Quarta-feira, 11 de Dezembro de 2024

Cortar feijão da dieta pode aumentar em 20% a chance de se desenvolver obesidade, revela estudo

2023-02-22 às 12:14

Uma pesquisa do Programa de Pós-graduação em Saúde Pública da Faculdade de Medicina da UFMG revela que deixar de comer feijão está associado ao ganho de peso. O estudo mostrou que o grupo que não consumiu o produto teve 10% mais chances de desenvolver excesso de peso e 20% mais chances de desenvolver obesidade. Por outro lado, o consumo regular de feijão, em 5 ou mais dias da semana, apresentou fator de proteção no desenvolvimento de excesso de peso (14%) e obesidade (15%).

Os dados foram desenvolvidos no doutorado da pesquisadora Fernanda Serra Granado, orientado pelo professor Rafael Moreira Claro. O intuito foi conhecer melhor a alimentação tradicional brasileira e a frequência semanal com a qual os adultos brasileiros consomem o feijão, bem como estudar a substituição da alimentação natural por ultraprocessados.

Para a coleta de dados foram utilizadas informações do Sistema de Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico (Vigitel). Os dados de mais de 500 mil adultos foram acompanhados entre os anos de 2009 e 2019, por meio de entrevistas por linha telefônica fixa.

A frequência de consumo semanal de feijão foi fragmentada em quatro indicadores: não-consumo (0 dias por semana), baixo consumo (1 a 2 dias por semana), consumo moderado (3 a 4 dias por semana) e consumo regular (5 a 7 dias por semana). A análise mostrou que o consumo regular de feijão é o mais indicado para um bom estado nutricional. Os dados foram ajustados para diversas variáveis, como as de comportamento.

O Vigitel compõe o sistema de Vigilância de Fatores de Risco para doenças crônicas não transmissíveis (DCNT) do Ministério da Saúde, e acontece anualmente, através de entrevistas telefônicas com adultos (maiores de 18 anos) residentes em domicílios nas capitais brasileiras e Distrito Federal.

O sistema de inquérito trabalha desde 2006 para monitorar a frequência e a distribuição de fatores de risco e proteção para doenças crônicas não transmissíveis, além de identificar elementos agravantes, como tabagismo, alimentação não saudável, inatividade física e uso nocivo de bebidas alcoólicas. Para ter acesso aos resultados da pesquisa de 2006 a 2021, acesse Bases Vigitel.

Segundo a pesquisadora, o feijão é um marcador da qualidade nutricional da dieta e um símbolo da alimentação tradicional brasileira, além de ser elemento essencial, muitas vezes, para a segurança alimentar. “É garantia do cidadão brasileiro, pela Constituição, o direito a uma alimentação de qualidade. No entanto, sabe-se que nem todos possuem alternativas para manter uma dieta equilibrada e, nesta questão, o feijão possui inestimável valor social para os brasileiros”, afirma Fernanda.

Menos feijão no prato

Outra linha da pesquisa observou o consumo do item ao longo dos anos de 2007 a 2017 e identificou uma tendência preocupante. A previsão é que em 2025 o brasileiro deixe de comer feijão de forma regular e tradicional, ou seja, o hábito considerado não-regular (1 a 4 dias na semana) será o mais prevalente na população.

No estudo por sexo, constatou-se que desde 2022 as mulheres já compõem majoritariamente o grupo de consumo não-regular. Para os homens, a estimativa de alteração é no ano de 2029.

De acordo com a pesquisadora, há hipóteses que podem explicar a disparidade dos resultados entre os sexos, como a jornada dupla de trabalho das mulheres, dificultando-as de preparar os alimentos naturais ou minimamente processados em casa, a oscilação nos preços do feijão e a conveniência dos alimentos ultraprocessados e prontos para o consumo.

De toda forma, a diminuição do consumo do alimento entre os brasileiros vem sendo motivo de alarme entre os profissionais da saúde, visto que, segundo o estudo, não comer feijão pode estar associado ao ganho de peso e a um estado nutricional insatisfatório.

Ultraprocessados

Conforme Fernanda Serra, a substituição dos alimentos naturais ou minimamente processados por ultraprocessados modifica o perfil alimentar da população, trazendo uma piora na qualidade da dieta e fragilidade na cultura alimentar brasileira.

“A mudança de perfil alimentar se deve a praticidade que os ultraprocessados oferecem ao dia a dia, então, pela falta de tempo, muitos optam por produtos prontos ou fáceis de serem preparados”, acrescenta Fernanda.

A oscilação no preço do feijão também possui papel fundamental na troca por alimentos prontos. A instabilidade acontece devido a processos inflacionários incluindo a priorização da produção de commodites agrícolas, geralmente mais lucrativas no mercado nacional e internacional do agronegócio. Desta forma, a agricultura familiar ou de pequena escala fica em segundo plano, e o feijão, por sua vez, se valoriza ano a ano nas prateleiras dos supermercados, de acordo com a pesquisadora.

Além disso, o estudo discute que há um sistema alimentar que influencia o perfil de consumo da população. “Em outras palavras, o padrão alimentar dos brasileiros é motivado por fatores externos, como propagandas publicitárias de ultraprocessados e disponibilidade, variedade e preço dos alimentos saudáveis”, pontua a autora.

A pesquisadora alega que medidas regulatórias e fiscais para uma alimentação saudável são urgentes, juntamente com a taxação de ultraprocessados e a adequações na rotulagem dos alimentos.

“Assim, os brasileiros poderão realizar escolhas alimentares mais saudáveis e conscientes, com menores chances de desenvolverem excesso de peso e a obesidade, por exemplo”, finaliza Fernanda.

A pesquisa foi financiada pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) em parceria com o Ministério da Saúde.

da UFMG