O debate sobre a cobrança de impostos dos mais ricos — bancos, bilionários e “bets” — parece estar colocando pedras no caminho de Bolsonaro em seu desejo de construir uma maioria na Câmara dos Deputados e no Senado Federal. Sem dúvida, essa disputa, sintetizada no embate pobres x ricos, deixa parte significativa do Congresso Nacional e futuros candidatos do campo bolsonarista com as barbas de molho.
De um lado, é importante destacar que a tomada de iniciativa política por parte do governo Lula reacendeu uma chama que estava apagada em sua base social. Colocou em movimento uma grande e experiente máquina de mobilização popular que, invariavelmente, se organiza durante as campanhas eleitorais. A militância de esquerda recebeu a orientação política que estava faltando: discurso direto e inimigos comuns muito bem definidos.
De outro lado, a centro-direita começou a fazer seus cálculos. Defender menos impostos para milionários e mais para os mais pobres e a classe média — ao mesmo tempo em que apoia o aumento no número de deputados — dificilmente trará dividendos eleitorais. Os grandes caciques partidários talvez ignorem essa equação, confiantes no impulso dos fundos eleitorais que garantem seus próprios mandatos. Mas, da segunda camada de suas chapas para baixo, o bicho começa a pegar.
Se os candidatos com menos estrutura não puderem sair às ruas sem serem chamados de contrários à classe média e aos mais pobres, defensores dos muito ricos, duas coisas podem acontecer: primeiro, esses nomes podem “costear o alambrado”, sem fazer muita força pelas candidaturas majoritárias; segundo, o número de votos de suas chapas pode não ser suficiente para eleger a quantidade de parlamentares que hoje imaginam.
Para que essa possibilidade se concretize, o governo precisa manter a pressão — e seus apoiadores, no chão de fábrica, dar vazão ao discurso. O maior risco nesse tipo de disputa é acreditar que o debate já chegou aonde deveria. Mas isso leva tempo e exige repetição, repetição, repetição. Se a palavra de ordem já foi testada e pegou, agora é apertar o botão, calçar um tênis confortável, beber bastante água e gastar saliva para levá-la ao maior número de pessoas possível.
Oliveiros Marques é sociólogo, publicitário e comunicador
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