Culturalmente, o homem brasileiro não costuma frequentar o médico de modo preventivo e procura os consultórios somente quando já sente que algo está errado. O exame urológico para prevenir – ou diagnosticar – o câncer de próstata, aliás, ainda é um grande tabu, que gera bastante preconceito por desinformação e, pior: justamente por isso que muito deixam de fazê-lo.
Em entrevista ao programa Manhã Total, apresentado por João Barbiero, na Rádio Lagoa Dourada FM (105,9 para Ponta Grossa e região e 90,9 para Telêmaco Borba), nesta sexta (25), o urologista Bruno Fontoura falou a respeito da campanha Novembro Azul, que concentra ações de prevenção em saúde voltada ao homem.
Segundo o Instituto Nacional do Câncer (INCA), 29% dos diagnósticos de câncer no Brasil, entre os homens, é de próstata, o tipo mais comum. Ainda segundo o INCA, foram registrados 65.840 novos casos a cada ano, entre 2020 e 2022. Homens com mais de 55 anos, com excesso de peso e obesidade estão mais propensos à doença.
Segundo Fontoura, mesmo que o câncer de próstata seja o mais comum na população masculina, não é o que mais mata. “O câncer que mais causa mortalidade ainda é o de pulmão. Mas sabemos que, em números absolutos, a prevalência do câncer de próstata é muito grande. Tem um dado que mostra que, entre homens de 90 anos, aproximadamente metade deles terá câncer de próstata”, enfatiza.
O INCA também destaca que, neste ano, ocorreram 1.130 novos casos de câncer de pênis, que pode demandar a amputação do órgão. Os principais fatores de risco são higiene íntima inadequada e infecção por HIV.
O câncer de boca, quinto tipo mais incidente na população masculina, recebeu atenção especial do Ministério da Saúde neste Novembro Azul. Tabagismo, consumo excessivo de álcool, exposição solar sem proteção, infecção pelo vírus HPV e imunossupressão podem favorecer o surgimento da doença, que costuma atingir homens com mais de 40 anos. De acordo com o INCA, a estimativa para o triênio 2020 a 2022 é de 11.180 novos casos a cada ano.
“O grande objetivo do Novembro Azul é criar uma cultura que não existe. O homem não tem esse cuidado e rotina de prevenção. Normalmente, ele vai atrás quando a coisa já está desandando. O intuito maior do Novembro Azul é gerar, na população masculina, uma cultura de autocuidado”, diz.
O foco maior dessa campanha é o câncer de próstata, por ser justamente o de maior incidência entre os homens. “Mas a filosofia do Novembro Azul está relacionada a gerar uma cultura de cuidados no homem. A partir do momento que ele vai a primeira vez, que ele começa a fazer exames anuais, isso gera um comprometimento, ele começa a acompanhar sua saúde, ele sabe que exame está alterado, sabe que ponto do metabolismo pode vir a dar problema futuramente, o que gera um monitoramento, mais de perto, pelo próprio paciente. Rotina gera prevenção e promoção da saúde”, observa o especialista.
O urologista frisa que, no entanto, o homem não precisa esperar o mês de novembro para buscar orientação médica: a rotina de prevenção deve ser adotada ao longo do ano todo.
Importância do diagnóstico precoce
Os exames são indicados para homens a partir dos 40 anos, para homens negros ou com histórico familiar, ou a partir dos 45 anos, em homens brancos e sem histórico familiar. O câncer de próstata é mais comum e mais agressivo em homens negros. O histórico familiar é um fator de risco bem importante a se observar. Para homens que não apresentam fatores de risco, o indicado é fazer o exame anualmente, junto com o PSA. Se houver fatores de risco, o intervalo entre os exames deve ser menor.
Segundo Fontoura, um dos objetivos do Novembro Azul era desmistificar o tabu do exame do toque e torná-lo algo mais rotineiro para os homens. “Noto, no meu consultório, que isso melhorou muito. Hoje, os pacientes já vêm pedindo o exame do toque. Acho que estamos evoluindo como sociedade, nesse ponto, e esse tipo de campanha é importante para isso”, destaca.
“Em meados dos anos 1990, quando surgiu o teste do PSA [sigla para Antígeno Específico da Próstata, em inglês], o paciente chegava com câncer de próstata, no consultório urológico já numa situação bem complicada: com dores ósseas, dificuldade de locomoção, muitas vezes com fraturas, porque não se fazia o acompanhamento, não se fazia o rastreio. Esse paciente chegava num momento sintomático da doença. O momento sintomático da doença, no câncer de próstata é quando a doença sai da próstata e vai para outros órgãos, principalmente para os ossos”, cita.
O urologista ressalta que o rastreio de próstata é crucial porque o câncer desse órgão é uma doença silenciosa. “Se você não fizer anualmente o PSA e o exame do toque, que são os exames de rastreio, o câncer só vai manifestar sintomas quando já tiver saído da próstata, ou seja, você já diminuiu muito as suas chances de cura. Para fazer o diagnóstico cedo e atingir o momento em que a doença é quase 100% curável, você tem que fazer os exames de rastreio”, enfatiza.
Os exames, segundo o médico, geram suspeita e acendem o alerta. Se o paciente tiver um PSA alterado ou se o urologista, no exame de toque, detecta que a próstata tem alguma alteração suspeita, vai solicitar um exame confirmatório, que é a biópsia de próstata. “A biópsia é um exame um pouco mais invasivo, que são tirados pequenos fragmentos da próstata e esses fragmentos vão para uma análise. Se esses fragmentos mostram que tem um tumor de próstata, aí, sim, indica-se tratamento. Portanto, a biópsia confirma; o PSA e o exame do toque nos geram suspeita, são exames de rastreio, na verdade”, explica.
O exame de PSA não dispensa, entretanto, o exame de toque. “Sabemos que 30% dos cânceres de próstata ocorrem em homens com PSA normal. Ou seja, se pegarmos 10 homens com câncer de próstata, três vão ter o PSA normal e, desses três, só vamos ter suspeita de câncer se fizermos o toque. Fazer somente o PSA não é seguro. Você vai ter uma segurança e uma acurácia maior no diagnóstico fazendo o PSA mais o toque”, recomenda.
Alimentação
Fontoura acredita que não existe uma idade mínima para começar a cuidar da saúde, como um todo. Já no que diz respeito à nutrição, ter uma alimentação saudável – evitando gorduras e tendo refeições balanceadas – melhora o desempenho metabólico, a saúde e a imunidade de modo geral. “Não há nenhuma relação específica de alimentos com o câncer de próstata, mas sabemos que alimentos gordurosos e industrializados são mais carcinogênicos, como um todo, não apenas para a próstata. A alimentação gordurosa tem, por exemplo, uma relação com o câncer de intestino. Pensando na saúde, como um todo, a alimentação faz total diferença”, observa.
Incontinência e fluxo urinário
De acordo com o urologista, sintomas relacionados à incontinência urinária não possuem, necessariamente, relação com o câncer de próstata, mas são sinais de outra doença que acomete esse órgão: a hiperplasia de próstata. “É um inchaço de próstata. Sabemos que uretra é um órgão que passa por dentro da próstata e, quando ela incha, acaba inchando para dentro da uretra, que gera uma obstrução ao fluxo urinário. São sinais como gotejamento, jato fraco, dificuldade em esvaziar a bexiga”, comenta.
Fontoura ressalta que o enfraquecimento do jato de urina não é um processo natural do envelhecimento, como muitos acreditam. “Tem-se essa ideia porque a hiperplasia é muito comum. Sabemos que quase a metade dos homens vão ter algum grau de inchaço da próstata e, desses, metade vão ter algum sintoma”, explica.
O gotejamento pós-miccional não é normal da idade e é um sintoma da hiperplasia, que é tratada com medicação.
Confira a entrevista com o médico na íntegra: