Sábado, 27 de Julho de 2024

“Estamos tomando o mesmo caminho da cloroquina”, afirma farmacêutico sobre o uso de ivermectina no tratamento da Covid-19

2020-07-09 às 18:09

Na manhã de quarta-feira (08), o prefeito de Ponta Grossa, Marcelo Rangel, afirmou que a cidade vai adotar um protocolo de prevenção ao coronavírus com ivermectina. Hoje (09) Rangel afirmou que o medicamento, que é normalmente utilizado contra infecções parasitárias, será ministrado somente àqueles que possuem comorbidades.

Para o farmacêutico e professor da UEPG (Universidade Estadual de Ponta Grossa), Bruno Minozzo, a atitude é precipitada. “Alguns estudos mostram o potencial desse medicamento em reduzir a replicação do vírus. Mas é importante destacar que esses estudos ainda são muito preliminares”, aponta. Ele lembra que os experimentos foram feitos in vitro, ou seja, com células isoladas, e que o comportamento no corpo humano in vivo pode ser bem diferente. “Mas de forma nenhuma você pode pegar esse resultado de estudo in vitro e transformar isso em protocolo de uso humano”, complementa.

Bruno também lembra que, nos estudos realizados com o medicamento, a dose utilizada foi muito alta. “Se fossemos transpor isso para utilização em seres humanos seria uma quantidade absurda, e, muito provavelmente, nós atingiríamos níveis tóxicos”, alerta. Dentre as diversas reações causadas pela alta dosagem de ivermectina estão ataxia (incoordenação de movimentos), diminuição da atividade respiratória, hipotensão e convulsão.

Bruno Minozzo, farmacêutico e professor da UEPG

Atualmente existem cerca de 30 estudos clínicos realizados com a ivermectina no tratamento da Covid-19. “Dois desses estudos são brasileiros, mas ainda estão em fase de execução. Outros dois já foram concluídos, mas os resultados ainda não foram publicados, estão na fase de análise de qualidade” conta o farmacêutico. Bruno conta ainda que a Organização Panamericana de Saúde desestimula o uso deste medicamento no tratamento de infectados com coronavírus. “A ivermectina está sendo usada incorretamente no tratamento de Covid-19, sem qualquer evidência científica de sua eficácia e segurança no tratamento dessa doença”, afirma a Organização em documento publicado no final de junho.

O professor afirma que entende a preocupação da população com relação à doença, mas lembra que erros anteriores não podem ser repetidos. “Estamos tomando o mesmo caminho que teve com a cloroquina. A gente já teve uma experiência, não podemos cometer os mesmos erros que cometemos num passado muito próximo”, desabafa. Ele ainda afirma que o mais importante nesse momento é continuar com as orientações de higiene e distanciamento social. “A minha preocupação é que use a ivermectina e ache que está protegida e relaxem nos cuidados”, complementa.

Embora existam relatos circulando na internet de pessoas que usaram o medicamento e tiveram um resultado positivo, Bruno aponta que não é possível afirmar que a melhora foi por causa da ivermectina. “Não tem como eu dizer que é ela que funciona, sendo que tem várias outras coisas sendo feitas ao mesmo tempo. Não tem como separar as coisas, a única forma é através de um estudo clínico, e estamos aguardando ainda por estas respostas”, finaliza.

Ivermectina

A ivermectina é um medicamento utilizado há cerca de 40 anos para tratar algumas infecções em humanos e animais. Ela faz parte do grupo de medicamentos antiparasitários, com ação em vários vermes e parasitas, sendo comumente utilizada contra sarna, lombrigas e piolhos.