E, se simplesmente deixássemos de existir nos momentos mais difíceis de nossas vidas? E se passássemos por um ‘reset’ em dadas circunstâncias em que fôssemos postos à prova de fogo? Quantos transtornos mentais e espirituais seriam evitados? Quantos traumas poderiam ser apassivados?
Isso soa como covardia frente às intempéries da vida, mas, no fundo, é o desejo de muitos que leem este texto. A pergunta retórica que faço é: existe fuga à dura realidade do viver?
A resposta passa pelo entendimento de duas premissas básicas da existência, a saber, Deus e o tempo.
Em primeiro lugar, havemos de nos respaldar a respeito da existência de Deus e sua magnificência em relação à sobrevivência humana. Para tanto, recorro ao Teólogo Magno do Cristianismo, Santo Agostinho, em suas “Confissões”, obra de grande imponência intelectual e espiritual.
Segundo Agostinho: “Nenhuma criação seria possível se a vontade do criador não a precedesse”. Para o Teólogo, Deus é o arquiteto maior de toda obra de que se tem notícia em cima, nos céus, e em baixo, na Terra. Sendo assim, Deus reside na humanidade em misericórdia e graça, simplificando a vida em gestos e atos de humildade e altruísmo.
Não obstante, para o mesmo autor, onde seria possível encontrar Deus? Em “Confissões”, Agostinho responde assim: “Quer nos afastemos de ti, quer nos aproximemos, aí não existe espaço algum, ó verdade, por toda parte dás ouvidos aos que te consultam, e respondes ao mesmo tempo sobre o que querem, mas nem sempre ouvem as respostas que querem”.
Agostinho enfatiza a onisciência e onipresença de Deus que a todos responde, seja por um gesto de amor, por uma atitude de outrem, por uma ocasião de demonstração de amor e fé, por uma solicitude de carinho, pelo afago de um pai ao filho ou de um filho ao pai e, até mesmo, pelos caminhos que Ele mesmo permite que trilhemos através da ciência, por meio das descobertas que aliviam a nossa dor.
Porém, a resposta de Deus nem sempre nos é positiva, mas sempre será propositiva, para que entendamos o que é correto e justo. Dada a nossa insistência nos ledos enganos da vaidade da vida é que não ouvimos o sussurrar de Deus aos nossos ouvidos.
E o que dizer dos que sofrem? C. S. Lewis, em sua obra “O Problema do Sofrimento”, afirma: “O sofrimento é o megafone de Deus para um mundo ensurdecido”. Deste modo, Deus revela sua bondade, não porque é bonzinho, mas porque é justo, sério e correto!
A grandiosidade da obra de Deus no coração humano se dá na alegria que proporciona a este de modo inefável. Agostinho segue, em “Confissões”, com o sentido de felicidade: “Porque a felicidade é uma alegria que não é dada aos ímpios, mas àqueles que te servem de modo desinteressado: tu és essa alegria!” Deus é a verdadeira felicidade, segundo o autor, para quem o próprio Criador se revelou a ponto de mudar sua vida e torná-lo um dos maiores intelectuais de todos os tempos.
Chegamos ao ponto em que pensaremos a respeito do tempo. O que faz, Deus, durante o tempo em que vivemos? Segundo Agostinho: “Não houve, pois, tempo algum em que nada fizestes, pois o próprio tempo é obra tua”. Deus jamais deixou de trabalhar pelo ser humano, portanto somos fruto do incansável labor daquele que tudo pode.
Não dominamos o tempo, mas sabemos muito bem que o Senhor que tudo conhece e tudo pode está no controle de nossas vidas e na condução da história. O tempo passado já foi, o futuro não nos pertence, mas o presente é uma dádiva. Vivamos o hoje com a certeza de que a vida nos deu a chance de refazer nossas trajetórias e mudar o que nos é desconfortável.
Em nossa máquina do tempo, o que diremos para servir de apelo aos dias futuros? Quem estamos sendo e quem queremos ser?
Fica o consolo mais do que presente das palavras de Cristo, que viveu, morreu e ressuscitou por amor daqueles que foram, estavam e vieram a ser:
“Vinde a mim, todos os que estais cansados e sobrecarregados, e eu vos aliviarei.” (Mateus 11:28)