Domingo, 29 de Setembro de 2024

Ponto de Vista: Enio Verri questiona entendimento do BC de que inflação cresce porque a população está consumindo muito

2024-06-22 às 09:34
Foto: Rafa Kondlatsch/Itaipu Binacional/Arquivo

Com exclusividade ao Ponto de Vista, programa apresentado por João Barbiero na Rede T de rádios do Paraná, na manhã deste sábado (22), o diretor-geral brasileiro da Itaipu Binacional, Enio Verri, que também é economista, explicou o que gerou o atrito entre Lula e a decisão do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central (BC), de manter a taxa básica de juros, a Selic, no patamar de 10,5%.

“Todo país tem um Banco Central e, no caso do Brasil, ele tem um papel de ‘segurar’ a inflação. O papel do Banco Central é não deixar a inflação subir e ele poderia usar de várias maneiras para não deixar a inflação subir. Mas o que ele tem usado é aumentar os juros. O BC entende que a inflação está aumentando porque a população está consumindo muito e, quando o povo consome muito, procura muito comprar as coisas, o preço dos produtos sobe. Se ele sobe os juros, consequentemente, vai sair mais caro a prestação, as pessoas também não estarão ganhando muito, não vão comprar. Não comprando, o preço cai”, explica.

A crítica a esse comportamento do BC, de acordo com Verri, é que a escolha de elevar os juros ainda que, de fato, possa segurar a inflação, deixa o povo mais pobre. Para ilustrar, ele usa o exemplo de uma loja ou boutique, que efetua vendas parceladas. “Como os juros subiram, vou cobrá-los na venda também, senão não consigo pagar minhas contas. A pessoa que não teve seu salário aumentado, que ia comprar essa roupa na boutique, como a prestação ficou muito cara, não compra. A boutique, ao não vender essa roupa – e no final do mês, ela precisa pagar o fornecedor – ela vai tentar vender de qualquer jeito e faz oferta, liquidação. Oferta ou liquidação é vender pelo custo, às vezes, abaixo do custo, para arrecadar o dinheiro e pagar a fatura. Quando ela faz oferta, o preço não sobe, não tem inflação, mas ele [o comerciante] quebra”, ilustra.

O aumento da taxa de juros é criticado pela indústria e pelo comércio, pois, quando sobe, as empresas não conseguem equilibrar suas contas e ficam sem crédito. Verri compara que, nos Estados Unidos, o Banco Central se ocupa tanto da inflação quanto dos empregos, ao passo que no Brasil, o BC se dedica apenas à inflação. “Ele não está nem aí se, ao aumentar os juros, vai gerar desemprego, ele não fica preocupado com isso. E o presidente da República fica, Lula ou qualquer outro presidente que seja, porque ele não quer que haja desemprego, que as empresas quebrem. Quem determina que a taxa de juros continue alta como está é o presidente do BC e o Copom, que se reúne, normalmente, a cada 30 ou 45 dias, analisa como está a economia e esse grupo decide se vai baixar juros, ficar como está ou subir”, critica.

A estabilidade da inflação poderia indicar queda na taxa de juros. Entretanto, não é o que ocorre para a atual gestão do BC. “Aí é que está: eles não se baseiam no que está para a frente, a atual direção do BC olha para trás, o que é um erro, porque a indústria do Brasil, hoje, aqui, na nossa região, não está a todo vapor, porque as vendas não estão boas. As indústrias não estão trabalhando 24 horas, mas de oito a 16 horas. Portanto, tem ociosidade. Ou seja, a indústria pode produzir mais. O desemprego, embora tenha caído muito, ainda existe algum desemprego. Se a indústria pode produzir mais, se tem gente para trabalhar na indústria para produzir mais, se aumentar a procura pelos produtos, não vai ter inflação. Só teria inflação se a indústria estivesse trabalhando 24 horas por dia, se todo o mundo estivesse empregado e aí você vai comprar e não tem produto para oferecer”, analisa Verri.

Para o economista, quem mais ganha com taxa alta de juros são os bancos, o mercado financeiro. O presidente do BC, Roberto Campos Neto, é ligado aos bancos, reitera Verri. “Quando ele sair do BC, porque o mandato dele termina agora em dezembro, ele vai trabalhar, sei lá, num Bradesco, Santander, Itaú, algum banco grande. 10% de juros é a taxa do governo, você paga quase 10% ao mês. Os bancos, as financiadoras, as empresas que fazem empréstimo parcelado para aposentados ganham uma fortuna. Quem vende dinheiro ganha muito, quem vende comida ou força de trabalho só perde”, critica.

Verri explica que não compete ao presidente Lula tomar providência quanto à inflação, porque ela é definida pelo BC, que possui autonomia para tal, sem estar subordinado ao presidente da República. “É por mandato. O Campos Neto foi indicado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e ficou dois anos no governo Bolsonaro e vai ficar dois anos no governo Lula. Quando chegar dezembro, quando o Campos Neto sair, o presidente Lula vai indicar um novo presidente do BC e esse novo presidente, junto com o Copom, vai desenvolver outro tipo de política monetária. O problema é que hoje, no Brasil, temos um presidente da República que quer gerar emprego, salário, renda e desenvolvimento para o povo como um todo e temos um presidente do BC que pensa o oposto: que acha que o importante é o que o mercado financeiro ganhe muito dinheiro”, avalia.

Questionado sobre qual seria o patamar da taxa de juros atual se ele fosse o presidente do BC, Verri analisa que a taxa não pode baixar toda de uma vez, senão se cria uma febre de consumo e a produção não conseguiria ser tão rápida quanto o consumo. “Se eu tenho uma fábrica que trabalha oito horas e os juros baixarem muito rápido e as empresas começarem a contratar, porque o comércio está vendendo, e as pessoas começarem a comprar mais, você não aumenta a produção de um dia para o outro. Tem que comprar matéria-prima, tem que encomendar equipamento. Se você baixar de uma vez só, aumenta a inflação. O ideal é ir baixando a cada reunião do Copom, a cada 30, 45 dias, de forma lenta e gradual, de tal maneira que os 10,5% que ele manteve, se nós pudéssemos, chegar a 6%, 5% até junho do ano que vem”, opina. “Hoje, o ideal seria 8% e é muita coisa, porque em junho do ano que vem chegaria a 4% ou 5% e a inflação é 3%, então, a taxa de juros real seria de um ou dois pontos percentuais, o que é no resto do mundo”, acrescenta.

Em que a Itaipu interfere na definição da tarifa de energia?

Uma pergunta frequente da população em geral é de que forma a Itaipu, com seus recordes de produção de energia, poderia contribuir para a redução da tarifa cobrada no Paraná, onde ela está localizada. “A Itaipu tem como ajudar, mas muito pouco. É importante destacar isso à população. A Itaipu é gigante e, hoje, é a segunda maior usina hidrelétrica do mundo e a que mais produziu energia acumulada no mundo. Em março, completamos 3 bilhões de Megawatt-hora (MWh), o que significa que daria para deixar o planeta todo iluminado por 43 dias. A Itaipu representa 10% de toda a energia consumida no Brasil. A energia estava a R$ 22,60 e agora caiu para R$ 16,71. Ou seja, a Itaipu reduziu em 26% o preço da energia elétrica na nossa gestão. A energia elétrica de Itaipu é uma das mais baratas do Brasil”, explica o economista e diretor-geral da Itaipu.

Quanto ao fato de que a redução em 26% no preço da energia elétrica não refletiu uma redução do mesmo nível na tarifa cobrada, Verri explica que, como a Itaipu entrega apenas 10% da energia consumida, 10% de 26 são 2,6%. “Quando reduzimos a energia, no ano passado, em 26%, na sua conta de luz, caiu 2,6%, que é um valor que você nem percebe se paga uma conta de até R$ 100. Às vezes, a queda é muito grande para o conjunto do país, mas, na sua casa, é muito pequena. O que precisa é que todo o sistema elétrico melhore sua produtividade e, com isso, consiga entregar uma energia mais barata”, diz.

Verri compara a atividade da Itaipu com as demais usinas de energia. “A Itaipu está fazendo o papel dela, somos uma das mais baratas do Brasil, puxamos o preço médio da energia para baixo, principalmente, agora que acabou a dívida e nós conseguimos uma coisa importante: somos uma das mais baratas, investimos na questão ambiental na região e, ainda, fazemos o investimento do Itaipu Mais que Energia. As outras usinas não têm reservatório e, portanto, não fazem política ambiental, não fazem o trabalho de atender aos municípios e a sua energia ainda é mais cara”, frisa.

Confira a entrevista na íntegra

Ponto de Vista 

Apresentado por João Barbiero, o programa Ponto de Vista vai ao ar semanalmente, aos sábados, das 7h às 8h, pela Rede T de Rádios do Paraná.

A Rádio T pode ser ouvida em todo o território nacional através do site ou nas regiões abaixo através das respectivas frequências FM: T Curitiba 104,9MHz;  T Maringá 93,9MHz; T Ponta Grossa  99,9MHz; T Cascavel 93,1MHz; T Foz do Iguaçu 88,1MHz; T Guarapuava 100,9MHz; T Campo Mourão 98,5MHz; T Paranavaí 99,1MHz; T Telêmaco Borba 104,7MHz; T Irati 107,9MHz; T Jacarezinho 96,5MHz; T Imbituva 95,3MHz; T Ubiratã 88,9MHz; T Andirá 97,5MHz; T Santo Antônio do Sudoeste 91.5MHz; T Wenceslau Braz 95,7MHz; T Capanema 90,1MHz; T Faxinal 107,7MHz; T Cantagalo 88,9MHz; T Mamborê 107,5MHz; T Paranacity 88,3MHz; T Brasilândia do Sul 105,3MHz; T Ibaiti 91,1MHz; T Palotina 97,7MHz; T Dois Vizinhos 89,3MHz e também na T Londrina 97,7MHz.