Segunda-feira, 30 de Setembro de 2024

Prefeitura de Telêmaco Borba prova na Justiça que denúncia de rachadinha era armação

2024-06-06 às 12:48

Em 9 de março de 2024, a coluna de Matheus Leitão, na Veja, publicou o texto: “A confissão espantosa sobre rachadinha no Paraná“, noticiando correr na Justiça do Estado uma ação popular contra o prefeito de Telêmaco Borba, Márcio Artur de Matos (PSD), e sua vice, Rita Araújo (PSD) “por causa da nomeação de auxiliares que devolviam parte dos salários para custear uma futura campanha”. A coluna afirmou, ainda, haver confissões da suposta prática de rachadinha por parte de dois secretários municipais em depoimentos oficiais a autoridades, dentro de um inquérito. O texto foi reproduzido por alguns outros veículos da região.

Em 3 de abril, a coluna voltou ao tema ao noticiar que o juiz substituto Pedro Toaiari de Mattos Esterce determinou a quebra do sigilo bancário e fiscal do prefeito e da vice-prefeita, bem como o afastamento dos secretários, além do cumprimento de mandados de busca e apreensão contra os investigados. Nota novamente reproduzida por alguns veículos locais.

Na ocasião, a coluna da Veja citou que, procurada, a prefeitura da cidade disse que seus advogados estão tomando providências e que “tudo isso não passa de inverdades que serão demonstradas em juízo”. Reforçou ainda que o MP já se manifestou pelo arquivamento. O juiz, no entanto, não atendeu ao pedido do MP. Nenhum dos veículos que reproduziram o material de Leitão procurou a Prefeitura de Telêmaco para esclarecimentos sobre o caso.

Como nem a coluna da Veja, nem os demais veículos noticiaram mais nenhum desdobramento do caso, embora ele tenha avançado bastante na Justiça, escrevemos para algumas correções e atualizações:

1 – A ação popular é redigida pelos mesmos advogados e traz as mesmas ilações da Ação de Investigação Eleitoral nº 0600626-29.2020.6.16.0111, relativa às eleições municipais de 2020, movida pelo candidato derrotado naquele pleito, Thiago Chamorra, que se apresenta, novamente, como pré-candidato à prefeitura de Telêmaco Borba. A ação eleitoral foi devidamente analisada e julgada improcedente por todas as instâncias da Justiça Eleitoral, com a decisão de primeira instância pela improcedência da ação sendo mantida pelo Tribunal Regional Eleitoral e pelo Tribunal Superior Eleitoral, mesmo depois de inúmeras tentativas de recursos pela parte autora.Restou assim comprovado que o que o texto da coluna chamou de rachadinha tratava-se de doação de campanha oficial, feita por pessoa física e devidamente registrada no Tribunal Regional Eleitoral, nas eleições de 2020 e não “em futuras campanhas”, como citado.

2 – Os depoimentos prestados pelo secretário de Administração do município, Izomar Pucci, e do assessor Reginaldo Lapa dos Santos deixam claro que ambos fizeram doações voluntárias à campanha de Márcio Artur de Matos, sem nenhuma obrigação e, muito menos, coação, dos valores que a coluna afirma tratar-se de “rachadinha”, o que ficou comprovado no acórdão da Justiça Eleitoral.

3 – Em 2022, dois anos depois do processo eleitoral, Renan Vidal da Silva, apoiador da chapa derrotada nas eleições de 2020 e que pretende disputar a prefeitura novamente em 2024, representado pelo mesmo escritório de advocacia que representou a chapa no processo eleitoral, protocolou denúncia no Ministério Público do Estado relatando exatamente os mesmos fatos já investigados e arquivados pela Justiça Eleitoral. A denúncia foi inicialmente registrada na Notícia de Fato nº MPPR-0143.21.000483-2. A Notícia de Fato foi arquivada pelo MP do Paraná, sob o fundamento de que os fatos denunciados eram genéricos e desprovidos de elementos mínimos de prova.

4 – Renan Vidal da Silva, orientado pela mesma banca de advogados, recorreu do arquivamento e o MP então, decidiu instaurar o Inquérito Civil nº MPPR – 0143.21.000483-2. Dentro de tal inquérito, foram realizadas todas as diligências julgadas necessárias pelo órgão de investigação, que concluiu pela ausência de qualquer indício de ato de improbidade, promovendo o arquivamento do inquérito.

4 – Renan Vidal da Silva apelou, então, ao Conselho Superior do Ministério Público. A relatora no órgão, conselheira Jacqueline Batisti, determinou a realização de novas diligências. Novas pessoas foram ouvidas, novos documentos foram juntados e a conclusão foi pela ausência de justa causa para a deflagração de ação penal, resultando no arquivamento do procedimento, devidamente homologado pelo Juízo da Vara Criminal da Comarca de Telêmaco Borba nos autos nº 0004954-58.2023.8.16.0165. Em um dos trechos de sua decisão, o Conselho Superior do Ministério Público chega a afirmar que: “Exsurge dos elementos probatórios colhidos a existência de possível motivação política para as denúncias, além da tentativa de utilização do Ministério Público para o alcance de interesses alheios ao interesse público, à defesa do patrimônio público, da lisura do processo eleitoral e da fé pública”. O despacho afirma, ainda que “sendo assim, a atuação ministerial, obviamente, não pode ser instrumentalizada para combates políticos, tampouco voltada à satisfação de interesses pessoais”.

5 – Exauridas todas as possibilidades de recursos (e foram muitas as utilizadas), o “morador da cidade” Renan Vidal da Silva, e sua banca de advogados ingressaram com a Ação Popular em questão. A ação sequer deveria ser aceita pelo juízo, pelo fato de ter sido proposta por um “morador da cidade”, enquanto a legislação prevê que apenas o Ministério Público tem competência para propor ação por improbidade administrativa (em 2022, o STF decidiu que entes públicos prejudicados por ato de improbidade também podem propor esse tipo de ação. Mas, nunca, um simples “morador da cidade”). Antes de arquivar o processo por vício de origem, no entanto, o juiz titular, Elessandro Demetrio da Silva cumpriu o rito processual e remeteu os autos para manifestação do Ministério Público, que se manifestou exatamente neste sentido, afirmando que “a ação popular não é o instrumento adequado para verificar as ocorrências narradas, especialmente já tendo havido diligência do órgão acerca delas, com arquivamento das investigações”. O Ministério Público afirmou, ainda, não haver lastro para o deferimento de tutela provisória (os pedidos de liminares para o afastamento dos réus, as quebras de sigilo e as buscas e apreensões) e que, no mérito, são improcedentes as razões invocadas pelo autor.

6 – Surpreendentemente, na ausência do juiz titular, o juiz substituto, Pedro Toaiari de Mattos Esterce,  ignorou o parecer do Ministério Público e atendeu parcialmente pedidos da petição inicial de Renan Vidal da Silva, determinando, liminarmente, em 18 de março deste ano, o afastamento dos secretários, a quebra dos sigilos e as buscas e apreensões. O juiz substituto interpretou como cabível a ação popular afirmando que “qualquer cidadão será parte legítima para pleitear a anulação de ato lesivo ao patrimônio público” e que “a moralidade é um dos bens públicos imateriais que podem ser sindicatos por meio de ação popular”. Para o magistrado, os pedidos do autor na ação popular “não se confundem com aqueles vinculados a atos de improbidade administrativa”. Mesmo a decisão “incomum” do juiz substituto, já deixou clara a ausência de conduta irregular do prefeito Márcio e de sua vice Rita, uma vez que até mesmo o magistrado substituto indeferiu os pedidos de afastamento de ambos, assim como de outros secretários municipais, limitando sua decisão ao secretário-geral da prefeitura, Rubens Benck e do assessor Reginaldo Lapa dos Santos, “muito embora num primeiro momento, não existam provas de que a doação condicionava a nomeação e/ou manutenção no cargo”, escreveu o juiz em seu despacho.  As decisões foram imediatamente cumpridas. E, nas buscas, “não foram encontrados nenhum indício de irregularidade”.

7 – Ao retornar ao trabalho, o juiz titular revogou a liminar em 3 de abril. Ao analisar pedido de reconsideração formulado pelos dois réus afastados, o magistrado deixou claro discordar da decisão de seu colega de admitir a ação popular, mas lembrou que o direito não permite que o mesmo juízo julgue novamente algo já decidido, devendo, assim a questão ser discutida na instância recursal. Mas o magistrado revogou a liminar, restabelecendo os sigilos bancários dos réus e reconduzindo os servidores afastados a seus cargos.

8 – A defesa do prefeito, da vice e dos secretários municipais maldosamente envolvidos nesta ação popular já recorreu ao Tribunal de Justiça do Paraná solicitando a extinção do processo por todos os vícios já elencados.

Conclusão – Nunca existiu nenhum esquema de rachadinha na prefeitura de Telêmaco Borba. A ação popular é baseada em uma denúncia antiga, relativa à gestão passada e à eleição de 2020 e que já ficou comprovado tratar-se de doação eleitoral voluntária, oficial e devidamente registrada na Justiça Eleitoral. O autor da ação popular, Renan Vidal da Silva tem ligações políticas com a família de Thiago Chamorra, candidato derrotado nas eleições de 2020 e pré-candidato a prefeito de Telêmaco Borba em 2024. O escritório de advocacia que representa Renan da Silva é o mesmo que propôs a ação eleitoral em nome de Chamorra.

O grupo político de oposição acabou usando uma decisão incomum e descontextualizada para induzir o autor da coluna a uma interpretação errada, assumindo que o caso representava “o que acontece no interior do país em um ano eleitoral”. Pois bem, a explicação acima mostra de forma clara que existem sim problemas sérios no interior brasileiro, mas, neste caso, não com uma “rachadinha” e sim com a orquestração de denúncias falsas para manchar a reputação de pessoas que nada devem à Justiça.