A valorização do barril de petróleo tem um duplo efeito para países como o Brasil, que passam por uma profunda desvalorização cambial.
O preço sobe não apenas porque a commodity em si custa mais, mas porque o dólar também está mais caro.
Uma série de fatores explica porque a moeda americana tem se mantido em patamar elevado, acima de R$ 5 por dólar. Alguns são externos, como a expectativa de aumento de juros nos Estados Unidos e de retirada do programa de estímulos monetários, outros, internos.
“Aí entra muito da crise institucional, a briga entre os poderes”, explica Braga.
“E essa imagem muito ruim que o Brasil passa para o mundo inteiro, não apenas na parte política, mas também a visão anti-Ciência [do governo], a política ambiental, com aumento das queimadas, em um momento em que o mundo está cada vez mais sensível a essas questões. Tudo isso acaba afetando a decisão dos investidores internacionais de apostar no Brasil”, avalia.
Os biocombustíveis que entram na composição da gasolina e do diesel também experimentam forte alta, contribuindo para pressionar o preço final dos combustíveis.
O álcool anidro responde por 27% do litro da gasolina vendida dos postos; já o biodiesel hoje equivale a 10% do diesel que sai das bombas.
O primeiro acumula alta de quase 60% desde o início do ano, conforme os dados do Cepea/Esalq. O salto é consequência direta dos efeitos climáticos adversos que têm se abatido sobre o país: a falta de chuvas e as geadas de junho e julho reduziram a produção das lavouras de cana-de-açúcar, sua matéria-prima.
A soja usada no biodiesel, por sua vez, também está mais cara. Com maior demanda e a oferta também prejudicada pelas estiagens, a cotação da commodity acumula alta de mais de 70%.
E a Petrobras?
O dólar e a cotação do petróleo vêm tendo mais influência sobre os preços de combustíveis no Brasil desde 2016, quando a Petrobras passou a praticar o Preço de Paridade Internacional (PPI), que se orienta pelas flutuações do mercado internacional.
A mudança de política foi uma resposta ao controle de preços que vigorou na estatal entre 2011 e 2014 como parte de uma estratégia do governo da então presidente Dilma Rousseff (PT) para segurar a inflação.
O caixa da companhia foi duramente afetado. De um lado, arrecadava menos que o potencial; de outro, chegava a subsidiar o preço, importando muitas vezes combustível mais caro e vendendo-o mais barato no mercado interno para fazer frente à demanda.
Os desequilíbrios levaram a empresa a elevar seu nível de endividamento, comprometendo a capacidade de investimento. Esse também foi um período em que bilhões em recursos foram desviados em grandes esquemas de corrupção.
Apesar de a estatal não ter monopólio sobre o refino no Brasil, a Petrobras ainda é a principal fornecedora de combustíveis no país. É dona de 13 das 18 refinarias em território nacional e concentra 98,6% da capacidade total de produção, conforme os dados da ANP relativos a 2020. Assim, os preços praticados pela empresa acabam tendo reflexo sobre toda a cadeia.
É uma companhia de economia mista e com capital aberto, com investidores privados. A União, contudo, é acionista majoritária.
Nos últimos anos, a companhia não apenas mudou sua política de preços. Ela também mudou seu foco, hoje mais concentrado na extração de petróleo do que no refino, pontua a professora da UFF Julia Braga. O chamado “plano de desinvestimento” da estatal prevê a venda de 8 de suas 13 refinarias.
“O pré-sal é um sucesso retumbante, tem um custo baixíssimo, enquanto a parte do refino não tem tanta competitividade. Então prevaleceu essa ideia de ‘desverticalizar’ para preservar sua geração de lucro”, afirma a economista.
Uma capacidade menor de refino, diz a economista, significa maior dependência das importações, o que deixa a empresa com menor margem de manobra para amortecer as flutuações do mercado internacional sobre os preços.
“Agora a gente está vendo que esse outro extremo [em termos de visão para a empresa] ‘cobra seu preço’. Você perde esse instrumento que poderia ser usado para tentar não repassar de imediato toda a volatilidade que se vê nos preços do petróleo”, completa.
E o ICMS?
No caso da gasolina, a Petrobras responde por cerca de 34% do preço pago pelos consumidores. A estrutura de precificação foi utilizada nesta semana pelo presidente da estatal, Joaquim Silva e Luna, como argumento para defender a atual política de preços. Na ocasião, ele afirmou que “tudo o que excede R$ 2” não é responsabilidade da companhia.
Além dos 34% da Petrobras, cerca de 16,5% representam o custo do etanol anidro, 10,7% vão para distribuição e revenda, 11,3% correspondem aos tributos federais PIS/Pasep e Cofins e 27,7% ao ICMS, tributo estadual.
Há meses o ICMS tem sido objeto de atritos entre o governo federal e os Estados. No fim de agosto, Bolsonaro chegou a afirmar em entrevista que a alta dos combustíveis se devia à “ganância dos governadores”.
Nesse sentido, Braga pondera que as alíquotas de ICMS praticadas pelos Estados não foram alteradas e, assim, não se pode atribuir o aumento nos preços ao tributo.
O valor nominal de ICMS pago por litro de combustível cresceu porque seu custo, usado como base para o cálculo, está maior.
As alíquotas, contudo, são as mesmas praticadas antes da atual crise: tanto em maio do ano passado, quando a gasolina custava em média R$ 4,00, quanto neste mês de setembro, com o preço a R$ 6, o percentual cobrado em São Paulo, por exemplo, é o mesmo, 25%.
do Terra