Quinta-feira, 07 de Novembro de 2024

Corina Portugal: de vítima de feminicídio a possível santa; Saiba como está o processo de beatificação

2020-03-22 às 14:17

Em 1889, muito antes de se falar em feminicídio, um terrível crime chocou Ponta Grossa. Corina Portugal, tida como adúltera, foi assassinada pelo seu marido, Alfredo Marques de Campos, com 32 facadas. “Ela é um ícone nesta questão de feminicídio, pois foi barbaramente assassinada sem o menor motivo”, conta Josué Corrêa Fernandes, juiz de Direito e autor de livros sobre a vida de Corina Portugal.

Naturais da cidade do Rio de Janeiro, o casal mudou-se para Ponta Grossa em 1885 em busca de melhores condições financeiras. Alfredo abriu então a Farmácia Campos, que logo ganhou fama na região. No entanto, a vida boêmia do homem acabou levando o casal à falência. “Ele era um camarada dado a jogo de cartas, vivia na zona do meretrício de Ponta Grossa, bebia bastante, batia na mulher”, explica Fernandes.

De acordo com o autor, o crime aconteceu pelo fato de Alfredo ter perdido a farmácia nas cartas. “Ele chegou embriagado em casa, tinha perdido tudo o que eles tinham no jogo e começou a discutir com a Corina. Ela estava deitada na cama lendo um livro de Machado de Assis. O marido então tirou um punhal do bolso e deu 32 facadas nela”, conta.

Apesar do crime bárbaro, Alfredo foi tido como herói na época, já que alegava que era traído pela esposa. “Depois que ele matou a Corina, o advogado dele, que era o Vicente Machado, inventou uma tese de que ela seria amante do médico João Dória, que era amigo da família”, explica o autor. O marido foi a juri, mas foi inocentado alegando que cometeu o crime para lavar sua honra. Nem mesmo as cartas enviadas por Corina ao pai, onde ela contava das agressões sofridas, fizeram com que Alfredo fosse condenado.

No entanto, Corina acabou ganhando ares de santidade entre as mulheres. Muitas esposas que também sofriam agressões por parte dos maridos passaram a rezar em seu túmulo, no cemitério São José, pedindo proteção. “Muitas mulheres alegam que Corina realizou milagres na vida delas. O túmulo dela, se você for ver, está cheio de plaquinhas e bilhetes com pedidos e agradecimentos”, conta Dione Navarro, pesquisadora e escritora do livro Súplicas e Respostas, com relatos de devotos de Corina.

As graças realizadas por Corina Portugal ganharam o mundo e chegaram até o Papa Francisco. “Uma devota aqui de Ponta Grossa foi fazer ma viagem para a Europa e levou um livro para o papa”, lembra a autora. Ela conta que na metade do ano passado recebeu uma carta do papa a respeito do livro e que logo após foi chamada para uma reunião com o bispo Dom Sérgio Braschi. “Nesse encontro ele [bispo] se propôs a começar o processo de beatificação da Corina”, complementa.

De acordo com a autora, o primeiro passo no processo de beatificação é tornar Corina Portugal serva de Deus. “Pelos relatos ela rezava bastante, ajudava as pessoas. Agora nós fizemos um santinho dela com uma oração”, conta Navarro. O próximo passo seria a comprovação de um milagre feito por Corina. A Diocese de Ponta Grossa afirmou haver a intenção de beatificar Corinina Portugal, no entanto o processo ainda não teria começado.