Assédio moral, más condições de trabalho e perda dos direitos a partir da terceirização na educação. Estas foram algumas das denúncias feitas por Sandra Aparecida Cordeiro Teixeira, que atuou como agente educacional por 14 anos pelo Processo Seletivo Simplificado (PSS), em Ponta Grossa. Aos 55 anos, acaba de ser dispensada pela empresa contratada pelo Governo por meio da terceirização. “Não estamos com a nossa carteira regular; houve redução e atrasos de salário; perdemos o vale-transporte; demitiram funcionários que apresentaram atestados de Covid e ainda nos contrataram por uma empresa de São Paulo, quando poderia ser por alguma do Paraná. Espero mudar essa situação e conseguir minha função de volta”, desabafou.
Assim como ela, cerca de 10 a 12 mil pessoas contratadas por Processo Seletivo Simplificado (PSS) foram exoneradas no Paraná. O relato foi feito em uma audiência pública remota sobre a Terceirização da Educação Pública do Paraná, que aconteceu na manhã desta terça-feira (10) na Assembleia Legislativa por iniciativa do deputado Tadeu Veneri (PT). “O relato emocionado da Sandra é apenas um entre tantos que temos recebido da precarização da educação pública em nosso estado com a terceirização dos serviços. Mesmo sem a presença de representantes da Secretaria da Educação, que foi convidada, esse tipo de audiência serve para democratizarmos as informações, para que a sociedade que nos assiste pelos canais de comunicação da Assembleia Legislativa reproduzidos em nossos canais, saiba o que vem acontecendo: um verdadeiro sucateamento da educação pública no Paraná“, afirmou Veneri.
“Chegam muitas reclamações até nós sobre esse problema, entre elas, a falta de funcionários e a rigidez no processo de contratação, e tenho certeza que desta audiência sairão encaminhamentos para tomarmos medidas conjuntas junto ao Governo do Estado“, disse a deputada Luciana Rafagnin (PT).
O deputado Professor Lemos (PT) reforçou a luta pela realização de concursos na educação. “A nossa luta é pela realização de concursos públicos. Esses contratos terceirizados não proporcionam a criação de vínculo com a comunidade escolar. Uma merendeira ou uma auxiliar de limpeza, por exemplo, são servidoras ligadas a todos os outros setores da escola. Participam do cotidiano escolar”.
Silvio dos Santos, diretor do Colégio Estadual Professor João Loyola, em Curitiba, lembrou a importância de agentes educacionais como Sandra dentro da escola. “Eles fazem parte da história da escola. Ajudam a construir o ambiente lá dentro. É importante que se destaque o valor desses funcionários“, afirmou.
Da direção da Confederação dos Trabalhadores em Educação (CNTE), Luiz Carlos Paixão ressaltou que “o Governo aproveitou esse período de pandemia para terceirizar também a educação, o que não podemos aceitar“.
A tentativa de terceirização da educação pública do Paraná começou no governo anterior, que pretendia terceirizar a função de agentes educacionais 1 destacou Hermes Leão, presidente da APP/Sindicato. “O governo Ratinho Júnior aproveitou esse momento de pandemia para enviar um projeto de lei para a Assembleia de terceirização de setores do serviço público. A história não vai perdoar essa covardia”, refletiu. Hermes detalhou que “em novembro de 2020, a folha de pagamento da educação foi de R$ 18 milhões de reais. Este ano, pulou para R$ 28 milhões, com funcionários a menos. Não seria a terceirização uma forma de economia? Pois se gastou muito mais. Um balanço desastroso. E pior: tem diretor e pedagogo limpando escolas por falta de servidores. A terceirização é um desastre. É a total precarização das escolas. Essa lei precisa ser revogada. Estamos questionando isso na justiça”, ressaltou Leão.
Terceirização = precarização – Margaret de Matos de Carvalho, procuradora-chefe do Ministério Público do Trabalho no Paraná, listou, durante a audiência, vários pontos em que julga terceirizar como sinônimo de precarizar. Disse que um fato que chamou sua atenção foi o projeto que resultou na legislação paranaense ter sido considerado constitucional na Assembleia. Ela esclareceu que é preciso denunciar essas empresas ao Tribunal de Contas. “Isso é questionável. Até porque empresas contratadas pelo Estado, pelo que pude averiguar a partir das denúncias que venho recebendo, não são consideradas idôneas”, informou.
Outro ponto que a procuradora levantou foi o avanço da terceirização pública em todos os setores e o fato de isso não ter gerado eficiência no serviço público. “A mobilização é importante, porque tenho esperança que possamos reverter essa legislação, porque é um retrocesso histórico, que fere os direitos fundamentais dos brasileiros”, avaliou. “E o caso da Sandra é um exemplo. Dela e de seus colegas, que devem buscar uma reparação na justiça, inclusive de indenização por violação de direitos humanos“, completou.
Para Marilane Teixeira, professora e pesquisadora do Centro de Estudos Sindicais e de Economia do Trabalho do Instituto de Economia da Unicamp (CESIT/IE), além da falta de qualificação dos funcionários terceirizados, tanto no setor público como no privado e dos baixos salários, surge a problemática da ausência do registro em carteira. “Temos observado que nesse processo de terceirização, não há um vínculo empregatício entre contratantes e contratados, o que consideramos um absurdo um processo que promove a retirada de direitos trabalhistas“, denunciou.
Ela também pontuou outra ausência no processo, nesse caso, reforçando o setor da educação: o pertencimento. “O funcionário terceirizado não constrói uma identidade com o seu local de trabalho. Hoje pode estar em um hotel, amanhã na escola… não se sente parte daquele lugar”, reforçou.
Encaminhamentos – Diante das denúncias recebidas pelos parlamentares, ficou definido, ao longo do debate, que seja realizada uma reunião com o Tribunal de Contas para que se possa entender como está ocorrendo a fiscalização dos contratos e das empresas contratadas; apresentação de um projeto de lei revogando a extinção das categorias de agentes educacionais 1 e 2 da educação e protocolar junto ao Ministério Público um pedido de providências para possível ação de chamamento das empresas para uma mediação em torno das exonerações. “Precisamos lembrar que, por causa dos decretos de calamidade pública, vamos apurar se essas empresas foram contratadas sem licitação e também fazer um pedido de informações à SEED para saber mais detalhes de quem são essas empresas”, concluiu o deputado Tadeu Veneri.
Informações ALEP