Sábado, 04 de Maio de 2024

D’P Agro: Amigos quase invisíveis

2023-09-09 às 12:39
Foto: Reprodução

Fungos e bactérias vêm sendo amplamente utilizados nas lavouras dos Campos Gerais para fertilizar o solo e melhorar a disponibilidade de nutrientes para as plantas

por Michelle de Geus

Estima-se que existam cerca de 40 milhões de bactérias em apenas um grama de solo. A maioria delas tem apenas dois micrômetros de comprimento (um micrômetro equivalente à milésima parte do milímetro) e são invisíveis a olho nu. O número pode assustar, mas isso não significa que elas sejam prejudiciais para as plantas. Pelo contrário, nos últimos anos vem crescendo o uso de bactérias e fungos para fertilizar o solo, melhorar a disponibilidade de nutrientes para as plantas e combater pragas no campo. Trata-se dos bioinsumos, produtos feitos a partir de microrganismos ou materiais vegetais, orgânicos ou naturais, utilizados na agricultura para aumentar a produtividade das plantações.

O potencial dessas ferramentas biológicas para melhorar o desempenho das lavouras foi destacado pelo presidente do Sindicato Rural de Ponta Grossa, Gustavo Ribas Netto, em “live” realizada no canal da entidade no YouTube. “Os solos são sistemas complexos, e os insumos biológicos auxiliam na necessidade de nutrientes e no desenvolvimento da planta de forma integrada”, explica, acrescentando que o desenvolvimento dessas tecnologias vem acompanhado de uma nova visão do produtor rural e de mudanças nas orientações para a boa utilização do solo. “O solo é vivo e precisa de um equilíbrio na sua composição. Antigamente, existia a ideia de que fertilizantes naturais, por exemplo, poderiam ser usados à vontade, mas, na verdade, essa falta de controle pode desequilibrar o solo e levar ao aparecimento de doenças ou pragas nas plantas”, exemplifica.

Em participação na “live”, a engenheira agrônoma, sócia do Safra Ensino e coordenadora técnica da empresa CGM, Keli Guera, afirma que, quando se trata da fertilidade do solo e da nutrição das plantas, os microrganismos e os bioinsumos são essenciais. “Sem eles, nós não conseguimos realizar todo o processo de absorção de nutrientes, visto que é pelos microrganismos que acontece todo o processo de decomposição da matéria orgânica disponibilizada no solo para a absorção da planta”, aponta. “Desta forma, os insumos biológicos podem auxiliar nesse processo de captação, sem redução da perda, como é o caso do potássio, tornando a planta mais eficiente para a absorção desses nutrientes, principalmente no ambiente radicular”, acrescenta.

Keli ressalta que os ativos biológicos auxiliam na reconstrução da fertilidade do solo, para que ele tenha níveis adequados de nutrientes, e também na potencialização do crescimento e da produtividade da lavoura. “Todo o desenvolvimento da planta pode ser acelerado ou melhorado com a utilização de microrganismos e bioinsumos”, reforça.

Decomposição de rochas

A engenheira agrônoma observa que os ativos biológicos ainda podem ser usados para acelerar o processo de decomposição de rochas, fonte de fósforo, potássio, nitrogênio e outros nutrientes importantes para a fertilidade do solo. “Nós temos muitos trabalhos sobre a utilização dos bioinsumos no uso eficiente de fertilizantes. É o caso das rochas, em que a presença dos microrganismos acelera o processo de dissolução dessa fonte alternativa, entregando para a planta um nutriente mais prontamente disponível e facilitando o processo de absorção”, detalha.

“Todo o desenvolvimento da planta pode ser acelerado ou melhorado com a utilização de microrganismos e bioinsumos”
Keli Guera, engenheira agrônoma, sócia do Safra Ensino e coordenadora técnica da CGM

Na visão de Keli, o uso de bioinsumos pode liberdade o Brasil da dependência com relação às fontes de nitrogênio, fósforo e potássio. “O Brasil tem algumas fontes muito interessantes desses tipos de fertilizantes, e o uso de bioinsumos que melhoram esse processo de decomposição, como é o caso dos solubilizadores de fósforo, pode tornar o país menos dependentes do uso desse fertilizante”, pontua, explicando que algumas pesquisas estimam que existam reservas de fósforo disponíveis para os próximos 100 ou 150 anos e que a maioria está localizada em áreas de grandes conflitos, como o Oriente Médio, fato que interfere nos preços.

Desde que o mundo é mundo

A evolução do manejo biológico está acontecendo de forma muito rápida e com qualidade, reforça a engenheira agrônoma, bióloga e coordenadora técnica de mercado da Nitro Biocontrol, Gabriela Vieira Silva. “Se pegarmos o histórico da evolução do manejo de pragas, nós temos o controle biológico acontecendo desde que o mundo é mundo”, reflete. “Trazendo para essa agricultura moderna, o que eu vejo muito, nessa área dos bioinsumos, é que hoje nós temos ferramentas extremamente tecnológicas para o combate de pragas ou doenças e proteção das plantas”, comenta, observando que a proteção das plantas pode ser contra estresses bióticos, que são pragas e doenças, ou abióticos, como salinidade, temperatura e estresse hídrico.

“Nessa área dos bioinsumos, nós temos ferramentas extremamente tecnológicas para o combate de pragas ou doenças”
Gabriela Vieira Silva, engenheira agrônoma, bióloga e coordenadora técnica de mercado da Nitro Biocontrol

Dentre as inúmeras possibilidades de uso dos bioinsumos, Gabriela destaca os insetos parasitoides e cita o caso de uma vespinha de dois milímetros que parasita o percevejo marrom (Euschistus heros), responsável por grandes prejuízos nas plantações de soja. “Os parasitoides são muito eficazes e eficientes nas suas atividades. Como eles são dependentes da espécie praga e não sobrevive sem ela, com a diminuição da praga os parasitoides diminuem também”, explica, ressaltando que, no caso da vespinha, ela parasita os ovos que os percevejos colocam na planta de soja, e, com o passar dos dias, deixam de nascer novos percevejos sem a necessidade de defensivos químicos e sem prejuízos para a lavoura.

Mais produtividade

A engenheira agrônoma observa ainda que a pandemia e a guerra na Ucrânia forçaram a agricultura, de modo geral, a buscar novas alternativas, e a indústria, a desenvolver novas ferramentas. “Mas eu vejo também um crescimento muito grande do produtor em relação à sua tecnificação. Ele quer entender porque agora está colocando uma bactéria no solo e dizendo que essa bactéria vai disponibilizar fósforo para as plantas”, aponta, concluindo que olhar o solo e a planta como uma coisa só, entender as variáveis que existem dentro desse cenário e a necessidade de equilíbrio, tornam a agricultura mais eficiente e as lavouras mais produtivas.

ASSISTA

Confira a live do Sindicato Rural de Ponta sobre bioinsumos abaixo:

Conteúdo publicado originalmente na Revista D’Ponta #296