Quinta-feira, 21 de Novembro de 2024

Coluna Draft: ‘Homofobia – Ódio em forma de Preconceito’, por Edgar Talevi

2024-05-07 às 15:30

Temos assistido à desconstrução do humano pelas vertentes do moralismo. Isso adentra o pensamento coletivo e se apodera de valores, como liberdade individual, arbítrio, identidade e autorrealização que deveriam ser preservados pela sociedade em seu processo civilizatório.

A sociedade, que se diz moderna, vive o paradigma da pós-verdade – estigma pelo qual os fatos são esfacelados pelo processo da modelagem da opinião pública por meio de emoções e crenças pessoais, em detrimento da objetividade – e chafurda na lama do obscurantismo, em um constante movimento niilista voltado contra a construção da identidade do ser humano. Isso tudo sob o estigma do conservadorismo fundamentalista, seja corporativo ou individual, que carrega em si o preconceito.

A homofobia, nesta perspectiva é, nada menos, que o ódio em forma de preconceito. Isso é uma doença de uma sociedade que, em vez de repensar sua gênese universal, que é comum a todos do gênero humano, quer creiamos no criacionismo – como este colunista, sendo teólogo – ou no evolucionismo, descaracteriza a humanidade ao dividir, selecionar, segregar seus entes por conta da orientação sexual.

Para que entendamos com maior clareza o problema, segundo o relatório do Observatório de mortes violentas de LGBTQIA+ no Brasil, em 2020 houve 237 vítimas fatais de homofobia, compreendendo 224 homicídios e 13 suicídios. A tendência de agressões é definidora de uma chaga mortal na sociedade que precisa ser curada por meio de penas exemplares, advindas do código penal, mas, de igual modo, pela Educação, tanto na família como na escola.

Destarte, um avanço no respeitante à tipificação penal da homofobia foi alcançado em 2019, pelo Supremo Tribunal Federal, em que a homofobia e a transfobia foram enquadradas no artigo 20, da lei 7.716/1989, que criminaliza o racismo. Ademais, o STF decidiu que o crime de injúria preconceituosa é imprescritível e inafiançável. Com isso, não há prazo para que alguém seja condenado por uma ofensa racista, homofóbica ou antirreligiosa. O julgamento em questão dizia respeito ao Habeas Corpus 154.248 e terminou com o placar de 8 votos contra 1.

No entanto, ainda é possível encontrarmos atores políticos que prestam um desserviço à nação quando proferem discursos preconceituosos, embebidos de ódio, a favor de posicionamentos que ferem as pessoas em sua identidade e orientação sexual. Isso não deveria passar despercebido pelas esferas judiciais, tampouco tolerado pelos ávidos eleitores em 2024.

Mas, é notório que o enfrentamento à homofobia ainda é tabu devido à incauta sujeição aos sistemas moralistas que fecundam separatismo, inculcando uma apócrifa concepção de sagrado e profano, sem entendimento do que isso significa, ao bel-prazer de líderes despóticos e acéfalos. Didaticamente, poderíamos classificar o crime da homofobia em dois segmentos, a saber, institucionalizada, motivada por coletivos institucionais, dentre eles o Estado, e a internalizada, abrangendo os indivíduos.

Nem uma nem outra são fáceis de serem trabalhadas e, quando necessárias, punidas. Mas todo esforço envidado é, embora martírico, necessário à natureza da cidadania e formação integral do ser humano.

Fases houve em que o homossexualismo foi confundido, devido à ignorância sobre o tema, com doença. Mas, graças ao entendimento da OMS, aos 17 de maio de 1990, a pecha patológica deixou de ser atribuída aos homossexuais.

Doravante, estudos antigos, mas renovados, em psicanálise, comprovam que Freud, em 1935, já concebia que a homossexualidade não poderia ser considerada doença. Segundo Freud, a psicanálise poderia proporcionar tranquilidade e paz psíquica ao homossexual que se sentisse infeliz e em conflito em relação à sua vida social, permitindo que este se aceitasse e se amasse.

Freud já entendia que a orientação sexual não deveria ser “tratada” em terapias, por não ser uma doença. O próprio pai da psicanálise lembrou, em uma de suas correspondências, que proeminentes figuras da história, tais como Platão, Michelangelo e Leonardo da Vinci eram homossexuais. Isso evidencia o caráter humano e douto do psicanalista, que nunca perdeu sua importância no mundo científico.

Mas, em tempos modernos, como entender discursos, “brincadeiras” de péssimo gosto e atos violentos contra homossexuais? Talvez a resposta esteja na falta de coragem das instituições em enfrentar o tema. Aqui convido à reflexão todos os atores/sujeitos formadores de opinião e condução da Educação de cada indivíduo em suas esferas de atuação. O caminho é acidentado e longo, mas sem ele, certamente, passaremos a uma infinita e imprevidente realidade em que as pessoas passarão a se odiar perpetuamente, arrogando, cada uma a si, o direito de serem possuintes da moral/moralismo/pedantismo e pernóstica capacidade de se autodestruir.

Sábio é aquele que entende o sentido de amar ao próximo como a si mesmo e, neste contexto, não incorre em insulação. Imprescindíveis são as palavras do teólogo Ricardo Gondim: “Aos homoafetivos, o ombro de Deus”.

Coluna Draft

por Edgar Talevi

Edgar Talevi de Oliveira é licenciado em Letras pela UEPG. Pós-graduado em Linguística, Neuropedagogia e Educação Especial. Bacharel e Mestre em Teologia. Atualmente Professor do Quadro Próprio do Magistério da Rede Pública do Paraná, na disciplina de Língua Portuguesa. Começou carreira como docente em Produção de texto e Gramática, em 2005, em diversos cursos pré-vestibulares da região, bem como possui experiência em docência no Ensino Superior em instituições privadas de Ensino de Ponta Grossa. É revisor de textos e autor do livro “Domine a Língua – o novo acordo ortográfico de um jeito simples”, em parceria com o professor Pablo Alex Laroca Gomes. Também autor do livro "Sintaxe à Vontade: crônicas sobre a Língua Portuguesa". Membro da Academia Ponta-grossense de Letras e Artes. Ao longo de sua carreira no magistério, coordenou inúmeros projetos pedagógicos, tais como Júri Simulado, Semana Literária dentre outros. Como articulista, teve seus textos publicados em jornais impressos e eletrônicos, sempre com posicionamentos relevantes e de caráter democrático, prezando pela ética, pluralidade de ideias e valores republicanos.