As incertezas climáticas, cambiais e políticas acenderam um alerta ao campo. O bom patamar de preços atual da soja e do milho corre o risco de não se manter a médio e longo prazos. Por isso, a recomendação do analista Paulo Molinari, da consultoria Safras & Mercado, durante a live promovida pelo Sistema FAEP/SENAR-PR, no dia 1º de setembro, é para que os agricultores paranaenses aproveitem as cotações elevadas da oleaginosa e do cereal, que atualmente garantem boa rentabilidade, para travar ao menos os custos de produção com a venda antecipada.
Um dos principais pontos elencados por Molinari na palestra foi a atenção dos produtores rurais à estratégia de comercialização. As cotações da soja próximas dos R$ 150 a saca e do milho passando dos R$ 90 podem não se sustentar no longo prazo. Isso preocupa, segundo o especialista, já que no Paraná apenas 15% da safra 2021/22 de soja foi vendida, abaixo da média nacional de 23,7% e distante dos 45% na mesma época do ano passado. “O maior erro que tem agora é o produtor com custos altíssimos perder a chance de vender a R$ 150 a saca para a safra nova que é quase o dobro dos custos de produção. É brincar demais com o lucro”, apontou.
O especialista aconselhou aos agricultores tomarem cuidado com informações que recebem em grupos de WhatsApp, dizendo que vai faltar soja e que os preços vão explodir. Segundo Molinari, é preciso olhar detalhadamente para produção mundial, câmbio, clima, preços e balança comercial. “Nas condições atuais eu diria que é a hora de aproveitar os preços na safra nova, já que ainda estamos em bom patamar de câmbio e de [Bolsa de] Chicago para travamento de 2022. Garantam pelo menos os custos. O restante tem os próximos meses para ver se o mercado sobe ou se volta a cair”, recomendou.
No mesmo evento, o presidente do Sistema FAEP/SENAR-PR, Ágide Meneguette, avaliou que, em momentos nebulosos como pelo qual estamos passando, ter informações é o insumo mais importante para o produtor rural. “Vivemos uma fase de custos de produção altíssimos e é crucial estarmos atentos aos acontecimentos políticos, ao clima e ao cenário econômico para garantir rentabilidade. Afinal de contas, uma estratégia errada pode corroer os ganhos dos produtores rurais”, enumerou.
Câmbio
Molinari lembrou que nos últimos meses, com a pandemia do coronavírus, os governos gastaram muito dinheiro para evitar uma recessão profunda. Aliado a isso, baixaram-se os juros para que as atividades econômicas funcionassem minimamente apesar da crise. Esse cenário causou distúrbios importantes na dinâmica da economia global, fazendo com que houvesse muito dinheiro circulando. Com a vacina e a expectativa para superação da pandemia, os juros devem, aos poucos, serem aumentados e o dinheiro circulante voltar a diminuir.
“O juro zero não vai durar para sempre. Toda tensão financeira global agora está em cima de quando o Banco Central americano subirá taxas de juros. Com isso, o investidor vai para os títulos de renda fixa, de longo prazo, e isso provoca um enxugamento da liquidez global e sobe o preço do dólar. O dólar em relação a uma cesta de moedas [incluindo o Real] já está se movimentando para alta”, revelou.
O que preocupa é essa condição global somada ao fato de que o Brasil passa por uma crise institucional sem precedentes, com a realização de eleição presidencial em 2022 e a possibilidade de um ano turbulento considerando o clima em Brasília. “Não acredito em câmbio de R$ 4,60. A banda de variação está entre R$ 5 e R$ 5,40”, analisou.
Clima
Em relação ao clima, o risco está em relação à ocorrência do fenômeno La Niña (esfriamento anormal das águas do Oceano Pacífico), que costuma reduzir a incidência de chuvas na região Sul do Brasil. Ainda não está configurado a La Niña, mas, entre o fim da primavera e o início de verão, os modelos apontam essa tendência.
Segundo Molinari, as previsões para o clima na primavera estão mostrando um La Niña clássico e que as chuvas parem depois de outubro em uma parte da região Sul, que pode abranger o Paraná. “Não quer dizer que não vai chover no Sul. As previsões mostram que vai chover, mas abaixo do normal, ” diagnosticou. “Resta saber se essa chuva será suficiente para o bom desenvolvimento da safra”, completou.
Mercado internacional
Os produtores dos Estados Unidos estão começando a colheita de milho e soja, com perdas já verificadas na região Norte do Corn Belt. A quebra, no entanto, não deve ser suficiente para mexer significativamente com os preços do maior produtor de grãos do planeta. “A safra americana não será recorde, mas ainda é boa, em torno de 380 milhões de toneladas de milho e 120 milhões de toneladas de soja. Temos que avaliar os resultados quando a colheita se concretizar, mas já é possível dizer que não é safra para jogar os preços a uma alta absurda”, pontuou.
Molinari também analisa que o apetite da China terá influência decisiva. Agora, os compradores asiáticos estão com as atenções voltadas à safra americana, com compras diárias, o que inclusive têm ajudado a manter os preços do bushel da soja na casa dos US$ 13. Resta saber como a demanda, tanto por soja quanto por milho, vai se comportar nos próximos meses. “Com a China comprando muito, mantêm-se os preços, a China comprando menos, derruba preços. Por outro lado, os Estados Unidos exportando menos, sobra estoque e o preço também tende a cair”, explicou. Independentemente dessa movimentação, aparentemente o cenário de preços altíssimos das commodities agrícolas no Brasil não devem ter um longo período pela frente. “Falando de safrinha de milho de 2022, muito cuidado com o preço. O cenário futuro não tem relação com o que estamos vivendo hoje com a crise de abastecimento pela quebra na safrinha. Para o ano que vem, assim como estamos plantando soja até em vaso de flor, vamos plantar safrinha até em cemitério. Cuidado com o preço de milho em 2022. É importante já ir travando ao menos custo de produção, porque a realidade vai ser bem diferente”, alertou.
da Comunicação FAEP