Apesar de ser dado às letras, concordo com Confúcio: uma imagem vale mais que mil palavras. Ainda assim, usarei 465 palavras para refletir sobre uma imagem — especificamente, uma das fotos da posse de Donald Trump. Nela, encontramos aquilo que o bilionário ícone da extrema-direita mundial escolheu não verbalizar.
É fato que Trump assumiu abertamente sua intenção de conduzir um governo homofóbico. Decretou que, nos EUA, com a refundação de sua “era de ouro”, só existirão dois gêneros reconhecidos. É como música clássica para os ouvidos de quem aplaude a violência contra a comunidade LGBTQIA+.
Também é verdade que prometeu um governo xenófobo, mas de forma seletiva, é claro. Enquanto a fronteira sul com o México será fechada e deportações em massa ocorrerão, essa dureza vale apenas para imigrantes pobres. Aos milionários — muitos dos quais compõem seu governo —, tudo será permitido.
Da mesma forma, deixou claro que liderará um governo negacionista, concedendo perdão e até indenização a militares punidos por recusarem a vacinação. E não para por aí: confirmou o caráter golpista de sua gestão ao perdoar os invasores do Capitólio.
No entanto, há algo que ele não verbalizou: o racismo que deve caracterizar o governo que encabeça. Mas nem precisou. Confúcio estava certo — as imagens falam por si. Basta observar as cenas de sua posse na rotunda do Capitólio, sede do Congresso norte-americano. Com raríssimas exceções, como as presenças de Barack Obama, por sua condição de ex-presidente, e de Kamala Harris, por ser vice-presidente, todos os demais presentes são brancos.
A mensagem é clara: assim como uma nação hétero, os EUA são uma nação branca, e esse espírito regerá o seu governo. Episódios como o assassinato de George Floyd serão tolerados. Vale lembrar que a morte deste cidadão negro, sufocado por um policial branco em Minneapolis, ocorreu no primeiro mandato de Trump. Não seria surpresa se, entre as dezenas de medidas anunciadas, Trump ter revogado a lei que criminaliza o linchamento como crime de ódio — legislação de autoria de um democrata.
Da mesma forma, suspender a nacionalidade de filhos de imigrantes não naturalizados também carrega um forte componente racista. Afinal, a maioria dessas pessoas são latino-americanos de origem indígena.
No norte, formam-se nuvens carregadas, com tempestades que podem se dirigir para o sul. E as imagens, mais uma vez, refletem essa previsão. A alegria daqueles que “turistaram” em Washington com dinheiro público e o choro de quem foi barrado por ser considerado “risco de fuga” apontam para os caminhos que a extrema-direita pretende trilhar em 2026.
E, ainda que Trump os tenha ignorado, relegando-os a ginásios ou a uma das dezenas de festas paralelas na noite fria de Washington, as fotos deixam evidente a aposta: a busca por um governo que reforça as bases do privilégio branco, enquanto marginaliza – ou elimina -, os demais.
Oliveiros Marques é sociólogo, publicitário e comunicador político.