Que o governo Trump e o bolsonarismo compartilham os mesmos podres valores não chega a ser novidade para ninguém. Há inúmeras situações em que isso fica evidente. Mas sempre vale lançar luz quando os exemplos são escancarados.
É o caso do conteúdo da reportagem de Sofia Pilagallo, apresentada por Raquel Arriola e publicada na coluna UOL Flash, que ouviu três mulheres brasileiras que viajaram recentemente aos Estados Unidos. Uma empreendedora, uma massoterapeuta e uma streamer – todas com um roteiro comum: foram encaminhadas para uma “triagem secundária” sob argumentos claramente misóginos.
Uma delas relatou que teve o WhatsApp e outros aplicativos acessados por agentes da imigração norte-americana. Entre as perguntas feitas: “Você tem algum date com algum homem nos EUA?”, “Está vindo para fazer algum job?” – uma clara tentativa de sexualizar e criminalizar a presença feminina desacompanhada, revelando muito sobre a visão do governo Trump em relação a mulheres que viajam sozinhas.
Assim como o infame “pintou um clima” dito por Bolsonaro ao se referir a uma adolescente, essa postura diz muito sobre o atual governo norte-americano. Pode até parecer um caso de virtude sinalizada – quando se exibem publicamente valores morais “elevados” que não condizem com a prática pessoal. E o caso Jeffrey Epstein – condenado por crimes sexuais contra menores e habitué do círculo de Trump – talvez seja a melhor ilustração dessa hipocrisia.
Mas penso que, especialmente neste momento em que o caso Epstein volta à tona nos Estados Unidos, a misoginia escancarada do governo Trump – refletida também em declarações como a de Bolsonaro, que disse que ter uma filha mulher foi uma “fraquejada” – representa mais do que hipocrisia. Trata-se de um falso moralismo estratégico, com o objetivo de controlar, esconder a própria vida privada e manipular o discurso para públicos específicos, principalmente religiosos. Ou, nas palavras de Freud, um verdadeiro sintoma moral: a exibição de pureza para ocultar o desejo recalcado.
Esses episódios envolvendo a chamada “triagem secundária” de brasileiras, que podem também ser interpretados como um caso de projeção – atribuindo aos outros impulsos ou intenções que são, na verdade, seus próprios – revelam o quão deplorável é o regime trumpista. Assim como o bolsonarismo no Brasil.
Falsos moralistas, mercadores da fé, vendilhões do templo. Gente que se vale da política para exercer poder e enriquecer – seja vendendo joias desviadas do patrimônio público, seja usando inside information para faturar bilhões no mercado de câmbio. Como, muito provavelmente, aconteceu no dia do anúncio do tarifaço de Trump, articulado com a família Bolsonaro. Um ataque direto contra o Brasil.
Oliveiros Marques é sociólogo, publicitário e comunicador político
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