Sábado, 16 de Novembro de 2024

Coluna Draft: ‘Não viva às custas do governo!’, por Edgar Talevi

2021-09-24 às 10:30

Não viva às custas do governo!

Gramática que se preze custa caro, portanto, há que ser valorizada. E, quando falamos de custas, essas são despesas judiciais, apenas. Por isso: “Não viva às custas do governo, mas à custa dele, no singular mesmo. Ou, à custa de outrem, como preferir, desde que não se maltrate nossa Língua Pátria!

Tudo isso vem ao encontro de nossas necessidades diárias de comunicação. Aqui vale uma ponderação: Vir ao encontro de é sempre uma definição de uma situação favorável: “O prêmio veio ao encontro da cronista!”. Ao passo que, vir de encontro a, expressa ideia de condição contrária, de choque: “O carro foi de encontro ao outro”.

Fácil é dizer tudo isso em alto e bom som. Opa! Percebam, prezados leitores, o deslize, com propósito didático: A frase “em alto e bom som” não encontra guarida na norma culta de nossa Língua; digamos, então: “alto e bom som”, sem a preposição “em”. Parece, neste contexto, que a gramática está em vias de extinção, não é mesmo? Ai, ai, ai! Mais uma para nossa coleção: A expressão adequada, em nível culto, é: “em via de extinção”, com o termo “via” no singular.

A este ponto – pensava este colunista, quando acadêmico de Letras -, seria necessário tomar um empréstimo junto ao banco para comprar tantos livros quantos bastassem para aprender tantas regras gramaticais, porém me vi diante de outra equivocidade; o correto é: “Pedir empréstimo ao banco, não junto ao banco”. Infindáveis normas! Às favas, diria eu, estando ao ponto de cair nas artimanhas do idioma. Mas, percebamos outra coisa: “Ao ponto de” não existe; usemos, em lugar disso, “A ponto de”.

A grosso modo, posso dizer que, enfim, estou me comportando bem em relação a tantas regras, exceto pelo fato de que “A grosso modo” jamais seria dito por Guimarães Rosa ou Machado de Assis. Prefeririam, esses augustos mestres da linguagem, a expressão “grosso modo”: “Era, grosso modo, pior”. Haja paciência!

Ao examinar tantos adereços linguísticos, pensamos que o gramaticalmente correto está incrustrado nas belas letras de poucos escritores. Ledo engano, pois “incrustrado” também não existe. O termo aceito por célebres pensadores de nosso bom e velho ‘Português” é “incrustado”: “A pulseira está incrustada de diamantes

Estamos a ficar meio inquietos com tamanha rigidez idiomática, no entanto, há salvação, pois o vocábulo “meio”, em razão de ser advérbio, fica invariável. Ponto positivo, porque “meios” inquietos não combinaria. Seguindo esse mesmo exemplo, usemos: “meio doente; meio feliz etc.”

Confesso que nem sempre preferi gramática a poesias, com todas as licenças constantes desta última. E, nisso, acertei! O verbo preferir rege a preposição “a”: “Prefiro almoçar a jantar”, mas nunca “almoçar do que jantar”.

Mantenhamo-nos firmes no propósito de navegar por nosso idioma, tal como Fernando Pessoa via as lágrimas de Portugal. Não somos os maiores ou melhores do mundo, mas, talvez, os mais felizes! Até nisso os Estados Unidos perdem para nós. E lá vem este colunista com mais uma peripécia: “Os Estados Unidos perdem”, com o verbo perder no plural, pois acompanha o artigo que, de igual modo, está no plural.

Ademais, permito-me fazer uma breve digressão ao observar um singelo aforismo de Oscar Wilde: “Há duas maneiras de se odiar a arte: odiando-a ou, então, amando-a com moderação”.

Seja assim nossa percepção da linguagem: amemos com moderação, porque a diferença entre o veneno e o remédio é a dose, diria o médico e físico Paracelso. Concordam?

Coluna Draft

por Edgar Talevi

Edgar Talevi de Oliveira é licenciado em Letras pela UEPG. Pós-graduado em Linguística, Neuropedagogia e Educação Especial. Bacharel e Mestre em Teologia. Atualmente Professor do Quadro Próprio do Magistério da Rede Pública do Paraná, na disciplina de Língua Portuguesa. Começou carreira como docente em Produção de texto e Gramática, em 2005, em diversos cursos pré-vestibulares da região, bem como possui experiência em docência no Ensino Superior em instituições privadas de Ensino de Ponta Grossa. É revisor de textos e autor do livro “Domine a Língua – o novo acordo ortográfico de um jeito simples”, em parceria com o professor Pablo Alex Laroca Gomes. Também autor do livro "Sintaxe à Vontade: crônicas sobre a Língua Portuguesa". Membro da Academia Ponta-grossense de Letras e Artes. Ao longo de sua carreira no magistério, coordenou inúmeros projetos pedagógicos, tais como Júri Simulado, Semana Literária dentre outros. Como articulista, teve seus textos publicados em jornais impressos e eletrônicos, sempre com posicionamentos relevantes e de caráter democrático, prezando pela ética, pluralidade de ideias e valores republicanos.