Quarta-feira, 02 de Outubro de 2024

Psicólogos de PG dão orientações para casais que preferem resgatar o casamento a se separar

2020-07-25 às 14:53

O Brasil vive uma epidemia de divórcios. Em Ponta Grossa, de cada três casamentos, um termina em separação. De acordo com os dados mais recentes do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o município registrou 1.536 casamentos e 617 divórcios em 2018, dos quais 281 tiveram que ser resolvidos na Justiça. Na contramão dessa tendência, muitos casais têm preferido tentar resgatar o casamento a se separar.

Para a psicóloga Dayane Machado, especialista em terapia de casal que atende em Ponta Grossa, diversos motivos podem manter duas pessoas unidas mesmo quando a relação está abalada. “Hábito, comodidade, crenças religiosas, receio de prejudicar os filhos, insegurança em relação ao futuro, medo da solidão, dependência emocional ou financeira, tudo isso pode fazer com que o casal tente evitar o divórcio”, elenca.

O psicanalista e hipnoterapeuta Eduardo Pereira, que também atende no município, observa que ainda há outro motivo: separações costumam ser traumáticas. “O divórcio é incômodo, e, muitas vezes, tem fatores em volta, como sociedade, filhos, família e anos de convívio, que influenciam na questão. Não deixa de existir um trauma na separação, e algumas pessoas não estão dispostas a enfrentar isso, preferindo tentar resgatar o casamento”, explica.

Casamento renovado, relação fortalecida


Eduardo Pereira: “A relação se fortalece quando um casal passa por uma crise e consegue superá-la junto, pois sabem que podem contar um com o outro” (Foto: Divulgação)

Pereira acredita que é possível reconstruir uma relação de forma sadia, sem gerar medo, culpa, mágoa e ressentimento. Para isso, ambas as partes precisam estar dispostas a assumir a sua parcela de culpa e responsabilidade. “Se uma relação entra em crise, de alguma forma, os dois têm responsabilidade sobre aquilo. É importante que os dois assumam as suas culpas e tentem se corrigir”, observa.

Dayane diz que uma das vantagens de se resgatar a relação é o fortalecimento dos laços entre o casal. “Quando o casal consegue superar adversidades com resiliência e enfrentar os conflitos inerentes à relação de modo mais saudável e construtivo, com respeito e amorosidade, a tendência é que o vínculo afetivo seja fortalecido”, aponta.

Um casal que já passou por uma grande crise e conseguiu superá-la junto, na visão de Pereira, já sabe que podem contar um com o outro. O psicanalista acrescenta que resgatar um casamento é transformar a crise conjugal em aprendizado. “Os seres humanos aprendem muito mais nos momentos de dificuldade do que nos momentos bons. Uma turbulência nos ensina mais que a tranquilidade”, afirma.


Dayane Machado: “Quando o casal enfrenta os conflitos de modo saudável e construtivo, a tendência é que o vínculo afetivo se fortaleça” (Foto: Divulgação)

Erros de percurso

O maior impedimento para o resgate da relação, segundo o psicanalista, é a postura “dono da verdade”. “É aquela pessoa que acha que só o outro está errado e que defende mais o próprio posicionamento do que o casamento”, explica. Segundo ele, a busca por um culpado, a cegueira em relação aos próprios erros e a vontade de estar sempre certo são comportamentos destrutivos no relacionamento.

Outro erro muito cometido pelos casais quando tentam retomar o casamento, segundo Pereira, consiste em tentar mudar o parceiro. “A única pessoa que eu posso mudar neste mundo sou eu mesmo. Eu não tenho poder de mudar o outro. O foco da mudança tem que estar sempre em mim, eu tenho que olhar para mim mesmo e pensar no que eu preciso mudar para ser uma pessoa melhor”, orienta.

Dayane aponta que a falta de diálogo também é uma barreira que os casais precisam enfrentar no processo de resgate do casamento. “Em um caso em que houve perda de confiança, por exemplo, muitos tentam dar explicações sem antes escutar o outro. Quando uma pessoa está magoada, fica muito difícil restabelecer a conexão se o outro insiste em se explicar”, diz. Ela destaca que a confiança não é construída ao tentar descobrir o que está errado, mas, sim, por meio de uma combinação entre ouvir, acolher e saber como as ações de uns afetam os outros.

A falha na comunicação, de acordo com a terapeuta, pode atrapalhar até mesmo um pedido de desculpas. “Para que as nossas palavras tenham o efeito que queremos, antes de mais nada, temos que mostrar que estamos realmente dispostos a escutar o outro e a assimilar como as nossas escolhas o afetaram”, sublinha.

E quando não vale a pena?

Mas será que todas as relações podem ser resgatadas? De acordo com Dayane, é possível perceber os sinais de um casamento que não tem condições de ser reconstruído. “Quando não há o sentimento de amor e respeito, quando uma das partes não se sente disposta a se engajar no processo de reconstrução do relacionamento, quando há perda de interesse e vínculo afetivo pelo parceiro, quando ocorrem abusos de qualquer tipo, muitas vezes, a opção de divórcio é a mais viável”, avalia.

Se o casamento está gerando mais tristeza do que geraria o divórcio, é hora de pensar na separação, indica Pereira. “Algumas relações são mais traumáticas que o divórcio – uma relação abusiva, por exemplo, onde há violência física ou psicológica”, cita. “A violência física é uma é uma fronteira que não pode ser transposta. A partir do momento que houve a violência, o respeito deixou de existir e a relação não pode ser reconstruída”, conclui.

Dicas para resgatar o casamento

1. Deixe de lado rótulos e julgamentos, pois prejudicam a conexão entre o casal e limitam a sua visão sobre o parceiro;

2. Não espere que o outro mude. Tenha coragem para começar as mudanças e dizer o que sente;

3. Pergunte-se a si mesmo “O que eu realmente quero?” e descubra a sua intenção. Essa pergunta é importante para guiar as suas ações. Seja autêntico ao falar sobre isso com o seu parceiro;

4. Esteja ciente de quais são as suas necessidades mais atendidas no relacionamento e de quais são as menos atendidas, e comunique-as com franqueza;

5. Invista em tempo para o diálogo e busque a psicoterapia se precisar de ajuda.

Por Michelle de Geus | Foto: Reprodução