Sexta-feira, 13 de Junho de 2025

Artigo: ‘Pacote fiscal é justiça social’, por Oliveiros Marques

2025-06-12 às 10:28

Jorge chegou em casa do trabalho. Tirou os calçados ainda do lado de fora. A filha correu em sua direção e se jogou em seus braços. Ele a beijou, a apertou forte, e entrou. Na sala, deu um beijo na testa da esposa e sentou-se ao seu lado no sofá. A televisão estava ligada.

Passavam comerciais: bancos com atores famosos, apostas online com ex-jogadores de futebol, chamadas da própria emissora. Até que uma propaganda chamou a atenção dos dois.

Começava com a imagem de um homem usando capacete de operário, em um canteiro de obras, dividindo a tela com uma mulher de pouco mais de 30 anos, cabelo comprido passando dos ombros. Eles falavam ao mesmo tempo — ou talvez em jogral, não sei ao certo:
“Se você não ganha a vida investindo em fundos ou é dono de empresa financeira, esse recado é pra você.”

A propaganda seguia. O operário empurrava um carrinho de mão com dois sacos de cimento. Estava pesado. Na sequência, a mulher empurrava um carrinho de supermercado, lotado até o topo. Voltava a imagem do operário: agora com mais um saco de cimento. O suor lhe escorria pela testa. Ele para, enxuga o rosto com o braço, encara o horizonte.

Jorge e a esposa assistiam atentos. Uma voz firme sai da televisão:
“O governo federal enviou ao Congresso Nacional uma proposta para cobrar impostos de empresas financeiras, tipo bancos, e das empresas de apostas — as chamadas bets.”

Corte para a mulher no supermercado. Acho que é isso mesmo que os diretores dizem: “corte”. Ela segue pelos corredores e, à medida que anda, os produtos começam a desaparecer do carrinho.

Jorge e a esposa se inclinam para frente no sofá, atentos. A voz continua:
“Com a aprovação dessa proposta, o país vai conter a inflação, garantindo que o seu salário continue valendo mais.”

Eles se olharam. Quase ao mesmo tempo, disseram algo como:
“É verdade. Já passou da hora dos ricos começarem a pagar mais imposto. Não dá pra essa conta cair sempre no colo de quem trabalha por salário, faz os corres, empreende.”

E é verdade, Jorge e esposa.

O cinismo dos que se posicionam contra as medidas de justiça fiscal enviadas pelo governo ao Congresso é absurdo. O capachismo de certos parlamentares diante dos especuladores e daqueles que fazem riqueza em cima da fé das pessoas neste país é criminoso.

A oposição precisa ter coragem de vir a público dizer claramente ao povo o que defende: ou seja, de que quem vive de especulação continue pagando pouco — ou nada de impostos. E que, com isso, a inflação cresça, corroendo o poder de compra da população mais pobre e da classe média.

A linha de atuação da oposição é clara: se for ruim para o governo, que seja ruim para o povo também. Pouco importa se isso significa mais sofrimento, mais perda, mais desespero para milhões de famílias. O que importa é a próxima eleição. Eles se alimentam — e se retroalimentam — disso.

E como sei que os “Nikolas” e outros “malucos”, como os denominou o próprio Bolsonaro em depoimento ao STF, não vão aparecer para dizer o que realmente defendem, penso que o governo precisa fazê-lo. Com toda a objetividade. Com toda a clareza.

Oliveiros Marques é sociólogo, publicitário e comunicador político

*Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do Portal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos termos e problemas brasileiros e mundiais que refletem as diversas tendências do pensamento.