pena acionar o helicóptero”, explica.
No caso de acidentes de automóvel com vítimas presas às ferragens, cabe aos bombeiros ou às concessionárias fazer o primeiro atendimento, com as viaturas ABTR (auto bomba tanque e resgate), pois o serviço aeromédico não dispõe de desencarceradores e motosserras, uma vez que há limite de peso para o helicóptero transportar. “Por isso, trabalhamos em sinergia e tudo é acionado ao mesmo tempo”, ressalta.
Segundo Brandão, o “cérebro” do SAMU é a Regulação, que vai avaliar os recursos disponíveis e necessários, por exemplo, para o atendimento de múltiplas vítimas. “Normalmente, vai encaminhar mais de um recurso e, se necessário, pedir apoio, seja para a Polícia, seja para os Bombeiros”, frisa.
Imprevistos
Já ocorreu, no entanto, de a aeronave não conseguir decolar e retornar para sua base após um atendimento, relata o médico. “Usamos um [helicóptero] monoturbina, com um único piloto e temos algumas limitações de navegabilidade. Uma delas é que não podemos navegar por instrumentos, nem à noite. Não existe essa opção. O voo é totalmente visual”, explica.
Entre as situações que mais atrapalham o retorno Brandão enumera as mudanças climáticas repentinas e o por-do-sol. “Nesse caso, a aeronave pousa onde está”, diz.
Porém, existe um planejamento para evitar essas situações. “A operação é muito dinâmica, muito rápida, principalmente para socorro, mas existe um briefing – uma reunião da equipe em que são passadas as condições meteorológicas, o que vai ser preciso ser feito. Isso acontece em segundos, minutos e aí se decide sobre a possibilidade ou não de realizar aquela missão”, detalha.
Qualificação
Os profissionais que prestam serviço aeromédico estão em constante aperfeiçoamento e passam por cursos anuais de reciclagem e aprimoramento. “Temos que fazer um curso que chama Operador de Suporte Médico. Não é um curso universitário. Ele é fornecido por facilitadores, que são agentes credenciados pela ANAC. Como unidade aérea, seguimos toda a legislação pertinente à aviação civil”, ressalta.
Confira a entrevista com o dr. Brandão na íntegra: