O Enoturismo se consagrou mundialmente como uma das grandes atividades do setor vitivinícola gerando renda, negócios, valorização do turismo, gastronomia e todos os setores ligados a ele em diversos países. No Brasil, o ramo também é promissor e vem apresentando ótimos resultados. Hoje, vamos falar sobre as regiões brasileiras que proporcionam o enoturismo, dicas para quem já trabalha no setor e para quem quer trabalhar no ramo, qualificação necessári e outras questões pertinentes ao tema. Para conversar sobre isso temos como convidada a Dra Mirna de Lima Medeiros, graduada em Turismo pela Universidade Federal de Minas Gerais, Mestre e Doutora em Ciências pelo Programa de Pós-Graduação em Administração da USP, professora da Universidade Estadual de Ponta Grossa no Curso de Turismo e na Pós-Graduação em Ciências Sociais Aplicadas, editora da Revista Publicatio e especialista em Gestão Pública.
Confira a seguir a Entrevista:
Patrícia – Enoturismo no Brasil é um fenômeno emergente?
Mirna – O turismo enogastronômico não é algo novo. Desde o século XIX, quando aparecem os primeiros guias “gourmet” estimulando que as pessoas se deslocassem para o consumo gastronômico, até as décadas mais recentes, diversos destinos tem se consolidado ou expandido sua oferta com opções enogastronômicas. As grandes organizações da ONU continuam a promover esse turismo cultural específico: vários vinhedos do mundo, incluindo os da Borgonha e Champagne em 2015, agora são listados pela UNESCO como Patrimônio da Humanidade. Várias técnicas ou ingredientes alimentares foram recentemente inscritos na lista representativa do patrimônio cultural intangível da humanidade.
O desenvolvimento mundial atual e sem precedentes do turismo de vinhos e alimentos, que se baseia em exemplos históricos já antigos, faz parte de estratégias globais e locais. Vários locais da América Latina (México, Brasil, Argentina, Peru), Ásia (Índia, Tailândia), América do Norte (Califórnia, Canadá) ou Oceania (Austrália, Nova Zelândia), estão desenvolvendo essa “estratégia gourmet” que visa aumentar a atratividade de seus territórios. Isso porque ao mesmo tempo que integra diversas dimensões culturais para o desenvolvimento dos territórios, propicia aos turistas oportunidades de ter contato com saberes, sabores e sensações diversas.
O Brasil já passou por algumas fases no turismo de vinho, atualmente pode-se dizer que ele cresce pautado na qualificação da produção e consolidação das Indicações Geográficas. Como afirmam Valduga e Gimenes-Minasse: “Novas regiões vinícolas emergem, como na Metade Sul do Rio Grande do Sul, Santa Catarina e no Nordeste brasileiro. Novas experiências enoturísticas passam a ser ofertadas, adequadas à realidade das regiões produtoras e à demanda” (2018).
P – Podemos considerar Turismo rural e Enoturismo a mesma coisa?
M – As segmentações no turismo são formas de dividir a oferta ou demanda de modo a conhecer melhor suas especificidades e melhor atendê-las. Muitas vezes alguns fatores que caracterizam as segmentações se sobrepõem e se complementam, mas quando fazemos esse tipo de classificação buscamos verificar qual é o foco principal e, diante desse foco, o que há de particularidade.
O TURISMO ENOGASTRONÔMICO concentra-se nas formas de “beber bem” e “comer bem”. Pode ser considerada uma forma de turismo cultural quando valoriza produtos locais, regionais e nacionais típicos dos territórios. Pode ser realizado em diversos tipos de instalações como bares, restaurantes, feiras, mercados, eventos e locais de produção (como as vinícolas) e até em meios de transporte (como o trem do vinho que existe no Rio Grande do Sul).
O turismo rural concentra-se no meio rural e em suas atividades agropecuárias e paisagens. O enoturismo pode ser desenvolvido no meio rural quando se trata de visita em locais de produção vitícola por exemplo, mas quando o enoturismo é a motivação principal o foco é o vinho e não a ruralidade ou o bucólico. É importante mencionar, no entanto, que nem sempre isso ocorre. As vezes a parte relacionada ao vinho é considerada um atrativo secundário ou complementar para o turista.
P- Quais as regiões turísticas voltadas para o Vinho no Brasil?
M – Hoje, o país se consolidou como o quinto maior produtor de vinho no Hemisfério Sul, e certamente é um dos mercados que cresce mais rapidamente no globo. A área de produção vitivinícola no Brasil soma 82 mil hectares (dados da Organização Internacional da Vinha e do Vinho, 2019), divididos principalmente entre seis regiões. São mais de 1,1 mil vinícolas espalhadas pelo país, a maioria instalada em pequenas propriedades (média de 2 hectares de vinhedos por família). Obviamente, nem todas elas recebem visitantes ou desenvolvem atividades turísticas.
O pioneiro no desenvolvimento do enoturismo no Brasil é o Vale dos Vinhedos no Rio Grande do Sul. É dele também a primeira indicação geográfica reconhecida do país. No Rio Grande do Sul há também Flores da Cunha, Garibaldi, Farroupilha entre outros. Santa Catarina possui regiões vitivinícolas principalmente nas áreas de maior altitude do estado, como Urubici e São Joaquim. Aqui no Paraná a principal área vitivinícola é próxima a Curitiba, a região conta com as cidades de Campo Largo, Colombo, Piraquara e São José dos Pinhais. No site da Vinopar há um mapa bem legal do roteiro de vinho da região metropolitana de Curitiba. Em São Paulo, temos São Roque; no Nordeste o Vale do São Francisco (VSF) localizado entre os Estados da Bahia e Pernambuco. E há novidades interessantes em Minas Gerais e outros estados também.
Para quem tem mais interesse indico o trabalho do Prof. Vander Valduga e da Profª Maria Henriqueta Gimenes-Minasse “O Enoturismo no Brasil: Principais Regiões e Características da Atividade”.
Link: https://preo.u-bourgogne.fr/territoiresduvin/index.php?id=1635#text
P – Qual a qualificação necessária para quem quer trabalhar no setor vitivinícola?
M – O público que busca o enoturismo é, de forma geral, exigente e conhecedor ou, no mínimo, interessado. Isso faz com que seja fundamental o preparo técnico relacionado ao vinho, mas também o entendimento do comportamento do consumidor, hospitalidade, entre outras questões.
P – Que tipos de atrativos uma propriedade que oferece o Enoturismo pode proporcionar aos visitantes?
M – Segundo o IBRAVIN (Instituto Brasileiro do Vinho), “[o]s rótulos feitos aqui são alegres, jovens, autênticos, antenados e focados nas pessoas que procuram uma vida mais feliz e são atentas a novas experiências. É por isso que os vinhos brasileiros têm a cara do Brasil”. Eu concordo com essa afirmação, pois em boa parte dos casos, as propriedades têm esses aspectos enaltecidos em suas atividades.
Atualmente já temos uma infinidade de opções. Além dos tradicionais tours guiados que explicam a produção do vinho e se encerram com degustações (que também podem variar com diferenciação de linhas de rótulos, explicações mais técnicas com especialistas, entre outras questões), há opções como realizar refeições dentro de caves; “winegardens” e picnics nas áreas externas; apresentações musicais (que vão de música italiana a jazz) ou artísticas combinadas com vinho; passeio de trator no parreiral; harmonizações e provas horizontais ou verticais de rótulos; participação no processo de produção com colheita e até pisada da uva.
As chamadas vindimas, ou festas da colheita da uva, costumam ocorrer entre meados de janeiro até início de março dependendo do ano. Nas proximidades de Curitiba há pelo menos duas vinícolas com programação de vindima. Descendo um pouco mais ao sul, podemos encontrar as programações da vindima em Urussanga (SC) e Bento Gonçalves (RS) que já estão disponíveis online.
P – Teria algumas dicas para quem já é empresário ou atua no ramo?
M – Cabe destacar que há demanda por experiências diferenciadas, personalizadas e exclusivas em alguns casos. Além do conhecimento técnico específico relacionado ao vinho, é necessário conhecer o público que se pretende atender e ofertar novidades sempre. Atualizar-se e saber o que está acontecendo no Brasil e no exterior é fundamental. Além disso, é necessário acolher bem a todos, demonstrando hospitalidade e atenção aos detalhes.
Além das informações gentilmente trazidas pela entrevistada, é importante, ainda, destacar que várias formações são importantes para o setor, desde administração e contabilidade para gerir uma empresa, agronomia para quem trabalha com a parte natural e plantações da propriedade, o turismo para elaboração e execução de projetos turísticos e, principalmente, enólogos e sommeliers que são profissionais ligados especificamente ao vinho e trazem informações fundamentais para os apreciadores da bebida.
Alguns fatores do cotidiano de uma empresa têm valor determinante também no sucesso deste negócio. Atingir o cliente, por exemplo, é o principal objetivo de uma empresa que trabalha com venda de produtos e comercialização de serviços, bom atendimento é fundamental para que o consumidor final, seu cliente, se sinta acolhido, bem recebido e propague coisas boas do seu estabelecimento para mais pessoas. O bom atendimento envolve vários setores, dentre eles:
– Canais de comunicação: são meios excelentes de contato com seu cliente e estão disponíveis principalmente através da internet: email, twitter, facebook, instagram, whatsapp. Se você disponibilizar algum desses canais para seu cliente, esteja presente, dê retorno, responda com simpatia e acolhimento.
– Agenda: organize sua agenda para não haver falhas, muitos turistas e clientes que agendam vem de outras cidade para visitar seu local e raramente poderão alterar suas estadas por conta de falhas no atendimento.
– Treinamento da equipe: treine sua equipe para receber com simpatia e alegria o turista, além disso, informações claras e precisas nas degustações e tours são fundamentais. Uma equipe bem orientada e tratada com respeito pelos seus superiores fará o mesmo com o cliente que chegar no seu estabelecimento e isso é sinônimo de retorno pra você que é empresário empreendedor.
– Atrativos: quanto mais atrativos você tiver para oferecer, mais clientes vão procurar a sua empresa e não esqueça dos cuidados básicos de organização, infraestrutura para receber turistas, higiene e facilidades/praticidade no pagamento.
– Parcerias: parcerias com profissionais da comunicação (jornalistas, fotógrafos, influencers, etc) também são ótimas opções para divulgar ainda mais seu local. Lembre-se, no entanto, de sempre avaliar antes de fechar propostas, verifique o currículo do profissional, os materiais feitos anteriormente, observe o perfil do instagram e seus seguidores – pois atualmente ter um milhão de seguidores não significa tudo, é preciso ver a qualidade do conteúdo postado e a dinâmica do perfil.
Clientes satisfeitos irão comentar com a família e amigos sobre a experiência que tiveram em um estabelecimento comercial e isso poderá trazer ainda mais turistas ou clientes para o local, mas, caso um cliente tenha sido mal recebido, isso também será propagado, o que resulta em um retorno negativo para o empresário. Na era da internet, toda e qualquer informação corre em uma velocidade impressionante! Siga essas dicas simples e tenha certeza do sucesso no seu empreendimento!
Confira no link abaixo a entrevista em vídeo: