Sexta-feira, 15 de Novembro de 2024

“Como as novas variantes do coronavírus afetam a vacinação?”: cientistas da UFPR respondem novas dúvidas da sociedade

2021-06-28 às 13:46

Os pesquisadores também esclarecem questões sobre a gravidade das novas variantes do vírus e explicam como elas afetam a situação atual da pandemia

Em junho, o Brasil ultrapassou a marca de 500 mil mortos pela Covid-19. Um dos motivos do agravamento da pandemia neste ano foi a disseminação de novas variantes do coronavírus, em sua maioria mais transmissíveis e letais do que a cepa original, o que preocupa profissionais da saúde, autoridades e cientistas ao redor do mundo.

Em respostas à sociedade, pesquisadores da Universidade Federal do Paraná (UFPR) esclarecem aspectos das novas linhagens do vírus – como surgem, quais seus efeitos para o organismo, como impactam na vacinação, entre outras questões. As perguntas foram enviadas para a Agência Escola UFPR por meio da ação Pergunte aos Cientistas, que busca facilitar o acesso da população ao conhecimento científico.

A solução apontada pelos cientistas para interromper a disseminação das variantes existentes, bem como evitar o surgimento de outras cepas, é impedir a circulação do vírus. “É essencial continuar com o bom senso e o esforço coletivos, mantendo as atitudes de prevenção, como o isolamento e o distanciamento social, o uso correto de máscaras e a higiene das mãos”, explica a professora Juliana Maurer, do Departamento de Bioquímica e Biologia Molecular da UFPR, uma das pesquisadoras que respondeu às perguntas da sociedade.

Roseli Wassem, pesquisadora do Departamento de Genética da Universidade que também participou da ação, complementa que a vacinação é essencial para reduzir as infecções pelo coronavírus. “Vacinar é um ato de proteção individual e também coletivo, pois diminui a circulação do vírus. Enquanto poucos estiverem vacinados, as chances de contrair a doença ainda são muito grandes”, reforça.

Além de Juliana e Roseli, colaboraram para esta edição do Pergunte aos Cientistas Emanuel Maltempi de Souza, professor do Departamento de Bioquímica e Biologia Molecular e presidente da Comissão de Enfrentamento e Prevenção à Covid-19 da UFPR; Alexandra Acco (professora) e Maria Carolina Stipp (aluna de pós-graduação) do Departamento de Farmacologia da Universidade; Patrícia Dalzoto e Vânia Vicente, professoras do Departamento de Patologia Básica; Douglas Adamoski, do Departamento de Genética da UFPR; Ricardo Belmonte-Lopes, aluno do Programa de Pós-graduação em Microbiologia, Parasitologia e Patologia; e Bruno Lustosa, estudante do Programa de Pós-graduação em Engenharia de Bioprocessos e Biotecnologia da Universidade. Confira abaixo as respostas dos cientistas.“As novas variantes contaminam as pessoas que já receberam as duas doses da vacina? Como isso afeta a vacinação?” (Ibere Dittert, 26 anos, publicitário, Curitiba-PR)
“Como as novas variantes afetam a vacinação?” (Felipe Moreira Matias, 21 anos, estudante, Curitiba-PR)
“As novas variantes podem responder de forma diferente às vacinas já desenvolvidas?” (Matheus Notelo)
“As vacinas atuais são eficazes para as novas variantes?” (Kátia Avelar, economista)
“Como fica a proteção das vacinas usadas no Brasil agora com as novas variantes?” (Helena Argolo, 43 anos, jornalista, Salvador-BA)
Patrícia Dalzoto, cientista UFPR – As novas variantes podem infectar pessoas já vacinadas e elas podem ser transmissoras do vírus, embora, na maioria das vezes, passem pela infecção de forma assintomática ou com sintomas leves.
O surgimento de novas variantes ocorre por mutações no material genético do vírus (RNA). Quanto mais o vírus multiplica, maior a chance de surgirem novas mutações. Por isso, as variantes costumam surgir em locais onde a epidemia ainda não está controlada, uma vez que o vírus está circulando e se multiplicando muito.
As vacinas contra a Covid-19 existentes até o momento apresentam diferentes mecanismos. A CoronaVac (Butantan/Sinovac) utiliza o vírus inativado (morto) e, neste caso, o próprio vírus é capaz de estimular a produção de anticorpos pelo nosso organismo. Assim, quando em contato com o vírus SARS-CoV-2, ele é neutralizado pelos anticorpos.
A vacina Oxford/AstraZeneca/Fiocruz emprega uma tecnologia que usa um vetor viral não replicante, ou seja, um adenovírus (vírus de resfriado comum) que não tem capacidade de se multiplicar. Esse adenovírus é modificado geneticamente para expressar uma proteína do SARS-CoV-2, a proteína S (spike), presente na superfície do vírus. Essa proteína estimula o sistema imune do hospedeiro e esse passa a produzir anticorpos contra essa proteína.
A vacina Pfizer/BioNTech utiliza a tecnologia do RNA mensageiro (mRNA). Ela contém a informação genética para a proteína S do vírus na forma de mRNA e essa molécula é capaz de estimular fortemente o nosso sistema imune, levando à produção de anticorpos. O imunizante da Moderna também utiliza a tecnologia do mRNA.
A vacina Sputnik-V também emprega vetores virais não replicantes para estimular a produção de anticorpos, mas no caso dessa vacina, são dois adenovírus diferentes, em cada uma das doses.
O imunizante da Janssen/Johnson & Johnson também utiliza um adenovírus modificado com material genético de SARS-CoV-2, mas, ao contrário das vacinas citadas anteriormente, é necessária apenas uma dose para alcançar a imunidade desejada.
No caso das novas variantes, as vacinas continuam efetivas, a menos que ocorra uma alteração significativa nas proteínas de superfície do vírus, de modo que os anticorpos produzidos não reconheçam mais essas proteínas e não sejam mais capazes de neutralizar o vírus.
Portanto, é importante controlar a disseminação viral, fazer com que o vírus diminua a circulação e, em consequência, reduza sua multiplicação. Isso limitará o surgimento de novas variantes e diminuirá o risco de surgirem modificações que não sejam contempladas pelas vacinas utilizadas até o momento. Até que 70% a 80% da população seja vacinada, devemos continuar mantendo o distanciamento social, usando máscaras e fazendo a higiene das mãos.

“As variantes podem evoluir até um momento em que terá que ser feita outra vacina, como a da gripe?” (Larissa Castellan, 20 anos, estudante de Arquitetura e Urbanismo na UFPR, São José dos Pinhais-PR)
Patrícia Dalzoto, cientista UFPR – Olá, Larissa. Sim, isso é possível. Se uma variante sofrer mutações que alterem suas proteínas de superfície, reconhecidas pelos anticorpos produzidos após a imunização, as vacinas atuais poderão perder a efetividade. Assim, será necessário atualizar a vacina, à medida que as novas cepas vão surgindo. É o que acontece com a vacina contra a gripe, que é atualizada todos os anos, com as novas cepas em circulação.

“O intervalo de três meses entre as duas doses da vacina da Pfizer é eficaz para novas variantes?” (Marlon Schmidt Polak, 21 anos, estudante, Curitiba-PR)
Patrícia Dalzoto, cientista UFPR – Olá, Marlon. A segunda dose da vacina da Pfizer deve ser aplicada em, no mínimo, 21 dias após a primeira dose. O ideal seria respeitar o menor intervalo de tempo possível entre as doses, uma vez que o tempo entre as doses pode prejudicar a eficácia da vacina, mas ainda não há dados que comprovem essa hipótese. No Brasil, o Ministério da Saúde estabelece um intervalo de três meses entre as duas doses.
Estudos preliminares indicaram que a efetividade da primeira dose é menor contra as variantes alfa, beta e delta, mas ainda são dados inconclusivos.

“Se estão surgindo novas variantes todos os dias, como os cientistas vêem o combate ao coronavírus apenas com a vacina que é resistente a uma variante?” (Cosmo Jadson Alves Leite, 26 anos, professor de inglês, Felipe Guerra-RN)
Patrícia Dalzoto, cientista UFPR – Olá, Cosmo. No caso das novas variantes, as vacinas continuam efetivas, a menos que ocorra uma alteração significativa nas proteínas de superfície do vírus, de modo que os anticorpos produzidos não reconheçam mais essas proteínas e não sejam mais capazes de neutralizar o vírus.
Portanto, é importante controlar a disseminação viral, fazer com que o vírus diminua a circulação e, em consequência, reduza a multiplicação. Isso limitará o surgimento de novas variantes e diminuirá o risco de surgirem modificações que não sejam contempladas pelas vacinas utilizadas até o momento. Até que 70% a 80% da população seja vacinada, devemos continuar mantendo o distanciamento social, usando máscaras e fazendo a higiene das mãos.

“As vacinas têm eficácia contra a cepa híbrida (Reino Unido + Indiana)?” (Lucas Peron Sikora, 17 anos, estudante, Curitiba-PR)
Patrícia Dalzoto, cientista UFPR – Olá, Lucas. Até o momento, não há indícios de que as vacinas disponíveis não sejam efetivas contra as novas cepas de SARS-CoV-2. Mas é fundamental que a multiplicação do vírus seja controlada, pois quanto mais ele se divide, maior a chance de surgirem novas variantes potencialmente mais transmissíveis. Precisamos continuar com as medidas de distanciamento social, uso de máscaras e higienização das mãos, até que 70% a 80% da população seja vacinada.

“Qual das vacinas é a mais eficaz contra as variantes?” (Leonardo Aparecido Leite Chuves, 23 anos, estudante e auxiliar administrativo, Curitiba-PR)
Patrícia Dalzoto, cientista UFPR – Olá, Leonardo. Até o momento, estudos indicam que as vacinas utilizadas no Brasil são eficazes contra as novas variantes. Elas apenas deixarão de ser efetivas se ocorrer uma alteração significativa nas proteínas de superfície do vírus, de modo que os anticorpos produzidos não reconheçam mais essas proteínas e não sejam mais capazes de neutralizar o vírus.

“A minha dúvida é sobre a variante Delta da Covid. É verdade que ela é mais resistente às vacinas disponíveis? Se sim, como está o andamento das pesquisas para uma vacina eficaz contra essa variante?” (Verônica Silva, 27 anos, auxiliar de escritório, Suzano-SP)
Patrícia Dalzoto, cientista UFPR – A variante Delta é considerada uma variante de preocupação, pois estima-se que seja até 40% mais transmissível que a variante Alfa, considerada mais transmissível que a linhagem original de SARS-CoV-2.
Estudos feitos nos Estados Unidos indicam que as vacinas existentes hoje são efetivas contra a variante Delta. Mas é importante tomar medidas para diminuir a circulação do vírus, pois as mutações podem originar variantes com alterações que não sejam contempladas pelos anticorpos produzidos após a imunização.

“Nós, pessoas leigas, podemos, pelos sintomas, reconhecer a variante de alguma maneira?” (Maria de Fátima Lira, 61 anos, aposentada, Mossoró-RN)
Douglas Adamoski, cientista UFPR – Olá, Maria de Fátima. Infelizmente, para a identificação das variantes são necessários testes laboratoriais, sendo dois os principais tipos. Um deles consiste no sequenciamento do genoma do vírus, que é o processo de conhecer toda a informação presente na “receita” que o vírus SARS-CoV-2 utiliza para fazer cópias de si mesmo, processo bem mais demorado que o exame tradicional de diagnóstico (a RT-PCR) e com custo elevado. A outra estratégia envolve utilizar justamente modificações da RT-PCR que permitam separar grosseiramente variantes já conhecidas. Como vantagens, a segunda estratégia é mais rápida e barata, mas não permite descobrir com segurança novas variantes, somente avaliar a presença das já conhecidas.

“Por que as novas variantes parecem causar manifestações mais graves da Covid em adultos jovens do que a cepa original?” (Fernando Comparsi, 38 anos, perito criminal, Salvador-BA)
Douglas Adamoski, Vânia Vicente e Ricardo Belmonte-Lopes, cientistas UFPR – Olá, Fernando. As novas variantes são versões do SARS-CoV-2 com mudanças que alteram como nosso corpo interage com o vírus. Algumas dessas variantes apresentam alterações na proteína espícula (do inglês, Spike ou somente S), que é responsável pelo “encaixe” do vírus nas nossas células. Assim, o vírus consegue infectar alguém após o contato de maneira mais fácil, o que justifica a maior transmissibilidade. Assim, manifestações mais graves podem surgir pela maior facilidade de o vírus atingir mais células e com mais velocidade, dificultando a resposta do sistema imune do paciente.
Existe uma preocupação maior devido à alta taxa de transmissibilidade de pelo menos seis variantes identificadas ao longo do mundo, as quais têm demonstrado um impacto na gravidade dos casos (por exemplo, aumento de hospitalizações e/ou de mortes). As novas variantes parecem ser mais competentes para infectar um hospedeiro suscetível (vulnerável). Porém, é importante reforçar que ainda faltam dados sobre maior letalidade ou gravidade da doença em hospedeiros infectados com essas variantes. No entanto, profissionais de saúde e pesquisadores que estudam o vírus, relataram, a respeito da variante P.1, que existem evidências da relação entre a maior letalidade e a alta incidência de circulação desta.
O modo mais simples para verificar a transmissibilidade do vírus é calcular quantas pessoas novas são infectadas por alguém com Covid-19, principalmente quando não há barreiras sanitárias e vacinação em massa da população. Nesse sentido, no início da pandemia, uma pessoa infectada poderia transmitir o vírus para três novas pessoas, porém, com as novas variantes, ocorreu um incremento nesse valor. Ou seja, uma pessoa infectada com a variante Alfa (B.1.1.7) pode infectar em média quatro pessoas, enquanto a variante Delta (B.1.617.2) pode infectar em média até seis pessoas.
Assim, esse aumento na transmissibilidade observado para essas novas variantes pode implicar em:
1) Como mais pessoas são infectadas em um período menor, o sistema de saúde pode colapsar muito mais rápido que antes;
2) Se antes pessoas idosas ou com comorbidade eram a população de atenção, agora pessoas mais jovens estão sendo infectadas, visto que provavelmente as variantes do vírus conseguem infectar um hospedeiro suscetível mais facilmente.
Por outro lado, cabe salientar que alguns estudos indicam que a imunização contra o SARS-CoV-2 pela vacinação reduz o risco de hospitalização em mais de 90% e, além disso, pode demonstrar o efeito da imunização nas pessoas acima de 60 anos.
Nesse contexto, quanto maior o número de indivíduos infectados, maior o risco de proliferação do vírus, e, consequentemente, pode ocorrer o surgimento de novas linhagens com potencial de gerar um perigo ainda maior do que temos hoje. Para evitar que as variantes se espalhem, é essencial acelerar a vacinação. No entanto, não podemos esquecer que o uso de máscaras, o distanciamento físico e a higiene das mãos são medidas recomendadas e efetivas de prevenção para todas as variantes. Portanto, até que grande parte da população seja vacinada com todas as doses, não podemos reduzir tais medidas, independentemente da idade do indivíduo, as quais são de extrema importância para diminuir a transmissão do vírus e salvar vidas.

“Essa nova variante é mais letal para jovens entre 19 e 28 anos?” (Lucas Rodrigues, estudante de medicina veterinária da UFPR, Curitiba-PR)
Douglas Adamoski, cientista UFPR – Olá, Lucas. Os dados disponíveis mostram que as variantes, particularmente a delta e a gama, apresentam mais complicações para todas as faixas etárias, incluindo jovens. Entretanto, eventos vão aumentar ainda mais a gravidade nessa faixa etária específica, como a maior transmissibilidade da doença: com mais casos, maiores são os números de óbitos.

“As novas variantes são mais agressivas para o organismo?” (Thiago Figueiredo, 21 anos, estudante, Curitiba-PR)
Vânia Vicente e Bruno Lustosa, cientistas UFPR – Olá, Thiago. De acordo com os recentes registros epidemiológicos, existem pelo menos seis variantes circulantes que trazem uma preocupação maior devido principalmente a sua alta taxa de transmissibilidade. Para essas variantes, existem evidências que indicam um impacto significativo na transmissibilidade, gravidade (por exemplo, aumento de hospitalizações ou de mortes) e/ou na imunidade, podendo levar a uma redução na neutralização por anticorpos. Adicionalmente, as diferenças genéticas entre as variantes podem levar a falhas de detecção em exames diagnósticos.
As variantes nomeadas até agora, que causam preocupação, são a Alpha (B.1.1.7), identificada no Reino Unido, a Beta (B.1.351), que surgiu na África do Sul, a Delta (B.1.617.2) originária na Índia e a brasileira P.1 (Gamma), originária de Manaus e de grande circulação no Brasil. Essas variantes que causam preocupação são denominadas por letras gregas, exatamente para diferenciá-las. Além dessas, têm sido registradas outras variantes ao longo do mundo. No Brasil, temos como exemplo a variante P.2, primeiramente identificada no Rio de Janeiro, além de outras, tais como a recente variante identificada como P.5, circulando nos estados do Rio de Janeiro e São Paulo.
A variante Alpha tem sido relatada por ser de 43% a 90% mais transmissível. Pesquisas verificaram também que ela é 64% mais letal e pode causar formas mais graves da doença.
Em relação ao potencial risco à saúde pública da variante Beta (B.1.351), da África do Sul, apesar de não haver ainda dados que associem essa variante à maior severidade ou letalidade da doença, a linhagem tem potencial de transmissão até 1,5 vezes maior e existem evidências de que uma infecção prévia não impede uma nova infecção dessa mesma variedade.
De acordo com pesquisadores do National Center for Disease Control (NCDC) e do CSIR Institute of Genomics and Biologia Integrativa (IGIB) do Reino Unido, a variante Delta (B.1.617.2) é 50% mais transmissível do que a variante Alpha (B1.117), mostrando um risco aumentado de hospitalização em comparação com os casos Alpha. Porém, é importante ressaltar que ainda existem muitos casos em período de acompanhamento.
A variante Gamma (P.1, ou variante de Manaus) apresenta alta transmissibilidade, e embora ainda não haja um consenso, cientistas afirmam que ela pode ser de 2,2 a até seis vezes mais transmissível. Casos de reinfecção também já foram reportados e não podem ser descartados. Faltam ainda dados sobre maior letalidade ou gravidade da doença em infectados por essa variante, mas a impressão dos profissionais de saúde e pesquisadores que estudam o vírus é que essa linhagem teria relação com o maior número de óbitos observados naqueles lugares com alta ocorrência da Gamma em 2021, como Manaus (AM) e Araraquara (SP). Uma outra variante também surgiu no Brasil, chamada de P.2, identificada no Rio de Janeiro, a partir de um caso de reinfecção. Por ser ainda pouco estudada, não há dados sobre sua maior letalidade ou severidade. Dados de sequenciamento genético indicaram que a partir de março de 2021, a variante Gamma (P.1) vem sendo a predominante no Brasil, com um decréscimo acentuado da circulação da P.2.

“Existe a possibilidade de surgir uma nova variante em que os mais afetados serão crianças e menores de 18 anos? E se sim, como será tratada, visto que as vacinas ainda não podem ser aplicadas neste grupo?” (Julia Cetnarsky, 21 anos, São José dos Pinhais-PR)
Douglas Adamoski, cientista UFPR – Olá, Julia. O processo evolutivo tem um grande conjunto de possibilidades e, sim, seria possível uma variante que afetasse mais crianças e menores de 18 anos. Entretanto, mesmo sem o surgimento de uma nova variante, vamos observar esse efeito com o avançar da vacinação: com as populações de maior idade reduzindo a circulação do vírus, a tendência é que, proporcionalmente, vamos observar mais casos entre pessoas jovens. O ponto positivo é que várias vacinas já estão em teste para a aplicação nesses grupos específicos. Por exemplo, a vacina ComiRNAty (Pfizer) já recebeu liberação em alguns países para aplicação acima de 12 anos e a CoronaVac (Sinovac) já pode ser aplicada em maiores de três anos na China. Assim, a vacinação também vai alcançar esses grupos.

“Alguma dessas variantes pode piorar a situação atual da pandemia?” (Giovanna Paola Barbosa de Santana, 22 anos, autônoma, Curitiba-PR)
“Apesar do aparecimento de novas variantes, tem como a pandemia acabar em breve?” (Gabriela Gnoatto Paiz, 21 anos, estudante, Curitiba-PR)
Alexandra Acco, cientista UFPR – Olá, Gabriela e Giovana. Sua dúvida sobre as variantes e a continuidade ou finalização da pandemia é pertinente, pois algumas mudanças podem afetar as propriedades do vírus, como a facilidade com que ele se espalha, a gravidade da doença ou o desempenho de vacinas, medicamentos, ferramentas de diagnóstico ou outras medidas sociais e de saúde pública. A Organização Mundial da Saúde (OMS), em colaboração com instituições de pesquisa, tem monitorado a evolução do SARS-CoV-2 desde janeiro de 2020. No final de 2020, o surgimento de variantes que representavam um risco maior para a saúde pública global, dentre elas a P.1 (Manaus), aceleraram uma nova classificação: Variantes de Interesse (VOIs) e Variantes de Preocupação (VOCs), a fim de priorizar o monitoramento e informar os países e o público sobre quaisquer alterações necessárias para reagir à variante e prevenir sua disseminação. Até o momento, são cinco as VOCs, identificadas em diferentes países (Reino Unido, África do Sul, Brasil e Índia) e que exigem maior cuidado.
Apesar dessas variantes, as vacinas contra a Covid-19 que estão sendo utilizadas devem fornecer alguma proteção contra novas variantes do vírus, porque todas as vacinas levam à ampla resposta imunológica.
O que está bem claro é que a vacinação mundial em massa é a forma mais eficiente de controlar a pandemia, e até que isso não avance, os cuidados individuais e coletivos são fundamentais (máscaras, distanciamento social e higienização de mãos e ambientes), pois precisamos continuar reduzindo a chance de propagação do vírus, reduzindo o risco de sermos expostos e de expor outras pessoas ao vírus. Essas medidas funcionam contra todas as variantes, reduzindo a quantidade de transmissão viral e diminuindo as chances de o vírus sofrer mais mutações. À medida que mais pessoas são vacinadas, espera-se que a circulação do vírus diminua, o que também levará a menos mutações e variantes, e consequentemente, ao controle da pandemia. Porém, não sabemos se o tempo para isso será “breve” como a Gabriela mencionou na pergunta, pois dependerá da velocidade de vacinação em nosso país e no mundo todo.

“Qual é o plano de contingência para essas novas variantes?” (Ana Leticia, gestora hospitalar, SP)
Alexandra Acco e Maria Carolina Stipp, cientistas UFPR – Olá, Ana Leticia, esperamos que esteja bem. As recomendações da Organização Mundial da Saúde são para que os países:
1) Identifiquem as variantes do SARS-CoV-2, através de sequenciamento genético;
2) Relatem os dados a respeito das variantes, para que seja possível compreender a sua transmissibilidade e agressividade, e assim desenvolver métodos mais eficazes de controle;
3) Incluam testagem em massa da população, promovendo o isolamento e tratamento dos casos, assim como o rastreamento do contato e isolamento para esses.
Além disso, é possível citar o controle de fronteiras, aeroportos, portos e rodoviárias para reduzir a entrada de indivíduos contaminados (sintomáticos ou assintomáticos), fazendo testagem e quarentena de passageiros e trabalhadores destes locais. A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) emitiu recentemente uma nota técnica (Nº 5/2021/SEI/GQRIS/GGPAF/DIRE5/ANVISA) que atualiza as medidas sanitárias a serem adotadas em portos e embarcações em resposta à pandemia. A Infraero também tem recomendações para o controle em aeroportos, como barreiras sanitárias. Por exemplo, no final de maio de 2021, o Aeroporto Internacional de Guarulhos (SP), o mais movimentado do país, começou a fazer triagem de passageiros provenientes de alguns estados (Rio de Janeiro e Maranhão) e países, para tentar conter a espalhamento da variante Indiana (B.1.617), que já foi identificada no Brasil.
Contudo, até o momento não há plano de contingência nacional específico para as variantes no Brasil. Para que possamos nos proteger, os cuidados com higiene pessoal e isolamento social (quando possível) são essenciais.

“Se eu pegar uma variante e depois pegar outra, é reinfecção ou novo caso?” (Marina Ilha Zimmermann, 22 anos, estudante, São José-SC)
Alexandra Acco, cientista UFPR – Olá, Marina. Quando uma pessoa recebe diagnóstico positivo para a Covid-19 pelo teste RT-PCR, o que efetivamente se detecta é a presença do vírus no organismo, e geralmente não se sabe qual variante que está infectando – para isso, é necessário fazer o sequenciamento viral. O sequenciamento genômico do vírus, que identifica qual variante está causando a infecção, é de interesse de instituições de saúde e epidemiológicas, pois permite mapear as variantes em diferentes regiões ou países, e então produzir dados sobre sua transmissibilidade e gravidade. Pelos critérios do Ministério da Saúde, para confirmar casos de reinfecção, o paciente precisa ter dois resultados positivos verificados por diagnóstico molecular (RT-PCR), com intervalo igual ou superior a 90 dias entre os dois momentos da infecção, independentemente da condição clínica. A reinfecção, nesse caso, é considerada um novo caso. Porém, um estudo da Universidade Federal de Sergipe (UFS) mostrou que os profissionais de saúde têm sido os mais afetados pela reinfecção antes dos 90 dias. Trinta profissionais observados foram reinfectados em um intervalo médio de 50 dias entre abril e julho de 2020. Esses dados, no entanto, não distinguem formalmente entre reinfecção e reemergência de um reservatório de infecção crônica pelo SARS-CoV-2.
A Fiocruz reportou o primeiro caso de reinfecção no Brasil no final de 2020. As amostras do paciente foram submetidas à técnica de sequenciamento genético, em que foi constatada a presença de linhagens distintas do vírus, sendo o vírus da amostra coletada em junho pertencente à linhagem B.1.1.33 e o da amostra de outubro derivado da linhagem B.1.1.28.
Ainda não há um consenso sobre a duração e a eficácia dos anticorpos produzidos pelo organismo contra o SARS-CoV-2. Um estudo recente feito por pesquisadores de Cingapura trouxe evidências de que a duração dos anticorpos pode variar de uma pessoa para outra, de poucos dias a seis meses. Assim, a resposta imunológica pode variar para cada pessoa, podendo ser reinfectada pela mesma variante, por variante diferente, ou ter uma reativação da infecção anterior, sendo que apenas o sequenciamento do genoma viral dará resposta às variantes causadoras da infecção/reinfecção.

“O uso de máscaras ainda protege contra as novas variantes?” (Valéria Silva, 38 anos, assistente administrativa, Curitiba-PR)
Emanuel Maltempi, cientista UFPR – Obrigado pela pergunta, Valéria. Fala-se tanto das diferenças das variantes que é comum se achar que se trata de outro vírus. Na verdade, todas as variantes do coronavírus têm o mesmo tamanho e são transmitidas pelas gotículas e aerossóis que emitimos quando falamos, tossimos ou espirramos. Assim, os meios de impedir a transmissão são eficientes para todas as variantes. As máscaras do tipo PFF2, N95 ou KN95 conferem o mesmo nível de proteção. O distanciamento social também. As variantes de preocupação são mais transmissíveis porque têm mais vírus nas gotículas e, principalmente, essas variantes são capazes de grudar com muito mais eficiência nas nossas células. Assim, o nível de contaminação menor tem mais chances de causar a Covid-19 quando se trata das chamadas variantes de preocupação ou variantes preocupantes. Por isso, o cuidado com o uso correto das máscaras e a escolha de uma máscara que cubra bem boca e nariz, deixando o mínimo espaço entre a máscara e pele, é da mais alta importância nesse momento que a variante chamada P1 é a predominante. Em resumo, todos os cuidados já preconizados para evitar a transmissão da Covid-19 valem para as variantes de maior transmissibilidade – máscara, distanciamento, ambientes abertos e uso de álcool em gel -, mas é mais importante ainda que sejam seguidos à risca. No caso específico das máscaras, se você puder usar uma do tipo PFF2 ou N95, vai estar melhor protegida.

“Os testes reconhecem a nova variante do coronavírus e as vacinas têm eficácia contra ela?” (Stephanny Pascoal, 23 anos, estudante de enfermagem, Felipe Guerra-RN).
Emanuel Maltempi, cientista UFPR – Essa é uma excelente pergunta, Stephanny. Os testes moleculares por RT-PCR detectam parte do material genético do vírus. Portanto, como a variante tem mudança da sequência de bases, é possível que possa escapar do teste. Mas os bons testes detectam duas ou mais partes do genoma do vírus, e as chances dos dois alvos terem mutação é extremamente baixa. Se um dos alvos for detectado, a presença do SARS-CoV-2 é identificada. Isso aconteceu com o teste de uma empresa, que tem três alvos. Um dos alvos não é detectado na variante B.1.1.7, mas a detecção de apenas dois alvos não afetou a qualidade do resultado. Por outro, os pesquisadores passaram a usar o kit para identificar a variante quando o alvo específico falha, sendo possível inclusive analisar os dados antigos e identificar quando a variante apareceu. Já o teste de antígeno usa um anticorpo para detectar o vírus na secreção de nasofaringe, assim, em princípio, uma mudança nas proteínas virais que são detectadas também poderia afetar o resultado, mas novamente essa hipótese é muito improvável. O mesmo raciocínio pode ser aplicado para os testes imunológicos. A explicação geral acima pode não se aplicar completamente para alguns testes específicos, mas de forma geral se aplica à maioria dos testes disponíveis. Assim, em resumo, os testes atuais são bastantes confiáveis para se detectar as variantes, embora hipoteticamente seja possível que possam falhar em decorrência das mutações das variantes. Quanto às vacinas, se o antígeno vacinal utilizado compreender a região da mutação, é possível que não tenha eficácia. Mas novamente, o antígeno consiste de uma ou mais moléculas virais, portanto possui vários alvos para nossos anticorpos, de forma que é improvável que as vacinas não sejam eficientes para as variantes. A eficiência pode ser mais reduzida, mas ainda dentro dos parâmetros necessários para conferir imunidade contra a doença. Na verdade, as variantes de preocupação têm mutação na proteína S, principal antígeno utilizado em todas as vacinas disponíveis atualmente, mas os resultados mostram que as pessoas que receberam duas doses das vacinas estão efetivamente protegidas contra as variantes. Mas atenção, no caso das variantes, são necessárias as duas doses de todas as vacinas de duas doses para conferir a imunidade.

“Sobre alimentação, muito se fala que o hábito de comer animais provoca essas mutações e a existência de variantes. Isso é verdade?” (Maria de Fátima Lira, 61 anos, aposentada, Mossoró-RN)
Juliana Maurer, cientista UFPR – Olá, Maria de Fátima, agradecemos pela sua participação. O hábito de comer animais ou seus produtos (dependendo das condições sanitárias) pode estar envolvido ao aparecimento de zoonoses de origem alimentar. Um exemplo de zoonose de origem alimentar é a salmonelose, infecção causada por bactéria Salmonella enterica por ingestão de ovos contaminados. De maneira geral, zoonose ou doença zoonótica corresponde a toda doença ou infecção transmitida por animais aos humanos, causada por bactérias, vírus e protozoários, ou seja, os patógenos de espécies animais que são transmitidas aos seres humanos. Essa transmissão pode ser direta ou indireta (com participação de um vetor ou intermediário). Vários fatores estão envolvidos no aparecimento de doenças zoonóticas, desde causas ambientais, como desmatamento, mudanças climáticas, controle da vida selvagem e práticas agrícolas, como modo de vida, hábitos culturais e globalização, incluindo aumento da urbanização, medidas de controle sanitário e meios de transporte. Dessa forma, como não está elucidado como ocorreu o aparecimento do SARS-CoV-2, causador da Covid-19, não é possível afirmar se há relação entre a ingestão de animais e a sua origem.
Em relação às mutações e existência de variantes, pode-se dizer que o surgimento de mutações é um evento natural, esperado e aleatório, dentro do processo evolutivo dos vírus, em função das próprias características do seu ciclo de vida. Em uma das etapas do ciclo de vida, o material genético do vírus (no caso do SARS-CoV-2, o material genético é o ácido ribonucleico, RNA) é copiado para formar novos vírus. As mutações são mudanças no material genético, que ocorre durante a etapa de cópia desse material. Assim, as variantes virais são aquelas que apresentam qualquer alteração do material genético comparando com o material genético do vírus original.

“Quais variantes temos?” (Naiane Ribeiro Prandini)
Juliana Maurer, cientista UFPR – Olá, Naiane, agradecemos pela sua participação. De acordo com o boletim da Organização Mundial da Saúde (OMS) de 15 de junho de 2021, há um total de quatro variantes (classificadas como variantes de preocupação) e sete variantes (classificadas como variantes de interesse) para o vírus SARS-CoV-2, causador da Covid-19. Como comentado, a OMS divide as variantes em dois tipos: as de “preocupação” e as de “interesse”. As variantes de preocupação (em inglês Variant of Concern, VOC), como o próprio nome já diz, são variantes que preocupam, pois as mutações estão associadas a uma ou mais alterações em um grau de significância para a saúde pública global, como aumento da transmissibilidade, aumento da virulência, agravamento dos sintomas, diminuição da eficácia de diagnóstico ou das vacinas e das terapêuticas disponíveis, por meio de uma avaliação comparativa. As variantes de interesse (em inglês Variant of Interest, VOI), apresentam em seu genoma mutações com implicações fenotípicas (se referem às características observáveis de um organismo) estabelecidas ou suspeitas quando em comparação com um isolado de referência. A lista das variantes está apresentada abaixo.

Imagem: Adaptado de Organização Mundial da Saúde (OMS)

“Qual o fator gerador das variantes do coronavírus?” (Kátia Avelar, economista)
Juliana Maurer, cientista UFPR – Olá, Kátia, agradecemos pela sua participação. De forma simplificada, pode-se dizer que quanto maior o número de pessoas infectadas, maior a oportunidade para o aparecimento de novas variantes. Quanto maior o número de casos ativos, ou seja, pessoas com o vírus, maior será a possibilidade para o aparecimento das variantes. Vamos explicar, simplificadamente, sobre a biologia do vírus e como as variantes podem ser geradas para tentar esclarecer melhor. O vírus é um organismo intracelular obrigatório, que significa que o vírus depende da célula hospedeira para se multiplicar. Então, após entrar dentro da célula, ele começa o processo de replicação e expressão gênica, e é nessa etapa que são feitas cópias do material genético do vírus para formar novos vírus. Como esse processo é muito rápido, podem ocorrer mutações ou mudanças no material genético durante essa etapa. Assim, as variantes virais são aquelas que apresentam qualquer alteração do material genético comparando com o material genético do vírus original. Nem toda mutação será benéfica para o vírus. Porém, se as mutações resultarem em um vírus mais transmissível, que provoque agravamento dos sintomas, que escape da resposta imunológica, ou que diminua a eficácia de terapêuticas e vacinas, essas mutações vão tornar os vírus mais eficazes “no propósito de ser um agente infeccioso”. Desta forma, para impedir o surgimento de novas variantes, é essencial continuar com o bom senso e o esforço coletivos, mantendo as atitudes de prevenção (isolamento e o distanciamento social, uso correto de máscaras e a higiene das mãos). Aliada a essas medidas, a vacinação em massa é uma medida eficaz e necessária para diminuir a taxa de infecção e assim o surgimento de novas variantes.

“Queria saber mais da nomenclatura nova das linhagens recomendada pela OMS” (Pedro Henrique Vianna dos Santos, 24 anos, mestrando em Química na UFPR, Curitiba-PR)
Juliana Maurer, cientista UFPR – Olá, Pedro Henrique, agradecemos pela sua participação. Em 31 de maio de 2021, a Organização Mundial de Saúde (OMS) alterou a nomenclatura das variantes do SARS-CoV-2, causador da Covid-19, as quais passaram a ser denominadas de acordo com as letras do alfabeto grego (total de 24 letras; abaixo representado), em vez do local onde a cepa foi descoberta primeiro. No caso das variantes de preocupação (em inglês Variant of Concern, VOC), a variante britânica (B.1.1.7) passa a se chamar Alpha, a sul-africana (B.1.351) – Beta, a brasileira (P.1) – Gamma, e a variante indiana B.1.617.2 foi renomeada como Delta. As outras sete variantes (classificadas como variantes de interesse, em inglês Variant of Interest, VOI) foram denominadas com as letras épsilon, zeta, eta, têta, iota kappa, e lambda, seguindo a sequência do alfabeto. As futuras variantes do Sars-CoV-2 seguirão o mesmo sistema. Essa proposta de modificação de nomenclatura teve como objetivo primeiro desvincular as variantes dos países em que foram encontradas, evitando qualquer atitude discriminatória. Além disso, essa nomenclatura utiliza rótulos simples, fáceis de dizer e lembrar para as principais variantes do SARS-CoV-2. A forma de denominação foi escolhida após ampla discussão com especialistas que fazem parte dos sistemas de nomenclatura existentes, especialistas em nomenclatura e taxonomia de vírus, pesquisadores e autoridades nacionais. As denominações pelas letras do alfabeto grego não substituem nomes científicos existentes (por exemplo, aqueles atribuídos pelos sistemas GISAID e Pango), as quais transmitem informações científicas importantes e continuarão a ser usados em pesquisas.

“Precisamos de qual porcentagem da população vacinada para podermos voltar ao normal?” (Matheus Henrique Cichon, 19 anos, estudante da UFPR, Pinhais-PR)
Douglas Adamoski, cientista UFPR – Olá, Matheus. A porcentagem da população imunizada para interromper a circulação de um vírus depende de dois fatores, principalmente: a taxa efetiva de reprodução do vírus (também chamada de R, que indica quantas pessoas em média cada infectado contamina) e a eficiência da vacina utilizada em evitar novas infecções. Assim, quanto maior a adesão da população a medidas de higiene e distanciamento e maior a eficácia da vacina, menores são as porcentagens necessárias. Para a Covid-19, considerando as vacinas disponíveis, este valor parece estar ao redor de 65% e 75% de pessoas vacinadas com as duas doses. Entretanto, quanto maior a taxa de imunização da população, maior a efetividade da proteção coletiva em reduzir o número de mortes, dado que as pessoas imunizadas protegem quem não pode se vacinar ou não desenvolveu resposta imune após a vacinação, evitando a disseminação do vírus.

“Vocês têm alguma estimativa de quanto tempo ainda vai levar para a vacinação de toda a população ou o fim da pandemia?” (Gustavo Pedroso Vaz, 18 anos, estudante, Ponta Grossa-PR)
Douglas Adamoski, cientista UFPR – Olá, Gustavo. A vacinação de toda a população habilitada para as vacinas disponíveis com uma dose no Brasil tem previsão de acontecer ainda neste ano, de acordo com o calendário de entrega de doses do Ministério da Saúde. Todavia, é importante lembrar que a imunização completa se dá com o recebimento do programa completo, que inclui duas doses para a maior parte das vacinas, o que só irá acontecer no ano que vem.

“Como cidadão belga residente no exterior, eu e minha esposa recebemos o direito de tomar as duas doses de uma vacina em Bruxelas. O mais cedo que conseguiria viajar seria na segunda metade de outubro. Considerando essa data, o que provavelmente vai acontecer, então, é que vou receber uma dose de alguma vacina, seja Oxford/Astrazeneca, seja Coronavac, seja Pfizer, aqui em São Paulo em um momento entre a segunda metade de julho e a primeira metade de setembro. Já que Janssen é de dose única, nesse caso a dúvida não se coloca. Agora, as doses de Oxford e Pfizer, no Brasil, são dadas com três meses de intervalo. Na Bélgica, não teríamos como escolher a vacina que receberíamos (pode ser Oxford/Astrazeneca, Pfizer, Moderna, Janssen e possivelmente CureVac). Um cenário possível, é, portanto, que recebemos uma dose ‘brasileira’ de Coronavac, Oxford, ou Pfizer no começo de setembro (digamos), que viajamos para Bélgica na segunda metade de outubro, onde receberíamos uma dose ‘belga’ de Pfizer ou Moderna, e uma segunda dose lá antes de voltar ao Brasil (e nesse caso obviamente não iríamos tomar uma quarta dose, a segunda dose brasileira). A pergunta é: existe alguma contraindicação? Entendo que ainda não há muito estudo sobre a interação entre diferentes vacinas, sobre se são intercambiáveis por exemplo, mas a minha dúvida é especificamente sobre efeitos indesejados: poderia haver algum perigo ao tomar três doses de duas vacinas diferentes em um prazo de dois meses?” (Peter Maurice Erna Claessens, 45 anos, professor de terceiro grau, São Paulo-SP)
Douglas Adamoski, cientista UFPR – Olá, Peter. O cenário ideal sempre é não combinar diferentes imunizantes, dado que tal cenário não foi testado nos ensaios clínicos. Ou seja, a eficácia dessa combinação ainda não é conhecida – apesar de não existir evidência de que tal “mistura” possa trazer um efeito negativo, além de uma possível proteção menor. Quanto a tomar as doses do mesmo imunizante em países diferentes, não existiria um problema, dado que os fabricantes seguem rígidos procedimentos para manter a mesma formulação em todas as doses fornecidas mundialmente. O maior problema em tomar três doses (uma dose a mais do que o sugerido nos programas de imunização) é que isso tira a oportunidade de outra pessoa vacinar-se antes, dada a escassez de doses disponíveis no mundo.

“A covid-19 pode ser transmitida ou sobreviver na sauna com temperatura acima de 70 graus celsius?” (Marcus da Silva Santos, 44 anos, comerciante, Resende-RJ)
Douglas Adamoski, cientista UFPR – Olá, Marcus. Exposições prolongadas a temperaturas acima de 65 graus inativam o vírus SARS-CoV-2. Entretanto, o ambiente de saunas pode não ficar em temperaturas tão elevadas, por mais que o vapor domine o local, e outras áreas (banheiros, piscinas, duchas) são também pontos de possível contaminação. Na China, ainda em 2020, foi observado um evento em que várias pessoas se contaminaram em uma sauna úmida na cidade de Wuhan, o epicentro da doença.

“Sou nutricionista e estou atendendo no consultório uma paciente de 65 anos com gastrite. Orientei o uso de enzimas e após 30 dias ela retornou dizendo ter melhorado muito da ardência, azia e refluxo. Porém, se usar álcool em gel nas mãos, tem crise tão forte de estômago que até perde o apetite e permanece por cerca de três dias. Ela disse ter feito um teste por uma semana, usando somente água com sabão, e estava ótima. Mas, como ela é ministra da eucaristia na igreja, é necessário passar álcool gel 70% e ela teve nova crise. Observo que a paciente é intolerante à lactose em grau severo, mas não usa alimentos que contenham leite ou derivados de lactose e sofre com odores fortes tanto de perfume como de produtos de limpeza. Também observo que a paciente perdeu dez quilos desde o início da pandemia por ter passado mal tantas vezes (tinha medo de sair para ir ao médico pela pandemia). Somente há dois meses ela procurou gastrologista e agora nutricionista para ajudá-la na escolha de alimentos, pois quer voltar a pesar o mesmo que antes. Ela morre de medo de comer frutas diferentes, não come carne mais, só legumes, arroz e feijão e sopa. O que vocês indicariam para essa paciente usar no lugar do álcool em gel 70%? Existe algum produto que tenha esta ação virótica para raras vezes que ela necessitar?” (Maria José Pupin Jafelice, nutricionista)
Roseli Wassem, cientista UFPR – Prezada Maria José, agradecemos por sua confiança em nos consultar. Seu relato é intrigante, pois o uso de álcool gel na pele não deve afetar o estômago, por não ser absorvido. Por outro lado, a forte sensibilidade a cheiros poderia justificar os sintomas, mas o efeito prolongado também é inesperado. Sua paciente deve ter utilizado álcool antes e já teria detectado esse efeito anteriormente. Como deve ser de seu conhecimento, a pandemia tem causado alterações de humor em grande proporção e essas poderiam ser investigadas como potencial agente desencadeador de ansiedade e consequentes alterações de perda de apetite e dores de estômago. Outra hipótese é que as situações onde ela utiliza álcool nas mãos também são situações de maior estresse, pela exposição.
Não há relatos na literatura de alergias causados por álcool gel que causem sintomas como os dela; apenas de alterações na pele. Uma possibilidade seria utilizar etanol 70% líquido, que pode ser obtido em farmácias de manipulação e outras.
Caso ela queira testar outros agentes antissépticos, são recomendado o uso de água oxigenada 10 volumes ou clorexidina a 2%, que devem permanecer na pele por pelo menos um minuto. Entretanto, reações indesejadas a esses produtos são mais prováveis de ocorrer que com uso de etanol, e, portanto, recomendamos que sejam feitos testes de tolerância prévios a seu uso. Especial atenção deve ser dada ao uso de clorexidina, por seu grande número de efeitos indesejados.

“É verdade que a Coronavac pode causar trombose?”
Roseli Wassem, cientista UFPR – Não há nenhum relato de trombose em indivíduos que receberam a Coronavac. Relatos de trombose, potencialmente induzida por vacinas contra covid-19, foram feitos quando se utilizaram vacinas baseadas em adenovírus, como é o caso da vacina da AstraZeneca e Johnson&Johnson. Apesar de fortes evidências de que as vacinas tenham desencadeado a trombose, os casos são raríssimos e soluções estão em andamento.

“Existe algum exame que possa comprovar o grau de imunização contra o coronavírus em percentual?” (Sandra Selene Sckoteski, 52 anos, administradora, Curitiba-PR)
Roseli Wassem, cientista UFPR – Olá, Sandra, obrigada pela consulta. Especificamente, em percentual de imunização, não há ainda. Entretanto, é possível avaliar se o sistema imune desenvolveu resposta ao novo coronavírus (SARS-Cov2). São dois os testes possíveis: detecção de anticorpos ou presença de anticorpos neutralizantes. O segundo é o melhor, mas é de alto custo, difícil realização e não deverá ser utilizado em larga escala.
A avaliação do grau de imunização (em percentual) depende ainda de dados de amostras maiores, nas quais foram dosados os anticorpos neutralizantes e por isso, vai demorar um pouco ainda.
De qualquer forma, sabe-se que a resposta ao SARS-Cov2 depende também de diversas células do sistema imune, que não podem ser facilmente detectadas. Portanto, mesmo realizando dosagem de anticorpos contra o SARS-CoV2 ou mesmo de anticorpos neutralizantes, não é possível dizer com certeza se você está ou não efetivamente imunizada.

“Qual a probabilidade de uma nova pandemia aparecer em menos de 50 anos?” (Alexander Dutra Frose, 19 anos, estudante, Santo Antônio da Platina-PR)
Roseli Wassem, cientista UFPR- Olá, Alexander. Especialistas têm dito que novas pandemias podem surgir em breve, quase certamente dentro dos próximos 50 anos. Eles destacam dois vírus que podem ser as causas mais prováveis: outro coronavírus ou nova estirpe de gripe de origem animal, provavelmente aviária, mas diversos outros poderão causar pandemias. As gripes ditas aviárias têm sido constantemente monitoradas e sempre que pequenos surtos surgem, têm sido controlados. A pandemia da H1N1, de origem suína, causou em 2009 milhares de mortes no mundo todo. Felizmente, o desenvolvimento de vacina evitou um número de mortes maior ainda. Os coronavírus têm sido considerados com maior potencial de causar pandemias devastadoras. A Covid-19 tem se mostrado a pior pandemia dos últimos 100 anos. Entretanto, falhas no monitoramento de passagem de vírus de animais para humanos podem permitir sua disseminação. Todos os potenciais causadores de pandemias são vírus de origem animal, como o atual coronavírus.

“Toda a minha família está vacinada, menos eu, estou segura se eles saírem e eu ficar em casa?” (Amanda Souza, 20 anos, estudante, Toledo-PR)
Roseli Wassem, cientista UFPR – Olá, Amanda. Agradecemos por sua pergunta e por sua preocupação. Infelizmente, ninguém está seguro. O fato de você ainda não ter sido vacinada faz com que você esteja menos segura do que os outros membros da sua família. Apesar de menos frequente, as pessoas vacinadas contraem o vírus e o transmitem, mas devem ter sintomas mais brandos ou nenhum sintoma. A falta de sintomas dos vacinados e maior confiança em se expor, infelizmente, acaba expondo pessoas não vacinadas. Estamos num momento muito crítico ainda no Brasil, pois não atingimos nem 20% de vacinados, o que faz com que os vacinados interajam muito com não vacinados, contaminados. Ou seja, o vírus ainda circula e se multiplica livremente. Dessa forma, a vacina tem como principal efeito, nesse momento, apenas proteger os vacinados de sintomas mais graves. Você e seus familiares devem manter todos os cuidados recomendados, independente de já terem sido vacinados. Vacinar é um ato de proteção individual e também coletivo, pois diminuirá a circulação do vírus. Enquanto poucos estiverem vacinados a chance de contrair ainda é muito grande. Conforme esse índice aumenta, a contaminação deve ir diminuindo. Enquanto não chegamos a pelo menos 75% da população completamente imunizada, não podemos de forma nenhuma suspender o uso de máscara, devemos manter distância de pelo menos 1,5 metro, evitar aglomerações, buscar ambientes abertos e fazer higiene das mãos constantemente.

“O que é mucormicose e qual a sua relação com a Covid?” (Vanessa Lima, 37 anos, professora, Curitiba-PR)
Vânia Vicente, cientista UFPR – A Mucormicose é uma doença causada por fungos de natureza oportunista, também conhecida como micose oportunista. Por definição, essas micoses são infecções cosmopolitas (de ampla distribuição geográfica) causadas por fungos de baixa virulência, que convivem pacificamente com o hospedeiro, mas, ao encontrarem condições favoráveis, como distúrbios do sistema imune, desenvolvem seu poder patogênico, invadindo os tecidos.
Os agentes da mucormicose são fungos de distribuição universal, vivem na natureza, no solo, em vegetais etc. A infecção ocorre geralmente em pacientes com algum fator de imunocomprometimento e atinge indivíduos de todas as raças, sem predileção por sexo ou faixa etária. A mucormicose rinocerebral que é a forma clínica mais comum da doença, se inicia com a inalação dos esporos, colonização dos seios nasais, com comprometimento rápido dos tecidos afetados e produção de secreção nasal com presença de pus e/ou sangue. Com a evolução rápida da doença ocorrem, entre outros sintomas, a perda da visão, paralisia facial, confusão mental e coma. Além dos fatores de virulência, reconhecidos entre os agentes de mucormicose, devem ser reconhecidos fatores de risco inerentes ao hospedeiro como diabetes mellitus, malignidade hematológica, transplantes de órgãos sólidos, transplantes de medula, insuficiência renal crônica. No contexto atual, existem alguns casos relatados em pacientes no curso da evolução clínica da Covid-19.

Por Isabela Stanga / Sob supervisão de Chirlei Kohls
Parceria Superintendência de Comunicação e Marketing (Sucom) e Agência Escola de Comunicação Pública da UFPR