Segunda-feira, 19 de Maio de 2025

Membros da CPI da Saúde comentam relatório final e possíveis desdobramentos

2022-11-23 às 14:48

A Câmara de Vereadores de Ponta Grossa rejeitou, na sessão ordinária desta quarta (23), à tarde, o pedido de abertura de Comissão Permanente Processante (CPP) contra a prefeita Elizabeth Schmidt (PSD). O documento, protocolado pelo vereador Geraldo Stocco (PV), advém do relatório final da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Saúde.

Na segunda (21), em coletiva de imprensa, os vereadores Celso Cieslak (PRTB), Geraldo Stocco (PV), Joce Canto (PSC), Léo Farmacêutico (PV) e Jairton da Farmácia (União Brasil), que compõem a CPI, apresentaram o relatório final do trabalho de investigação, aberto em 30 de maio deste ano.

Em entrevista ao programa Manhã Total, apresentado por João Barbiero, na Rádio Lagoa Dourada FM (105,9 para Ponta Grossa e região e 90,9 para Telêmaco Borba), nesta quarta (22), o relator da CPI, o vereador Geraldo Stocco (PV) e a vereadora Joce Canto (PSC), membro da CPI, comentaram os desdobramentos do processo legislativo.

A vereadora critica o fato de a prefeita Elizabeth Schmidt (PSD) ser aliada de um governador como Ratinho Junior (PSD), “que não trouxe investimentos para a Saúde no município e ainda queria taxar o agro”, opina.

A CPI realizou 19 reuniões, seis diligências externas, 17 requerimentos, 44 ofícios, 40 comparecimentos e 66 convocações, ao longo de seis meses de trabalho. “Essa CPI deveria ser permanente. Temos uma Comissão de Saúde, permanente na Câmara, que não vemos resultados”, reclama. A Comissão Permanente de Saúde é presidida pelo vereador Divonsir Pereira Antunes – Divo (PSD) e também composta pelos vereadores Dr. Zeca (União Brasil) e Celso Cieslak (PRTB) – que presidiu a CPI.

“Não tem uma efetividade, nem uma fiscalização na Comissão de Saúde. Por isso que a CPI da Saúde foi tão importante. Estamos lançando, a partir do próximo ano, o Bloco Parlamentar da Saúde, com vereadores que fizeram parte da CPI e que vão continuar, em paralelo à Comissão Permanente de Saúde, investigando a Saúde”, anuncia.

CPP

“Essa CPP não tem um intuito personalíssimo, um intuito pessoal contra a prefeita Elizabeth, de danificá-la [sua imagem], de prejudicar. Essa CPP dá a possibilidade de os outros vereadores também investigarem tudo o que a CPI investigou e ajudar na fiscalização e ajudar a pressionar a gestão para que as coisas mudem. No relatório final, foram elencados alguns crimes que, se nós não propusermos e não votarmos, pode nos acarretar culpa também. A vereadora Joce é favorável a essa Comissão e eu espero que a maioria dos parlamentares se posicione assim também. Não é o pedido de um parlamentar, mas de uma cidade inteira”, justifica o autor do pedido protocolado contra a chefe do Executivo.

O primeiro pedido, que foi rejeitado, foi baseado no relatório parcial solicitado pelo Ministério Público Federal (MPF), onde já se previam os crimes cometidos pela gestão municipal.

O novo pedido também foi rejeitado, nesta quarta (23), tendo recebido voto favorável apenas das vereadoras Joce Canto e Josi do Coletivo (PSOL). “Coloco minha mão no fogo que todos os vereadores da Câmara Municipal recebem mensagens diariamente falando sobre a Saúde do município. É um pedido, inicialmente, para se investigar os pontos da CPI da Saúde. Quem sabe da situação que o município está vivendo não é contra a investigação – ou não deveria ser”, afirmou a vereadora em entrevista pela manhã, horas antes da votação.

Relatório final da CPI

Além do apontamento de suposta prevaricação e omissão, da parte da Prefeitura, o relatório final da CPI da Saúde indica outros eventuais crimes que a administração municipal pode ter cometido na gestão da saúde. O relatório final será encaminhado pelos vereadores aos cuidados do Ministério Público do Paraná (MPPR) e Ministério Público Federal (MPF), para investigar a situação e, ocasionalmente, formalizar denúncia contra o município.

“Nosso papel, como vereadores, é o de fiscalizar e encaminhar todo relatório a alguns órgãos. Não temos o poder de polícia, de aplicar a lei. Mas encaminhamos tudo isso à Justiça para que ela tome as devidas providências e essas pessoas paguem, no devido processo legal, enfim, que respondam por tudo isso que aconteceu na Saúde”, frisa o relator.

Segundo Joce, devido a essas 170 mortes ocorridas nas UPA, o relatório final da CPI enquadra a prefeita Elizabeth na prática de homicídio culposo. “Agora, fica a critério do Ministério Público fazer o restante da investigação”, afirma a vereadora.

O relator Geraldo Stocco frisa que, desde a abertura da CPI, o ponta-grossense viu a situação da Saúde se agravar, com o fechamento do Hospital Municipal Amadeu Puppi (Pronto Socorro), Unidade de Saúde abandonada e a falta de contratação de médicos.

Stocco denuncia que houve prevaricação, por parte da Prefeitura, diante da “omissão em agir para melhorar a vida das pessoas”. Segundo ele, quando o Hospital da Criança deixou de ser porta para a atenção primária, acarretou perigo à vida das crianças. “Houve pagamento em duplicidade para uma empresa que fazia a gerência da UPA Santa Paula”, aponta. “Na verdade, foram três pagamentos em duplicidade: um de R$ 665 mil; outro de R$ 280 mil e, por último, um de quase R$ 200 mil”, emenda Joce.

Ainda segundo a vereadora, a Prefeitura conseguiu estornar esses dois últimos pagamentos depois que o secretário de Fazenda Cláudio Grokoviski assumiu o Financeiro da Fundação Municipal de Saúde. “Foi o Cláudio quem descobriu esse pagamento em duplicidade e conseguiu glosar esses pagamentos. Agora, os R$ 665 mil não voltaram para os cofres públicos”, diz. A Controladoria-Geral do Município fez uma auditoria que verificou esse pagamento a mais.

Mortes nas UPAs e fechamento do PS

O relatório final da investigação inclui as 170 mortes ocorridas nas Unidades de Pronto-Atendimento (UPAs) Sant’Ana e Santa Paula dentro de um período de seis meses. “Essas pessoas que acabaram falecendo nas UPAs, vale destacar, não foi diretamente culpa dos profissionais que ali trabalhavam, que estavam sobrecarregados com uma demanda enorme. As UPAs ficaram lotadas e acarretaram em mortes porque as Unidades de Saúde não tinham médico, então, a cidade inteira corria para a UPA no desejo de receber atendimento”, pontua o relator da CPI.

“A culpa disso é da gestão da Fundação Municipal de Saúde e da prefeita, porque não prepararam um hospital, um local para essas pessoas serem atendidas. O Governo do Estado tem responsabilidade nisso, porque as pessoas vão até as UPAs, que é um local para atendimento de urgência e emergência e, muitas vezes, essas pessoas precisam de leitos no Estado, que acaba não arrumando esses leitos na hora. Tivemos casos de pessoas que esperaram 20 dias, 28 dias”, comenta.

Ele aponta caso de uma mulher que, na ocasião do fechamento do Pronto Socorro, precisou aguardar mais de 20 dias na fila por uma transferência para poder fazer uma cirurgia depois de sofrer uma fratura no fêmur. “Quando chegou a data, o médico falou que não tinha mais o que fazer, que já tinha calcificado”, acrescenta.

Joce ressalta que as Unidades de Pronto Atendimento são locais de passagem e não de internamento. “Segundo o Conselho Federal de Medicina, o tempo máximo de permanência numa UPA é de 24 horas”, diz.

“Pessoas ficavam internadas nos corredores. Sabemos que a Saúde é difícil, é complicada, é um gargalo do município. Porém, a partir do momento que uma pessoa ganha uma eleição para ser gestora, precisa arcar com esses problemas e achar as soluções”, salienta o relator.

A membro da CPI observa que muitas das mortes ocorridas nas UPAs foram de pacientes do setor de ortopedia e que essas cirurgias eram, antes, feitas no Hospital Municipal, que acabou sendo fechado.

A CPI encerrou os trabalhos sem conseguir ouvir a prefeita Elizabeth, que pôde se omitir de prestar depoimento nas oitivas graças ao foro privilegiado, segundo Joce. Ela pode ser convidada, mas não é obrigada a comparecer. Elizabeth foi convidada duas vezes. na primeira delas, encaminhou uma justificativa em que alegava estar de férias. No segundo convite, sequer justificou a ausência.

Também foram convidados o vice-prefeito Saulo Vinícius Hladyszwski e o secretário de Estado da Saúde, Beto Preto, a fim de explicar a questão das vacinas, pois, enquanto outros municípios estavam reduzindo a faixa etária para imunização contra a covid-19, em Ponta Grossa, a vacinação tinha se estagnado. “Logo em seguida, descobrimos as vacinas vencidas”, relembra.

Stocco considera que a responsabilidade pelo fechamento do Pronto Socorro não se restringe à prefeita, mas se estende também ao ex-prefeito Marcelo Rangel (PSD). “Não houve investimento no Pronto Socorro nos últimos anos. A última gestão, nos oito anos de mandato do ex-prefeito, não foi investido ali. Por conta disso, o telhado sofreu, o centro cirúrgico sofreu. A pequena reforma que teve na Ala Amarela não foi com recurso municipal, mas do Ministério Público Federal (MPF) e de uma associação que auxiliava o Pronto Socorro. O ex-prefeito também tem culpa na questão do fechamento do PS”, diz.

Joce aponta que a Prefeitura justifica o fechamento do Hospital Municipal sob a alegação de que a alta e média complexidade não são de competência do município e que quem deveria fornecer esse tipo de atendimento médico é o Estado.

Rangel foi convidado cinco vezes a depor na CPI e se ausentou de todas as oitivas. Segundo Joce, desde que o ex-prefeito fundou a FMS, não houve recolhimento da cota patronal do INSS dos servidores, o que gerou uma dívida que já equivale a R$ 70 milhões, conforme apurou a CPI. Durante o andamento da CPI, o secretário de Fazenda teria conseguido financiar essa dívida em 240 parcelas. “Vai comprometer os próximos cinco prefeitos com essa dívida. Eles alegavam que existiam outros municípios que não estavam pagando a cota patronal e que haviam entrado na Justiça para não fazer esse pagamento. Porém, o município perdeu em primeira e segunda instâncias. Quando perdeu em primeira instância, a prefeita Elizabeth começou a fazer o pagamento mensal da cota patronal, admitindo, aí, a culpa. São R$ 70 milhões que não podem sair do bolso do contribuinte, porque tem juros e multas”, aponta.

Pronto Atendimento Infantil

“Quiseram economizar recurso onde não pode economizar recurso. Descobrimos que o planejamento disso já vinha de muito tempo, mesmo eles sabendo que o Hospital da Criança fecharia a porta primária, eles não prepararam outro lugar para atender a essas crianças, tanto é que, quando fechou, foi aquele ‘Deus nos acuda’: mandaram crianças para a UPA Santa Paula”, critica o relator da CPI, sobre o fechamento do Hospital Municipal e do Pronto Atendimento Infantil (PAI).

Cerca de seis a oito meses depois, entenderam que as coisas não estavam funcionando adequadamente ser os serviços do PAI e o município decidiu colocar essas crianças na UPA Santa Paula, junto de outros pacientes. “Transformaram aquela Unidade de Saúde em Olarias, que estava nova, numa tentativa de Centro da Criança. É uma falta de planejamento total e, com isso, infelizmente, as pessoas acabam sofrendo”, avalia Stocco.

Unidades de Saúde

A CPI verificou algumas Unidades Básicas de Saúde e constatou que nem todas elas possuem equipes médicas, o que gera o alto fluxo e a alta demanda de pacientes nas UPAs. Stocco cita entre essas unidades a do Recanto Verde, que dispunha médicos apenas na parte da manhã. Essa unidade fica próxima da Unidade Antônio Saliba, na Rua Siqueira Campos, em Uvaranas, que permaneceu fechada e abandonada por um ano e meio antes de a Prefeitura anunciar sua demolição para dar lugar a um “superposto”.

“Todas as pessoas que eram da Antônio Saliba migraram para a do Recanto Verde, gerando ainda mais demanda, mais pessoas ficando sem atendimento. Várias UBSs ainda não têm equipe médica e isso está no relatório final”, acrescenta o relator.

Segundo o vereador, uma das recomendações da CPI é que, no mínimo, quatro UBSs permaneçam abertas até as 22h para atender àqueles que não conseguem ir antes das 16h em função de seus expedientes de trabalho e, assim, desafogar as UPAs e prestar melhor atendimento aos pacientes.

“É claro que precisa de valorização dos profissionais e contratação, mas essa foi uma promessa da prefeita Elizabeth e, mais do que uma promessa, é algo que pode solucionar a Saúde do nosso município também”, avalia Stocco.

Uvaranas

De acordo com a vereadora Joce Canto, a construção de uma UPA em Uvaranas era uma promessa do ex-prefeito Marcelo Rangel e, como foi postergada, se tornou promessa de campanha da atual prefeita. Uvaranas possui essa demanda por ser a maior região do município. Porém, essa obra sequer foi licitada até agora, conforme Joce. O projeto foi protelado para 2023, da mesma forma que o Ambulatório Central, que estava previsto para março, mas cujas obras ainda não começaram.

Joce critica que, até agora, o único gasto feito na obra do novo Ambulatório Universitário, onde ficava o Hospital Municipal, foi a instalação de lonas anunciando a obra. Ela aponta, ainda, que cada placa instalada nas obras de reforma e ampliação de Unidades de Saúde ou dos “superpostos” custa cerca de R$ 2 mil e que elas são “inúteis” por não informarem prazo e valor da obra. “É previsto em lei que tenha todas essas informações, inclusive, com QR-Code para que o munícipe possa acessá-las. Já fiz uma denúncia ao Ministério Público em relação a essa publicidade em placas”, destaca.

Stocco salienta que o termo de cooperação entre a Prefeitura e a Universidade Estadual de Ponta Grossa (UEPG) para a instalação do Ambulatório Universitário ainda não foi encaminhado para apreciação do Legislativo Municipal. “A UEPG só vai transformar aquele hospital em ambulatório se a Prefeitura reformar. A prefeita tem até março para reformar. Caso contrário, o diretor do Hospital Regional já falou que a UEPG não pode assumir aquilo se a Prefeitura não reformar”, relembra.

Confira a entrevista dos membros da CPI na íntegra: