O primeiro. Alexandre Kuaray de Quadros sabe bem o que significa essa palavra. Primeiro a se licenciar em Geografia, ele agora também abre caminhos como o primeiro aluno indígena a defender sua dissertação de Mestrado pela Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG). A defesa – e aprovação – aconteceu no início de dezembro, com transmissão ao vivo pelo Programa de Pós-Graduação em Estudos da Linguagem (PPGEL).
Antes de começar a apresentação, Alexandre se disse nervoso. “Mas eu estava confiante que tudo ia dar certo e, quando comecei a apresentar, o nervosismo foi passando e nem vi que passei um pouco do tempo estimado”, conta. No fim, tudo deu certo. “A banca sempre vem com comentários que podem ser bons ou para corrigir, mas os comentários do meu trabalho foram muito válidos, não foi criticado nada”.
Sob o título ‘Racismo: Luta Diária e Desafio do Estudante Indígena na Universidade’, Alexandre abordou os pontos principais sobre o racismo sofrido por estudantes indígenas na instituição. “Escolhi cinco estudantes indígenas de cada curso, que relataram o que vivenciaram na academia, isso ajudou muito para o desenvolvimento da dissertação”. O trabalho teve como referência o livro ‘Racismo Estrutural’, de Silvio Almeida, mas as vivências pessoais também estiveram presentes. “Quem gosta de falar sobre uma situação ruim que passou, né? Mas a gente tem que estar preparado. Quando a gente pisa em lugar desconhecido, temos que nos preparar pro que der e vier”, disse, ao início da apresentação.
O trabalho foi elaborado em quatro capítulos. “Levei bastante tempo para organizar e a minha orientadora me ajudou muito nessa questão da organização. Desde o início fui elaborando o trabalho da melhor forma possível”, relata. A apresentação iniciou com Alexandre relatando casos de racismo sofridos durante a graduação. “Me perguntei esses dias ‘como fiquei calado durante todo esse tempo?’ Porque eu tive que ficar”. Apesar dos desafios, nunca faltou coragem para ele. “Com as histórias de colegas indígenas que chegaram e lutaram pelos seus direitos, eu tive forças para continuar, por isso que esse trabalho não servirá somente para mim”.
Banca
“É de fato um momento histórico para o povo Guarani, pela sua história, pela própria luta e trajetória de Alexandre e tudo que vivenciou para chegar até aqui e, sem dúvida, para a Universidade”, ressalta André Marques do Nascimento, membro avaliador da banca. Para o Brasil, território que passou a levar esse nome a partir de 1527, também é um fato marcante, segundo André. “Este é um movimento de retomada, com a história contada a partir da perspectiva indígena, com um tema necessário, muito atual e absolutamente corajoso”, enfatiza.
O trabalho do Alexandre dará base para estudo e implantação de políticas, segundo a professora Ligia Paula Couto. “Esta dissertação é um grande passo e de um grande aprendizado para nós. O texto ficou muito didático, a divisão dos capítulos nos ajuda a entender o caminhar para conhecer as pesquisas”. Obstáculos em se expressar por escrita? Não no trabalho de Alexandre. “Se havia alguma dificuldade em relação ao que te disseram na graduação sobre expressão de ideias, eu digo: não olhe para trás, o trabalho está posto, com características muito ricas na escrita”.
Emocionada com a fala dos membros da banca, Letícia Fraga, professora orientadora de Alexandre, conta que testemunhou muitos casos de racismo sofridos pelos alunos indígenas citados na dissertação. “Por mais que muitas pessoas tenham tentado demover esses alunos, nós estamos aqui para cumprir esta etapa. E hoje o Alexandre está aqui defendendo a dissertação dele, mostrando que ele tem muita capacidade e a gente que tem muito o que aprender”, destaca.
da assessoria UEPG