Quinta-feira, 12 de Dezembro de 2024

D’P Agro: O futuro é verde

2023-01-16 às 16:45
Foto: Reprodução

Amparados por leis, programas e práticas, produtores rurais investem em preservação ambiental e enxergam na sustentabilidade o futuro de seus negócios

Por Michelle de Geus

No momento em que você está lendo esta matéria, a população mundial já bateu a marca de 8 bilhões de pessoas, segundo estimativa da Organização das Nações Unidas (ONU). Se, por um lado, será preciso aumentar as produções do agronegócio para alimentar a população, por outro esse crescimento precisa ser sustentável. A preservação do meio ambiente, a proteção de nascentes e a manutenção da biodiversidade são temas que cada vez mais permeiam o dia a dia dos produtores rurais.

“Hoje, para o agricultor poder fazer um trabalho adequado na área de plantio, precisa ter áreas de preservação permanentes regularizadas e estar em dia com o licenciamento ambiental para o manejo de solo, sob pena de receber autuação ou multa”, explica a advogada e consultora ambiental Caroline Schoenberger, destacando que, nos últimos anos, surgiram iniciativas do poder público que oferecem pagamentos para os produtores rurais pelos serviços ambientais prestados e citando como exemplo os valores oferecidos aos que desenvolvem atividades de manutenção de nascentes.

Avanços legislativos

Na visão da advogada, houve um avanço legislativo com a elaboração de leis que beneficiam ainda mais os produtores rurais que atuam na preservação do meio ambiente. Entre elas, está a criação da Cédula de Produto Rural – Verde (CPR Verde), um título de crédito feito para financiar atividades de reflorestamento e a manutenção de vegetação nativa em propriedades rurais e que poderá ser comprado por empresas para a compensação de carbono.

A consultora explica que, na prática, esse é um instrumento de Pagamento por Serviços Ambientais (PSA), pois permite que o proprietário receba recursos financeiros pela preservação de nascentes e da biodiversidade, e pela redução de gases do efeito estufa, além de financiar atividades de manutenção de vegetação nativa ou de reflorestamento. O mecanismo já vem sendo utilizado no norte no Paraná, no Mato Grosso e em São Paulo.
Para conseguir o título de crédito, é necessário apresentar um projeto, assinado por um engenheiro especializado na área, que será submetido a uma avaliação. Além disso, o projeto também vai depender de certificação, similar às que atribuem o ISO para as empresas. “Se aprovado, você consegue o valor do financiamento. O juro é um pouco maior, uma média de 15%. Além disso, há a condicionante de você ter que fazer a renovação desse projeto, a atualização dele, para que se confirme que a área verde para a qual conseguiu a verba esteja de pé daqui a um, dois ou três anos”, detalha.

A advogada observa que o alto custo para realizar o levantamento pode ser um impeditivo para a adesão ao CPR Verde, sendo mais vantajoso para quem possui mais áreas verdes. Entretanto, Caroline alerta para a possibilidade de o proprietário rural transformar a CPR em moedas na Bolsa de Valores no futuro.

Adequações necessárias

A consultora menciona ainda que o ESG (sigla em inglês para Meio Ambiente, Social e Governança), que já é uma realidade na indústria e no comércio, também deve se fazer presente no agro. “É o politicamente correto e ambientalmente sustentável. Os produtores vão ter que estar adequados com o licenciamento ambiental, e, na parte social, esclarecer como está acontecendo o andamento da empresa voltado aos funcionários, clientes e fornecedores. Na parte de governança, terão que mostrar se a empresa está totalmente adequada”, observa.

A advogada recorda que a Europa não deve mais receber produtos da região amazônica que tenham sido cultivados em áreas não licenciadas e passará a exigir certificados de procedência. “Isso não vale apenas para os grandes proprietários de terra. O pequeno produtor rural também precisa se adequar a essas novas diretrizes ou o pessoal vai passar com um trator por cima e ele sairá do mercado. Ele não conseguirá, por exemplo, estar junto com os outros produtores dentro de uma cooperativa”, alerta.

Desafios futuros

Para o presidente do Sindicato Rural de Ponta Grossa, Gustavo Ribas Netto, os grandes desafios do agronegócio para o futuro próximo são dois: encontrar soluções para aumentar a produção sem perder de vista a sustentabilidade e transformar essas novas exigências do mercado em rentabilidade. O produtor aponta, como exemplo, que já elaborou um projeto de avaliação financeira do sequestro de carbono no plantio de soja, ou seja, do processo de retirada de gás carbônico da atmosfera. “Teoricamente, seria um projeto em que nós estaríamos comercializando aquela soja produzida naquele local que tem um diferencial. No caso, o produtor rural receberia um valor a mais pela qualidade ambiental durante o cultivo”, explica.

O presidente da entidade chama a atenção ainda para o fato de que algumas áreas de preservação ambiental correspondem a regiões onde o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) é muito baixo. Ele cita o distrito de Itaiacoca, em Ponta Grossa, como exemplo. “Lá o IDH é muito menor do que na cidade de Ponta Grossa. Como é que nós podemos conciliar a sustentabilidade se as pessoas que vivem nesses locais não têm qualidade de vida, infraestrutura e a valorização que merecem?”, questiona.

Ribas Netto enfatiza também que algumas das alternativas encontradas para explorar áreas verdes sem prejudicar o meio ambiente são o turismo rural e o oferecimento de incentivos para a preservação ambiental. “A terra é um ativo ambiental e turístico na essência, mas acho que precisamos avançar para que os produtores rurais possam explorar todos esses ativos”, acrescenta.

Selo regional

Como forma de demonstrar o compromisso com o futuro do planeta, Caroline sugere a criação de um selo regional para indicar a qualidade e valorizar a produção dos Campos Gerais, a exemplo do que já ocorreu com a erva-mate e os produtos orgânicos. “O pequeno produtor que tenha o selo de produção dos Campos Gerais, indicando que ele cumpriu certos requisitos, tem que ser valorizado dentro do mercado. Essa é uma das alternativas”, opina, salientando que o tema da sustentabilidade deve se tornar ainda mais primordial nos próximos anos.

Conteúdo publicado originalmente na Revista D’Ponta #293 Novembro/Dezembro de 2022.