A pandemia não afetou apenas a saúde mental das pessoas. O estresse e a ansiedade causados pelo isolamento social também foram responsáveis pelo surgimento ou agravamento de doenças da pele. Embora ainda não existam dados reais sobre o assunto, o que se viu nos consultórios de dermatologia nos últimos meses foi um aumento no número de casos de vitiligo, psoríase, urticária nervosa e dermatite atópica —todas consideradas doenças psicodermatológicas, ou seja, que têm relação com a saúde da mente.
Um dos motivos, segundo a dermatologista Márcia Senra, coordenadora do Departamento de Psicodermatologia da SBD (Sociedade Brasileira de Dermatologia), é que pele e sistema nervoso estão diretamente ligados. “Podemos claramente observar essa ligação da pele com a parte de emoções, do sistema psíquico do cérebro, onde estão localizadas as emoções. Pele e sistema nervoso vêm do mesmo folheto embrionário, que é o ectoderma, e depois se dividem”, diz.
As emoções também estão na pele quando alguém fica ruborizado, arrepiado ou suado de nervoso. Mas essa ligação pode ir além. Isso porque algumas situações, como a pandemia, podem mexer com o estado natural do sistema nervoso. Ele se divide entre simpático e parassimpático —o primeiro nos prepara para uma ação (de luta ou fuga, por exemplo) e o segundo nos faz relaxar e descansar. O problema é que, em tempos anormais como estes, até o sistema parassimpático vive em alerta.
“Esse estado de hiperatenção faz com que nossas emoções fiquem desequilibradas. Quando o paciente está depressivo, está paralisado no sistema nervoso parassimpático, que é o de relaxar. Quando tem raiva, tem emoções negativas muito intensas, e ele mesmo nota reações mais importantes demonstradas na pele”, conta Senra.
Emoções negativas são as principais causadoras de dermatites, como explica Cristina Abdalla, dermatologista do Hospital Sírio-Libanês. E o estresse, muitas vezes, é apontado como o problema número um. Segundo ela, em média, surgem dois novos casos de dermatite desencadeada por estresse por semana:
“Nós estamos vivendo uma vida diferente por conta da pandemia, e o estresse é um fator contribuinte para uma série de doenças. No microuniverso do meu consultório, por exemplo, aumentaram os casos de queda de cabelo, herpes e acne provocados por estresse.
Para Tatiana Villas Boas Gabbi, dermatologista do Hospital das Clínicas da FMUSP (Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo), emoções são mesmo sinalizadores de que algo está acontecendo, mas muitas doenças de pele têm causas multifatoriais. E isso também precisa ser levado em consideração. “Essas doenças têm uma causa multifatorial, e não uma explicação única para o desenvolvimento delas. Apesar de entender a influência da emoção, ela não é uma causa. Algumas doenças são idiopáticas, não têm uma causa definida e sofrem influência de uma série de circunstâncias do nosso meio”, avalia.
Independentemente do que possa desencadear coceiras ou manchas vermelhas na pele, a orientação é sempre procurar um médico tão logo os primeiros sintomas apareçam. “Sempre que a pessoa notar que está tendo alguma alteração esquisita na pele, é importante procurar um dermatologista. Existem muitas doenças de pele que parecem umas com as outras, mas que são de diagnósticos totalmente diferentes”, ressalta ela.
Uma vez identificado, o estresse precisa ser tratado, independentemente do nível de pressão que a pessoa se encontra e da forma que ele está se apresentando no organismo dela. “Essa exigência que temos com nós mesmos e com outras pessoas, a rapidez das informações, os prazos, tudo é extremamente estressante e o indivíduo não está preparado psicologicamente e mentalmente para o tanto de informações que está sendo submetido o tempo inteiro. É uma questão de tempo acabar evoluindo para o burnout, depressão ou crise de ansiedade. Estresse piora a qualidade do sono, desregula o ciclo circadiano (que regula noite e dia em nosso organismo), desequilibra a microbiota intestinal e começa a levar ao surgimento de doenças autoimunes. Está tudo muito relacionado”, diz Gabbi.
Doenças de pele como vitiligo, alopecia e psoríase têm uma causa psíquica, segundo a doutora em psicologia social pela PUC-SP (Pontifícia Universidade Católica de São Paulo) Ingrid Figueiredo. “Ao invés de se manifestarem como uma psicopatologia, vão se manifestar no corpo, muitas vezes na pele”. A especialista afirma que, dependendo do caso, é possível fazer um tratamento articulado e psicólogos e dermatologistas, juntos, podem indicar o melhor diagnóstico ao paciente.
Além das psicoterapias, para evitar que emoções acabem afetando diretamente a saúde da pele, também vale praticar meditação. “Dá trabalho? Dá, porque exige persistência, compromisso e, às vezes, é mais fácil tomar um comprimido do que entrar em contato consigo mesmo e aprender a se autorregular”, diz Senra.
Outra maneira eficiente para ter maior controle sobre suas emoções é investir em práticas de mindfulness e respiração consciente, como destaca Gabbi. “Minha dica para melhorar a ansiedade e não só não desenvolver uma doença alérgica na pele, mas melhorar a saúde como um todo e viver com mais qualidade de vida, é prestar atenção no momento presente, praticar o mindfulness. Técnicas de respiração consciente são extremamente relaxantes. Journaling, que é o ato de escrever, botar para fora tudo que está na sua mente para não guardar as coisas para você também é uma opção. Tudo isso é muito bom para manter a saúde e, principalmente, evitar o surgimento de doenças que têm origem emocional.”