Um dos principais pontos que justificaram a estruturação de uma reforma na tributação sobre o consumo é o da Guerra Fiscal. É comum verificar a concessão de benefícios fiscais por parte dos Estados e Municípios, que se valem da política fiscal como um meio de atrair investimentos, gerar empregos, melhorar a concorrência e aproveitar demais desdobramentos que promovem o desenvolvimento regional.
Esta dinâmica foi alterada pela Emenda Constitucional nº 132 de 2023, que implementou a Reforma Tributária sobre o consumo no Brasil. Regulada pela Lei Complementar nº 214 de 2025, a reforma promove a extinção dos tributos federais PIS, COFINS e IPI, do imposto estadual ICMS e do ISS, tributo incidente sobre os serviços e administrado pelas prefeituras.
A concessão de benefícios fiscais pelo critério geográfico é muito comum no âmbito do ICMS, imposto estadual incidente sobre a circulação de mercadorias, serviços de transportes e de comunicações.
Diversas são as possibilidades exploradas pelos entes federativos: concessões de créditos, isenções, reduções da base de cálculo e da alíquota do imposto, entre outros. Além disso, é possível conceder um benefício específico para empresas que comprovarem a geração de emprego e renda local através expansão da planta industrial, como no caso do programa Paraná Competitivo.
Pela nova dinâmica de tributos sobre o consumo, estes mecanismos serão extintos. Não haverá margem para concessão de benefícios pela via política. A partir de agora, alíquota será única e geral, contando apenas com reduções pré-estabelecidas pela Lei Complementar nº 214/25.
Contudo, este não é o único fator que impede o convite de um Estado para uma grande empresa. Com as novas regras, o novo tributo (IVA-DUAL) será recolhido para o local de destino do produto, mercadoria ou serviço.
Esta mudança promove uma transformação substancial, pois o custo logístico será o grande fator determinante sobre a localização de novas empresas, ou até mesmo a transferência de operações em companhias já estabelecidas. Estar perto do destinatário do produto ou serviço irá reduzir o custo de operação e pouco importará onde se encontra o domicílio fiscal da empresa: a cobrança é sempre para o destino.
Contudo, parece que não há dimensão do impacto socioeconômico que estas mudanças podem causar. Muitas regiões remotas, como o interior do nordeste, conseguiram atrair empresas por meio da concessão de
benefícios fiscais.
Além disso, a questão orçamentária dos entes federativos também será alterada pela nova dinâmica. Ou seja: estamos diante de um novo modo de pensar as políticas fiscais e orçamentárias, afetando empresas e o fisco.
Estes cenários causam algumas inquietantes reflexões: será que a Guerra Fiscal é de fato algo ruim para o país? As reduções no ICMS não ajudaram a impulsionar as econômicas locais, os desenvolvimentos regionais, a geração de empregos e a diminuição no preço dos produtos que chegam ao consumidor final?
Me parece que além destes pontos, há manifesta perda de autonomia dos estados e municípios em elaborarem seus planos políticos e se valerem da função extrafiscal do tributo: a utilização para além do objetivo arrecadatório.
Por fim, cumpre-se frisar que estes pontos serão analisados pelo Supremo Tribunal Federal (STF), que deverá a analisar tais disposições com o elemento essencial de uma alteração jurídica: a manutenção do pacto federativo.
Esta importante estrutura institucional confere aos Estados e Municípios autonomia fiscal e orçamentária, que agora será operada através do Comitê Gestor do IBS, um novo órgão com diversos poderes como: fiscalização, julgamento de processos administrativos, fixação de alíquotas e distribuição do orçamento.
Esperamos e torcemos pela manutenção da harmonia entre os entes políticos, de medidas de flexibilização buscando preservar a autonomia. Caso contrário, haverá um engessamento da governabilidade dos gestores do executivo, cumulado com impactos incertos em âmbitos regionais, causando insegurança e aumento da judicialização em âmbito de controle de constitucionalidade.
Ricieri Calixto é advogado com formação contábil. É consultor tributário em projetos de governança, bem como conselheiro em empresas e famílias empresárias. É especialista em Contabilidade e Finanças pela UFPR, Direito Internacional pela UEL e Direito Tributário pela Anhanguera. Aluno especial do Mestrado em Cooperativas pela PUC/PR. É membro do IDT/PR, IBEF/PR e IBGC. Fundador do Comitê Tributário da ACIPG.
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