Padre Pedro Cláudio Mendes, ou, hoje, padre André, está em visita a Ponta Grossa, depois de três anos no Mosteiro Nossa Senhora do Novo Mundo, em Campo do Tenente. Ele que integrou muitos anos a Congregação Copiosa Redenção, é atualmente padre diocesano, mas vive uma experiência de discernimento no mosteiro trapista. A formação é longa. O padre está na metade do processo. Em dando tudo certo, ele solicita autorização e, se a Ordem aceitar, vai se tornar um monge de voto solene. Nesses dias na Diocese, padre André assessorou uma formação na Paróquia Santa Rita, sua antiga paróquia, e deveria celebrar missa de bodas de um casal amigo.
“A vida dá oportunidades e Deus se manifesta através das oportunidades da vida de modo muito concreto. Fui percebendo dentro de mim o desejo, fui lendo a realidade e percebendo que era uma possibilidade, um convite, e fui, de modo muito simples, respondendo”, argumenta ao justificar sua experiência no mosteiro. “Acima de tudo ainda acho que foi uma inspiração e uma resposta daquilo que eu percebi que Deus, através da realidade da minha vida, que ela ia me propondo”, acrescenta. Sobre o novo nome, padre André conta que se trata de uma tradição na trapa. “Na verdade, é dizer ‘quero que Deus tome conta de toda a minha história’. É um gesto simbólico para dizer ‘eu aceito essa proposta de Deus’. O nome de André é muito significativo porque André é irmão de Pedro. André aparece só no início do Evangelho e, talvez, a coisa mais importante que faz é apresentar o seu irmão, Pedro, a Jesus. Depois, ele desaparece. Em todo o Evangelho só diz ‘o irmão de Pedro’. Ele nunca mais é nomeado ‘André'”, detalha.
Significado
Ainda que seja um homem muito discreto no Evangelho, André fez algo de muito significativo, destaca o padre: levou Pedro a Jesus e isso mudou a vida de Pedro. “Acho que tem a ver porque eu sou Pedro, tive uma vida intensa de apostolado que me trouxe muitas alegrias, foi um grande dom na minha vida e, de repente, Deus me conduziu e me deu oportunidade de viver um pouco também o ideal do irmão de Pedro. O trapista é alguém que vive de modo muito simples, na presença de um Deus simples. André é um pouco disso. Um homem simples, mas que percebe que nessa simplicidade existe sentido”, relaciona.
Na Abadia vivem 20 monges. A rotina é simples, de muita oração, silêncio e trabalho. Acordam às 3 horas, às 3h30 fazem a primeira oração do dia. Se dedicam às leituras, missa e ao trabalho braçal. Às 20 horas, se recolhem para dormir. “Somos a presença de Deus que vigia, que espera o Senhor, na madrugada. O monge é esse espaço da igreja que recorda a Igreja que vigia, o Cristo que vem todos os dias e que voltará glorioso”, afirma.
Reclusão
Sobre a vida de recolhimento, padre André afirma que deixou de conviver fisicamente com os outros. “Mas, o monge não é uma pessoa que se isola ou deixa o mundo. Só tem sentido a nossa vida se nos sentirmos profundamente presentes, se levamos no coração, no pensamento e, acima de tudo, na oração a humanidade. Não me sinto voltando. Para nós não existe essa separação. Existe profunda unidade. Tudo o que é humano diz respeito a nós. As alegrias das pessoas são as nossas alegrias, e a tristeza delas são as nossas. Não me sinto à parte, sinto-me profundamente unido e, estar aqui, muda muito mais fisicamente, porque o coração o afeto e a fé nunca se separaram das pessoas. Estou muito feliz”.
O monge não vive separado. O fato de ir oito vezes à igreja rezar, a oração, o trabalho, é um modo de estar unido às pessoas. Sinto que estou sempre junto das pessoas que eu amo, não me separei delas. O amor tem essa capacidade de gerar comunhão. Padre André, durante sua fase de formação, só tem contato com os irmãos “e com Cristo”. O Mosteiro Nossa Senhora do Novo Mundo tem uma igreja com capacidade para 150 pessoas, que recebe gente de toda a região (Lapa, Mafra e Rio Negro) em suas missas (6h15, diariamente, e 10 horas, aos domingos). Os monges também atendem confissões. O espaço ainda tem uma hospedaria e uma loja que vende pães e bolos.
Curiosidade
Em seu início no mosteiro, padre André lembra que achou a rotina muito diferente. “Tudo era muito novo. Por exemplo: é próprio do trapista o silêncio, que é um valor importante. E eu sou alguém que falo e gosto de falar, de socializar. Quando cheguei, me deparei com o silêncio. Ás vezes, ficava o dia todo sem falar. Se conversa muito pouco, e isso era muito diferente. O mosteiro quer reproduzir o deserto, lugar onde se vai para fazer a experiência de Deus. Era novo e muito surpreendente isso. Um dia, temos um mural e estava entre os recados: ‘segunda-feira, dia de deserto’. Levei um susto. Fiquei impressionado. Estava no segundo mês do mosteiro, era postulante. Fui falar com o meu formador. Ele me contou que, uma vez por mês, uma segunda feira, há o dia em que chamam de ‘deserto’, que é quando não temos as orações durante o dia, e não temos trabalho. Ficamos somente na cela, rezando. Um dia mais recolhido ainda”, destaca.
Padre André cita que, até saber do que se tratava, ficou muito assustado. “A gente já não fala, já está no deserto e ainda vai ter um deserto dentro do deserto? Impossível, pensei. Domingo já não temos trabalho, já é dia de recolhimento. Para quem estava chegando, era bastante desafiador. Depois, me acostumei e, hoje, considero um dia abençoado. Por termos uma vida muito intensa, ‘dia de deserto’ faz muito sentido. Mas, senti assim depois de uma caminhada. Nos primeiros meses me deixava bastante intrigado”, recorda bem-humorado.
Vida
Padre André entrou com 19 anos na Copiosa Redenção, em 1997. Ficou muitos anos como irmão, trabalhou nas comunidades terapêuticas, foi ordenado padre por dom Sergio Arthur Braschi e continuou na Copiosa. Trabalhou na Paróquia Santa Rita, em Ponta Grossa, e na Paróquia Santa Ágata, na Itália. “Foi um tempo de muita graça, recebi muito da Copiosa, tenho muita gratidão e lembranças boas”, ressalta o padre. Depois, se desligou da congregação e passou a padre diocesano. Canonicamente ainda é padre da Diocese de Ponta Grossa. Pediu autorização ao bispo, que o permitiu fazer a experiência no mosteiro. Tem ainda três anos de discernimento.
“Prefiro pensar no hoje. A vida nos convida a viver o momento presente. Se eu for fiel ao presente é o que basta. Preciso confiar que Deus vai providenciar o meu futuro do melhor modo possível. Tudo concorre para o bem daqueles que amam a Deus, diz São Paulo na Carta aos Romanos. Estou bem no mosteiro, espero continuar, mas sei que, seja no mosteiro ou seja fora, o convite é sempre o mesmo: servir as pessoas, servir a Deus e buscar a glória de Deus, seja vivendo a simplicidade e reclusão do mosteiro, seja vivendo no meio do povo, com o cheiro das ovelhas, como diz o Papa Francisco. É sempre uma graça
Renovar o olhar
Reconhecido por suas belas pregações, padre André fez questão de reforçar que a Quaresma é um grande dom, um caminho. “Nesse período, a gente precisa se dedicar às escrituras. A liturgia é riquíssima. Começa com a Quarta-Feira de Cinzas, com o convite ao jejum, à oração. Depois, tem os domingos, onde as leituras são belíssimas. Eu destacaria, no terceiro domingo, nesse Ano ‘A’, o encontro de Jesus com a mulher samaritana. Jesus se mostra necessitado e pede água a uma mulher. Quando Deus nos pede algo é porque quer dar algo muito melhor. Aquela mulher pensou que Jesus estava querendo apenas água, mas, no fundo, Jesus estava querendo dar uma água muito melhor”, reflete o padre.
“Nunca esqueça. Deus é pai. O maior sonho de Jesus, o grande projeto de Sua vida, era revelar o Pai e um Pai bom. Quando ele nos pede, quando passamos por um sofrimento, existe sempre nesse mistério algo de escondido, mas o amor de Deus nos prepara algo de bom, que não significa sucesso ou vida fácil, mas uma vida cheia de sentido. Jesus deu àquela mulher, que já estava no seu sexto marido, deu um sentido e deu um grande presente, que eu desejo para todos: a graça de olhar para a sua vida de um modo completamente novo”.
da assessoria