Sexta-feira, 26 de Abril de 2024

Coluna Draft: ‘Não corra atrás do Prejuízo!’, por Edgar Talevi

2021-09-15 às 10:30

Costumeiramente dizemos, como clichê, que vamos correr atrás do prejuízo. Mas, cuidado! Pode ser que nós o alcancemos, portanto, o preferível, ao bom paladar dos puristas da norma culta da Língua Portuguesa, é correr atrás do lucro, pois, este, certamente, alegrar-nos-ia, concordam?

No entanto, não se preocupem com míseros adereços linguísticos, pois o que vale mesmo é saudar a linguagem de um modo leve e descontraído. Mas, nesse quesito, não se enganem; saudar não equivale a saldar. Saldar, com “l”, significa pagar. Senão, vejamos: “Preciso saldar uma dívida”, ao passo que saudar, com “u”, exprime sentido de cumprimentar. Ex. “Eles saudaram um amigo”.

Com uma coisa todos concordamos: vivemos saudando novos compromissos que necessitam de que os saldemos! Haja paciência! Mas, também, sempre teremos uma nova chance na vida. E isso só se for coisa boa, porque a palavra Chance, advinda do francês, entrou na Língua Portuguesa, conforme registram o minidicionário Luft, o Aurélio e o Michaelis, com sentido positivo.

Sendo assim, podemos dizer que nosso time tem chance de vencer a partida, mas nunca de ser derrotado. Podemos ter a chance da conquista, mas não da frustração!

Porém, vamos estar aprendendo a cada dia, não é mesmo? Opa! Aqui vai outra dica: A frase vamos estar aprendendo, vamos estar fazendo, ou seja lá o que for, não encontra apoio na linguagem dos bons escritores. Tornou-se, deste modo, um modismo. Trata-se, possivelmente, de uma influência da língua inglesa, com o agrupamento de verbos, como I will be doing, só que essa forma se traduz, em português, por vou fazer e não por estarei fazendo. Interessante nossa capacidade inventiva!

Se bem que, certo ou errado, não custa nada tentar escrever e falar melhor, afinal, é gratuito! Isso mesmo, gratuito, sem acento, pois a forma adequada da pronúncia é com ditongo, não hiato.

Evitemos o mau gosto na hora de grafar as palavras; usemos mau, em oposição a bom, e bem, em oposição a mal. Desta forma: “Eles têm mau gosto em relação a roupas”. E, ainda: “Todos estavam mal-humorados”.

Dúvidas se avolumam e chegamos a ficar cara a cara com elas. E, notem que o termo em que há palavras repetidas não tem acento grave indicativo de crase. Mais uma para nossa coleção!

Neste contexto, nada me impede de convidá-los a participar comigo de minhas aventuras gramaticais. E, vejam, que fiz o convite da forma gramaticalmente considerada correta. O verbo convidar é transitivo direto, comportando o pronome “los”, em vez de “lhes”, que cabe somente como objeto indireto. Nisso aqui, quantos e quantos convites já foram feitos, muitos de formatura universitária, de modo incorreto! Valha-nos, Evanildo Bechara!

Entrementes, se eu quero visar a alguma conquista, terei de lutar por isso, até mesmo no conhecimento gramatical. E, aqui vem mais uma peripécia normativa: Visar, no sentido de pretender, almejar, sonhar, é transitivo indireto, sendo necessário o uso da preposição “a”.

Ah! Como é bom namorar nossa Língua Portuguesa! Exatamente isso: namorar a Língua Portuguesa, e não namorar com a Língua Portuguesa, pois o verbo namorar é transitivo direto, não regendo preposição. Quem namora, namora alguém: “João namora Maria”, e não com Maria. Simples assim!

Perceberam que uma coisa acarreta outra? E lá vem mais uma de nossa gramática: O verbo acarretar é transitivo direto, por isso: A decisão acarretou prejuízos. Notem, senhores leitores, que não há regência de preposição “em” após o verbo acarretar.

São tantas dicas que já estamos a fazer hora extra. Ou seria hora-extra? Com ou sem hífen? Bem, prezados leitores, o adjetivo extra liga-se sem hífen a um substantivo. Ex. “Os funcionários faziam hora extra aos sábados”.

E, se pudéssemos mensurar o quanto aprendemos aqui, hoje, seriam muitos gramas ou muitas gramas de conhecimento? Esclareço:  quando se tratar de medida, o adequado é “o grama”. Mas, se falarmos de mato, aí fica por conta da grama mesmo!

Bela aventura esta nossa pelo universo da gramática! Porém, até mesmo a norma culta se prostra aos encantos de uma bela licença poética, quando bem aplicada.

Guardemos a frase célebre de Victor Hugo: “Tudo se rende ao sucesso, até a gramática”.

Coluna Draft

por Edgar Talevi

Edgar Talevi de Oliveira é licenciado em Letras pela UEPG. Pós-graduado em Linguística, Neuropedagogia e Educação Especial. Bacharel e Mestre em Teologia. Atualmente Professor do Quadro Próprio do Magistério da Rede Pública do Paraná, na disciplina de Língua Portuguesa. Começou carreira como docente em Produção de texto e Gramática, em 2005, em diversos cursos pré-vestibulares da região, bem como possui experiência em docência no Ensino Superior em instituições privadas de Ensino de Ponta Grossa. É revisor de textos e autor do livro “Domine a Língua – o novo acordo ortográfico de um jeito simples”, em parceria com o professor Pablo Alex Laroca Gomes. Também autor do livro "Sintaxe à Vontade: crônicas sobre a Língua Portuguesa". Membro da Academia Ponta-grossense de Letras e Artes. Ao longo de sua carreira no magistério, coordenou inúmeros projetos pedagógicos, tais como Júri Simulado, Semana Literária dentre outros. Como articulista, teve seus textos publicados em jornais impressos e eletrônicos, sempre com posicionamentos relevantes e de caráter democrático, prezando pela ética, pluralidade de ideias e valores republicanos.