Quinta-feira, 25 de Abril de 2024

Coluna Draft: ‘Moro-Doria: o segundo turno é bem ali!’, por Edgar Talevi

2021-12-01 às 10:37
Foto: Rovena Rosa – Agência Brasil

Discordo de Marx quando diz que a religião é o ópio do povo. A razão é simples: nada há mais efêmero, divergente, compactual e, ao mesmo tempo, cindido, fracionado que a política. Essa sim é o verdadeiro ópio do povo.

Desde a redemocratização, o Brasil assiste a uma coletânea de Comédia grega, ao estilo de Aristófanes, Antífanes e Menandro. Os atores, por ora, convencem, mas sempre carregam a pecha de escultores de um universo diegético alheio à realidade. O povo, contudo, atônito, imerge nas cenas do espetáculo teatral montado às vésperas de cada pleito, à espera de que algum herói possa ascender e erigir a bandeira da liberdade econômica, social, da justiça e da vida. Mas, os protagonistas da comédia passam ao largo do heroísmo. Isso ficaria por conta de outro gênero do teatro Grego Antigo, a Tragédia, em que nobres eram heróis, em constante construção de mitos populares. Qualquer semelhança com o Brasil atual é mera coincidência!

Basta que voltemos o olhar às movimentações do xadrez político da trama da eleição presidencial de 2022. A polarização Lula-Bolsonaro tem poder de estigmatizar o voto na esfera da contumaz divisão que nos é vendida do “nós contra eles”. Jogaram-nos a uma posição em que não se vislumbra horizonte sem dualidades fortemente estabelecidas para permitir um plebiscito a cada 4 anos, minando as forças diversificadas e plurais que possam vir a acompanhar o processo de evolução e progresso naturais de uma sociedade em constante desenvolvimento.

Destarte, surge uma nova aura sobre o Palácio do Planalto. A dita terceira via – neologismo – híbrido de pensamentos divergentes? – neopragmatismo, ou seja lá o que for, ganha robustez nas conversas palacianas de vários estados. A prova disso é a vitória, nas prévias, do novo tucano a se aventurar à jornada do executivo Nacional. Falamos de João Doria.

Saindo de uma eleição intracorporis dividida, rachada, contra Virgílio e Leite, Doria mostra força dentro de seu partido para compor uma chapa que propicie novas atrações ao enredo das eleições do ano que vem.

Não nos esqueçamos de que, além do então governador de São Paulo, estão no páreo – será? – Ciro Gomes (PDT) – mais uma vez –, Rodrigo Pacheco (PSD), Simone Tebet (MDB), Sérgio Moro (PODEMOS) e quem sabe quantos virão?!

Mas, segundo recentes pesquisas, realizadas por diferentes institutos de opinião, as chances de chegada ao segundo turno estão voltadas ao ex-juiz e ex-ministro da Justiça, Sérgio Moro, que, neste momento, ultrapassa Ciro Gomes como terceira força eleitoral. Em breve, mui possivelmente, vejamos o ex-juiz com dois dígitos nas pesquisas de intenção de voto. Isso solidifica sua posição de candidato capaz de fazer frente à polarização Lula-Bolsonaro, tirando votos, principalmente, de seu ex-patrão, o atual Presidente da República, haja vista o nicho eleitoral de ambos estar estabelecido mais à direita – com ressalvas ao atual Presidente, com arroubos de retórica que o desloca à extremidade da direita política.

Isso posto, voltemos ao atual Governador de São Paulo. Sua carreira política – embora tenha “nascido” como o “novo”, divergindo dos “catedráticos” -, foi estabelecida, em parte, pelo apoio de seu “padrinho” Geraldo Alckmin, possível rival na corrida Presidencial, seja pelo PSB ou, até mesmo, em uma vice do Lula – a ver se a estratégia não se altera para uma disputa ao Palácio dos Bandeirantes, pelo PSD. Tão logo chegou ao poder, Doria deu de ombros ao seu antecessor e, em apoio desconfortável, mas fiel, firmou o BolsoDoria, nas eleições de 2018.

Surfando no pragmatismo, Doria, pleiteante ao Planalto, abandonou seu “candidato” presidencial de 2018 e aparece como opção para 2022. Ainda que diminuto nas pesquisas, o PSDB sonha com o retorno ao Planalto. Já se foram 5 derrotas consecutivas: 2002, 2006, 2010, 2014 e 2018, amargando 4% dos votos na última eleição. Nesta perspectiva, a candidatura Doria teria musculatura para se fortalecer e surgir como força para uma disputa contra Lula-Bolsonaro? As vacinas, corretamente defendidas pelo governador tucano não parecem ter surtido o efeito popular como queria seu patrocinador, ao menos não eleitoralmente.

É neste cenário que aparece uma nova perspectiva: uma composição impensada até pouco tempo atrás: uma chapa Moro-Doria, reunindo as forças do capital de votos tucano no Sudeste com a nova-velha onda do “novo”, do não-político, Sérgio Moro. Não se pode desmerecer a ideia, pois de ex-apoiador de Bolsonaro ambos entendem. E, agora, em que está no jogo, Moro precisa afiar o discurso e aprender a arte de fazer aliados – para não falar articular politicamente.

O simples fato de se considerar uma chapa que una um centro-direita social -democrata, com o novo ator político e ex-juiz, que agora busca o julgamento popular nas urnas, poderá arrefecer os ânimos da candidatura de Ciro Gomes e virar a mesa para muitos outros que pensam morar no Alvorada. Um ato dessa envergadura no enredo eleitoral levaria preocupação aos dois “intocáveis” concorrentes que aguardam ansiosamente pelo segundo turno, quais sejam, Lula e Bolsonaro. Seria, talvez, um xeque-mate em muitas expectativas, com o endosso do famoso voto útil, que descarrega sobre a terceira via sua indignação com o desenrolar da trama.

Se Lula-Alckmin pode acontecer, por que não poderíamos esperar que Moro-Doria também ocorra? Lembremos da Comédia grega e seus tantos espetáculos ao público. Não seria nada além do que já vimos, ou seja, o velho pragmatismo adornado de brados de mudança e transformação. Mas, talvez, a verdadeira metamorfose esteja apenas iniciando no Brasil-juvenil. Os grandes impérios sempre estão a ruir. Assim foi com o PT e sua Presidenta e, agora, com o mito e os descontentes com o preço do gás e da gasolina.

Pelo sim, pelo não, tragamos à memória a frase do saudoso Constituinte, Ulisses Guimarães: “Sou louco pelo poder, seduzido pelo poder e para isso que eu vivo”.

as opiniões expressadas por nossos colunistas não refletem, necessariamente,
o posicionamento do portal D’Ponta News.

Coluna Draft

por Edgar Talevi

Edgar Talevi de Oliveira é licenciado em Letras pela UEPG. Pós-graduado em Linguística, Neuropedagogia e Educação Especial. Bacharel e Mestre em Teologia. Atualmente Professor do Quadro Próprio do Magistério da Rede Pública do Paraná, na disciplina de Língua Portuguesa. Começou carreira como docente em Produção de texto e Gramática, em 2005, em diversos cursos pré-vestibulares da região, bem como possui experiência em docência no Ensino Superior em instituições privadas de Ensino de Ponta Grossa. É revisor de textos e autor do livro “Domine a Língua – o novo acordo ortográfico de um jeito simples”, em parceria com o professor Pablo Alex Laroca Gomes. Também autor do livro "Sintaxe à Vontade: crônicas sobre a Língua Portuguesa". Membro da Academia Ponta-grossense de Letras e Artes. Ao longo de sua carreira no magistério, coordenou inúmeros projetos pedagógicos, tais como Júri Simulado, Semana Literária dentre outros. Como articulista, teve seus textos publicados em jornais impressos e eletrônicos, sempre com posicionamentos relevantes e de caráter democrático, prezando pela ética, pluralidade de ideias e valores republicanos.