Quinta-feira, 26 de Dezembro de 2024

Cinco passos para identificar uma ‘fake news’ (e o que fazer quando o alvo for você)

2020-08-01 às 13:53

Quase todo brasileiro já ouviu falar das famosas fake news – em bom português, notícias falsas. Embora existam desde o final do século XIX, foi em 2016 que elas se popularizaram, durante as eleições presidenciais norte-americanas. Na época, o termo foi muito usado para falar da divulgação de informações falsas que circulavam na internet.

Mas, apesar de o termo ser bastante popular no Brasil, um estudo desenvolvido pela empresa global de cibersegurança Kaspersky mostrou que 62% dos brasileiros não sabem identificar uma fake news. Por esse motivo, nada mais necessário do que aprender a identificar uma fake news, saber o que fazer quando o alvo for você e entender as consequências que o compartilhamento de notícias falsas pode trazer.


Cinco passos identificar uma ‘fake news’

De acordo com o jornalista e pesquisador Rafael Kondlatsch, professor dos cursos de Jornalismo da UniSecal e da Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG), há algumas formas de identificar uma notícia falsa. Confira a seguir:

1) A primeira consiste em observar o título da matéria. “Expressões muito alarmistas ou conspiratórias têm grandes chances de ser falsas. Títulos grafados com todas as letras em maiúsculo ou com erros de português também são um sinal de conteúdo duvidoso”, aponta.

2) Observar a data da publicação é igualmente importante para evitar o consumo e a divulgação de notícias falsas. “Muitos textos são verdadeiros, mas antigos, e o seu uso no contexto atual só serve para desinformar. Isso é muito comum em matérias sobre projetos de lei. A pessoa pega um projeto que foi apresentado em determinado contexto, que muitas vezes já foi até arquivado ou reprovado, e coloca novamente em circulação, buscando causar confusão para gerar cliques ou engajamento”, explica.

3) O jornalista também aponta para a necessidade de verificar a credibilidade do veículo em que a notícia está publicada. Órgãos de mídia tradicionais e profissionais costumam ser os mais indicados para o consumo de notícias. “No jornalismo profissional, existem vários procedimentos que são adotados antes de se publicar uma reportagem. O principal deles é a apuração. Erros, obviamente, acontecem, mas são proporcionalmente muito pequenos em relação ao volume do que é produzido e apurado diariamente”, afirma.

4) Mas cuidado: Kondlatsch ressalta que há sites que simulam páginas tradicionais para disseminar conteúdo falso. “Antes de compartilhar, vale a pena conferir se o nome do site é o mesmo do endereço na barra de navegação. Isso vale também para as páginas nas redes sociais. É preciso prestar atenção para ver se você não está sendo enganado”, complementa.

5) A quinta e última forma de averiguar a veracidade da informação, segundo o professor, consiste em ver se os grandes veículos também publicaram a mesma notícia. “Uma grande notícia nunca é noticiada por apenas um veículo. Por isso, em caso de dúvida, faça uma busca pelas palavras-chave do tema. Caso ninguém mais tenha falado sobre o assunto, é grande a chance de ser conteúdo mentiroso”, informa.

Rafael Kondlatsch: “É fundamental identificar as fontes, buscar a origem dos boatos e aplicar as sanções ali, incluindo em quem financia a distribuição”

Rastreamento

Ao contrário do que muitos pensam, é possível, sim, rastrear a origem das fake news que circulam na internet. “Nas redes sociais e em sites é bem mais fácil, porque há formas de verificar de quem é a conta que mantém o espaço”, diz Kondlatsch. O presidente da Comissão de Direito Digital da Ordem dos Advogados do Brasil de Ponta Grossa (OAB-PG), Murilo Tadra, observa que, geralmente, as informações falsas surgem em redes sociais e blogs, o que facilita o trabalho de rastreamento. “Normalmente, são pequenos blogs, fóruns e por aí vai”, cita.

No entanto, o maior problema enfrentado pelas autoridades são os aplicativos de mensagens, que contam com sistema de segurança de privacidade. “No WhatsApp é muito difícil rastrear a origem da notícia falsa, por conta do sistema extremamente rápido de propagação entre pessoas e grupos. Para uma pessoa comum, é praticamente impossível rastrear. E até para as autoridades, com ferramentas adequadas e especialistas, é muito difícil, por conta da criptografia. Por isso, o WhatsApp tem sido o meio preferido dos farsantes”, observa o jornalista.

O que fazer quando o alvo é você

Vítimas de fake news, segundo Tadra, devem procurar as autoridades competentes, como, por exemplo, o Núcleo de Combate aos Cibercrimes (NUCIBER), da Polícia Civil do Paraná. “Quem se sentir prejudicado por uma fake news deve fazer Boletim de Ocorrência sobre o respectivo crime. No caso de imputação falsa de crime, é calúnia. No caso de se falar alguma coisa que desabone enquanto pessoa, é difamação ou injúria”, detalha.

Kondlatsch acrescenta que, a depender do caso, recomenda-se fazer uma ata notarial, uma verificação e autenticação em cartório do material criminoso. “Isso serve para a abertura de processos contra pessoas ou sites que estiverem compartilhando as notícias falsas sobre a vítima. Caso seja uma notícia em apenas um site, vale a pena entrar em contato e pedir a remoção”, orienta.

Murilo Tadra: “É importante ter cuidado ao compartilhar, porque é possível ser condenado por participação em rede de disseminação de fake news

Quem compartilha comete crime?

De acordo com o presidente da Comissão de Direito Digital da OAB-PG, quem compartilha notícias falsas pode ser considerado cúmplice de crime. “É importante sempre ter cuidado ao compartilhar, porque a pessoa pode ser, sim, condenada por participar de uma rede de disseminação de fake news. Não é porque está na internet ou no WhatsApp que não é criminalmente imputável”, alerta Tadra.

Kondlatsch, por outro lado, não vê efetividade em punir o cidadão comum que faz mau uso da internet. Na visão dele, o Estado deve focar na origem das fake news. “Eu sempre digo que elas têm objetivos e que são criadas por pessoas que têm alvos muito claros. É fundamental identificar quem são essas fontes, buscar as origens dos boatos e aplicar as sanções ali, incluindo em quem financia a distribuição deles. Penso que isso pode ser muito mais eficiente”, conclui.

Os brasileiros, as redes sociais e as ‘fake news’

> 2% dos brasileiros não conhecem o termo fake news;

> 33% dos brasileiros se informam somente pelas redes sociais;

> 62% dos brasileiros não conseguem diferenciar se a notícia é verdadeira ou não;

> 43% dos brasileiros desejam ver notícias de acordo com as suas concepções políticas;

> 72% dos brasileiros acreditam que as fake news viralizam para causar algum dano ou para que alguém receba algo em troca;

> 35% das notícias falsas são disparadas via WhatsApp e 24% via Facebook.

Fontes: Relatório de Notícias Digitais 2020 do Instituto Reuters e Estudo Iceberg Digital, desenvolvido pela empresa global de cibersegurança Kaspersky

Por Camila Delgado | Fotos: Reprodução (abertura) e divulgação (internas)