Domingo, 29 de Setembro de 2024

Coluna Draft: ‘Quando Jesus Cristo voltará?’, por Edgar Talevi

2022-01-03 às 10:40

Quando Jesus Cristo voltará?

A Pandemia de COVID pela qual atravessamos aqueceu as discussões em torno do tema do “fim” do mundo e de eventos apocalípticos. Teorias diversas ocuparam espaço nas redes sociais e no imaginário popular. Mas, recorrente é a especulação a respeito da Volta de Cristo, conforme a esperança da igreja cristã, revelada nas páginas dos evangelhos.

O tema ganha notoriedade à medida que conspirações se avolumam, “profecias” novas ganham holofotes e líderes religiosos se posicionam sobre o assunto. Mas, afinal, o que dizem os teólogos sobre A Volta de Cristo?

Em primeiro lugar, é imprescindível afirmar que a crença na Volta de Cristo é basilar à fé cristã a partir das palavras do próprio Jesus, constantes dos evangelhos canônicos (aceitos como inspirados pela igreja cristã).

A igreja primitiva – formada pelos seguidores de Cristo pós-morte e ressurreição de Jesus – vivia à espera de um retorno iminente do Messias. À época, era comum que os cristãos repartissem todos os seus bens materiais, vendessem suas propriedades e dessem à igreja, promovendo partilha de donativos entre os mais necessitados.

Saltando na história, já em tempos pós-modernos, é possível encontrar, ao revisitarmos algumas facetas da história “profética” moderna, muitos “idealizadores” do fim do mundo. Em 2008, a autora de um livro revelador do futuro, Sylvia Browne, afirmou que, por volta de 2020, uma doença grave, do tipo pneumonia, espalhar-se-ia por todo mundo, atacando os pulmões e os brônquios e resistindo a todos os tratamentos conhecidos. A autora morreu em 2013, mas suas ideias vieram à tona com o surgimento da COVID-19.

Para além de previsões e suposições, muitas teorias conspiratórias sobre o reinado do anticristo também ganharam força. Muitas delas engajadas ao movimento antivacina, pregando que um suposto chip seria implantado nas pessoas vacinadas. Outras teorias, mais fortemente ideologizadas, viam na vacina o próprio sinal da Besta (666).

A lista de teorias do fim do mundo é longa e não começou na Pandemia da COVID. Quem não se lembra das discussões em torno do calendário Maia que, segundo alguns intérpretes, previa o fim do mundo em 21 de dezembro de 2012? Isso sem falar do BUG do milênio, que ocorreria no ano 2000, como sendo um problema que afetaria todos os sistemas informatizados na passagem de ano. Aliás, todo fim de “ciclo”, seja década, século ou milênio recebe conotação apocalíptica, mesmo sem nenhuma base teológica.

Entrementes, uma certeza para todo cristão é que Cristo, de fato, prometeu Voltar e buscar a todos quantos são dEle. Neste contexto, vejamos de onde a crença surge e de que forma pensam os teólogos especialistas na questão.

Segundo o evangelho escrito por Mateus, no capítulo 24, conforme afirma o próprio Messias, a vinda de Cristo teria, como sinais: “guerras, rumores de guerras; nação se levantando contra nação, reino contra reino e haveria fomes e terremotos em vários lugares. Além disso, muitos falsos profetas se levantariam e enganariam a muitos. Ademais, a iniquidade se multiplicaria e o amor de quase todos se esfriaria”.

No evangelho escrito por Lucas, no capítulo 21:11, temos a revelação de que “epidemias”, em outra tradução “pestes” surgiriam antes da Volta de Cristo, como alerta para seu retorno.

Com base nos supracitados textos, temos a constatação de que o cenário apocalíptico é previsto por problemas geológicos, sociais, econômicos e de saúde. É fato que terremotos, rumores de guerra, nação contra nação e reino contra reino não é novidade na história humana, mesmo após Cristo. Mas, o alcance global da Pandemia de COVID é elemento estrutural de análise mais profunda.

As grandes epidemias assolaram nações e continentes, mas, de modo inaudito, a COVID-19 alcançou todas as nações, perfazendo a humanidade. Isso está em conformidade com os evangelhos acima citados. A globalização da Pandemia é um alerta para os que creem e comungam da fé cristã. São episódios fortemente ligados a eventos mundiais que têm o potencial de transformar a estrutura das nações e a composição política dos países a partir das eleições que estiverem vigentes neste momento.

O teólogo André Biéler, em sua interpretação do pensamento de João Calvino, narra que a segunda vida de Cristo será precedida de grandes convulsões, reiterando a crença nos evangelhos canônicos.

Segundo Agostinho de Hipona, notável teólogo do século 4, estamos vivendo o milênio apresentado no livro de apocalipse, capítulo 20. Cético quanto à literalidade dos mil anos, Agostinho afirmava ser um período simbólico, não literal, os mil anos em que Cristo reinaria sobre a Terra. Segundo o teólogo, Apocalipse 20 tratava do intervalo entre a primeira vinda de Cristo até o fim do mundo, quando ele virá outra vez. Essa interpretação simbólica do milênio se apoderou da igreja durante 13 séculos.

De acordo com o americano Thomas Sheehan, estudioso do cristianismo primitivo e professor da Universidade Stanford, a crença no arrebatamento e, podemos dizer, no milênio, como período literal é recente, remontando ao século XIX, com o teólogo John Nelson Darby, “pai” do dispensacionalismo. Antes dele, a teoria predominante e aceita pela ampla maioria das igrejas cristãs era a interpretação simbólica do Apocalipse.

Chegando ao século XVI, é possível encontrar em Calvino, reformador, uma base interpretativa importante sobre a segunda vinda de Cristo. Para Calvino, será a segunda vinda um episódio visível para toda a humanidade, estabelecendo o fim da história, em que todos os homens serão julgados. Calvino concorda com Agostinho quanto à não-literalidade do período de mil anos, descrito em Apocalipse 20. Segundo o reformador, seria um “delírio” classificar literalmente os mil anos.

Mas, e quanto à datação da segunda vinda de Cristo? A unânime resposta dos teólogos é pela impossibilidade de se conhecer. Mesmo com todas as pistas à prova, desde o livro profético de Daniel, no AT, perpassando pelos evangelhos e pelo Apocalipse, nenhuma data é definida.

Isaac Newton um dos maiores gênios da história da humanidade, eminente cientista, era um grande entusiasta dos assuntos religiosos e, em seus estudos matemáticos, “previu” a vinda de Cristo. Quem diria! O homem da ciência, ligado aos estudos da gravidade e às leis do movimento, investiu tempo na leitura das Sagradas Escrituras e “cravou” o fim do mundo para 2060, segundo uma carta de sua autoria escrita em 1704. Newton passou cerca de 50 anos escrevendo 4.500 páginas para tentar predizer quando chegaria o fim, até apontar a data de 2060.

Não obstante, Newton cria na literalidade da existência do inferno e, a partir de seus estudos, tentou predizer também a data do retorno de Israel à sua Terra Natal. O retorno dos judeus é uma profecia bíblica descrita no livro do profeta Isaías, 60:8: “Quem são estes que vêm voando como nuvens e como pombas, ao seu pombal?”. A profecia do retorno dos Israelitas se cumpriu em 1948. Newton cria na literalidade da profecia do retorno dos judeus à sua Terra. Ele acertou no conteúdo, mas falhou na datação por 50 anos.

Com isso, é possível perceber que, mesmo o gênio da ciência, erra ao tentar datar fatos bíblicos e proféticos. Mas, uma coisa é certa: embora erre na data, não discorda do mérito do conteúdo. Isaac Newton, de fato, cria no retorno dos judeus à sua Terra Natal – como ocorreu – e na segunda vinda de Cristo.

Segundo o teólogo holandês, Louis Berkhof, em sua Teologia Sistemática, não se sabe a ocasião exata da vinda de Cristo, e todas as tentativas dos homens para determinar a data exata evidenciaram-se errôneas.

Outro renomado teólogo, Millard J. Erickson, segue o mesmo entendimento. Para ele, os textos bíblicos indicam claramente que Cristo voltará, mas o tempo não é claro. Segundo Erickson, apesar de Deus ter estabelecido um tempo definido, esse tempo não foi revelado.

O professor de pós-graduação em Ciências da Religião, da Universidade Metodista de São Paulo, Paulo Augusto Nogueira, autor do livro “O que é Apocalipse”, faz-nos lembrar da advertência do próprio Jesus, no evangelho de Marcos, a respeito de quem deseja prever com exatidão o fim do mundo: “Mas daquele dia e hora ninguém sabe”.

Podemos, neste momento, definir como impossível datar a segunda vinda de Cristo. Nenhum historiador, teólogo ou cientista conseguiu definir ano, dia e hora. Mas, dados todos os contextos por que passa a humanidade, em plena Pandemia global, mergulhada nas incertezas da vida e na convicção da brevidade desta, o apontamento das Escrituras Sagradas, segundo o profeta Amós 4:12 “Prepara-te, ó, Israel, para te encontrares com o teu Deus” é um sábio conselho para que nossos dias sejam recheados de significados, empatia, altruísmo e amor ao próximo.

A mensagem cristã é, acima de tudo, um chamado à vida plena, de valorização do humano e do respeito a todos os povos, promovendo uma sociedade mais justa, harmoniosa e solidária para que a vida aconteça.

foto: Freepik

Coluna Draft

por Edgar Talevi

Edgar Talevi de Oliveira é licenciado em Letras pela UEPG. Pós-graduado em Linguística, Neuropedagogia e Educação Especial. Bacharel e Mestre em Teologia. Atualmente Professor do Quadro Próprio do Magistério da Rede Pública do Paraná, na disciplina de Língua Portuguesa. Começou carreira como docente em Produção de texto e Gramática, em 2005, em diversos cursos pré-vestibulares da região, bem como possui experiência em docência no Ensino Superior em instituições privadas de Ensino de Ponta Grossa. É revisor de textos e autor do livro “Domine a Língua – o novo acordo ortográfico de um jeito simples”, em parceria com o professor Pablo Alex Laroca Gomes. Também autor do livro "Sintaxe à Vontade: crônicas sobre a Língua Portuguesa". Membro da Academia Ponta-grossense de Letras e Artes. Ao longo de sua carreira no magistério, coordenou inúmeros projetos pedagógicos, tais como Júri Simulado, Semana Literária dentre outros. Como articulista, teve seus textos publicados em jornais impressos e eletrônicos, sempre com posicionamentos relevantes e de caráter democrático, prezando pela ética, pluralidade de ideias e valores republicanos.