Sábado, 12 de Outubro de 2024

Ponto de Vista: “Dengue não se combate de forma individual, mas de forma comunitária, solidária”, alerta secretário de Saúde, Beto Preto

2024-02-03 às 17:08

Em bate-papo exclusivo ao Ponto de Vista, programa apresentado por João Barbiero na Rede T de rádios do Paraná, na manhã deste sábado (3), o secretário de Estado da Saúde, Beto Preto, detalhou as estratégias adotadas pela SESA no enfrentamento à dengue e às arboviroses transmitidas também pelo mosquito Aedes aegypti, como a zica e a febre chikungunya.

As arboviroses – dengue, Chikungunya e zica – são doenças evitáveis porque, se não tem mosquito, não tem como transmitir doença. Quem perde a vida para a dengue é considerada uma morte evitável. Está na nossa mão a decisão de ficar doente ou não, na mão da comunidade, de um modo geral. Mas não estou culpando a população, de modo algum. Temos que pensar macro, que em algum lugar do Paraná tem gente saindo de casa para trabalhar antes de amanhecer e retorna depois que já anoiteceu. Esse cidadão, muitas vezes, está lutando para ganhar seu pão de cada dia e tem dificuldade até de limpar o quintal. Por isso que eu digo que a dengue não é uma doença que se combate de forma individual, mas de forma comunitária, solidária. Realmente acredito nisso: mobilização para conter a proliferação do mosquito, retirada mecânica dos focos do mosquito e, principalmente, o papel do governo federal, do governo do Estado e das Prefeituras nesse contexto. Temos agentes de combate a endemias em todos os municípios do Paraná”, comenta.

Beto Preto destaca que, em 2023, no período mais frio do ano, estavam sendo notificados novos casos de dengue, o que é incomum. No mesmo período, havia uma crise de chikungunya no Paraguai, que poderia chegar ao Paraná. Aliado a isso, o El Niño, que altera a frequência e ocorrência de chuvas, facilita a proliferação dos casos.

“Não deu outra. Chegou agora o verão e nós temos um quadro de casos superior ao dos últimos anos, praticamente igual, um pouco superior, ao número de casos registrado na epidemia de 2019/2020, que foi o soro tipo 2 da dengue aqui no Paraná. Mas esses números já estão sendo superados”, alerta. O secretário cita que alguns municípios estão enfrentando situações anômalas. Em Apucarana, cidade onde ele foi prefeito e secretário municipal de Saúde, há muito vento e altitude, o que não dava condições favoráveis ao desenvolvimento de focos de Aedes aegypti. Assim, enquanto muitos municípios ao redor registravam epidemias de dengue, Apucarana passava incólume.

Apucarana é hoje o maior quadro de epidemia de dengue. Nós tínhamos alertado o município há dois anos. Agora, em novembro, alertamos o município duas vezes, com nossa equipe do nível central da Secretaria de Estado da Saúde (SESA). Fizemos um trabalho no sentido de orientá-los de que não dava para parar no final do ano. Infelizmente, foi dado recesso até às equipes de combate a endemias no final de ano, de 10 a 15 dias e isso foi alastrando. E quem sobre é a população. Temos lá, de uma semana para outra, mil casos registrados. E assim vai crescendo. Vamos bater em 4 mil casos confirmados“, diz.

Responsabilidade da União, do Estado e dos Municípios

Conforme o secretário, cada ente público assume um papel diferente no combate à dengue. Cabe à União fazer o que ele chama de “acompanhamento guarda-chuva”; adquire e distribui os venenos (fumacê e larvicidas); distribui recursos – “não são muitos recursos, mas distribui”. “mantém a relação com as sociedades médicas e científicas, com as melhores informações e mais atualizadas. Mantém relação direta com a Organização Panamericana de Saúde e a Organização Mundial de Saúde e dá o norte da política de saúde para o combate às arboviroses”, diz.

Já aos Estados cabem a fiscalização e indução dos trabalhos desenvolvidos em cada município e em cada Regional de Saúde. “Cabe aos Municípios a contratação. Parte desses recursos de contratação de mão de obra de agentes comunitários de endemias e supervisores vem do Ministério da Saúde, o restante as prefeituras acabam ‘cotizando’. Fui prefeito e tínhamos lá um batalhão de 70 pessoas na área de combate às endemias em Apucarana, fazendo um trabalho contínuo de visitação. Se você para de visitar, acaba facilitando a presença do foco, do criadouro do mosquito Aedes aegypti. O mosquito nasce sem o vírus. Mas se ele está transitando, está voando, a fêmea do Aedes aegypti, onde tem pessoas doentes, ele transmite de uma pessoa para outra. Essa função é do município. Tem que ir lá jogar o larvicida, preparar e orientar”, detalha.

“A população e o trabalhador que sai de casa e que volta depois do anoitecer está lutando pela vida. Se ele receber uma mobilização num final de semana, ele vai ser o primeiro a ajeitar o quintal da casa dele. Não é só isso: temos praças públicas, temos lotes vazios em diversos loteamentos e jardins, de todas as cidades. Esse assunto não pode ser deixado de lado. Não há uma incompetência [da administração municipal] de Apucarana, mas há uma inércia: a inércia de não fazer e a confiança de que não vai acontecer nada. Está acontecendo e as pessoas que estão doentes estão sofrendo. A dengue é uma doença que, quando ela revela sinais, sintomas, deixa o cidadão muitas vezes, e já ouvi isso na porta do Pronto Socorro, como médico, falavam assim: dr. Beto, não consigo sair do fundo da minha cama de tanta dor nos ossos e nas articulações. E é isso que o cidadão está sentindo”, diz.

Fumacê significa falha na etapa da prevenção

Para o secretário de Saúde, limitar o combate à dengue ao uso do fumacê não resolve nada. Segundo o secretário de Saúde, o Estado do Paraná, através do governador Ratinho Junior, se empenhou na renovação da frota dos veículos que espalham o fumacê pelas cidades e solicitou ao Ministério da Saúde que envie uma nova remessa do produto, porque o estoque está no fim.

“Mas o fumacê, no final das contas, é um atestado do trabalho não feito. Quando você vai chegar a usar o fumacê em determinado município é porque o trabalho [preventivo] não foi feito corretamente durante o ano e é isso que estamos vendo lá em Apucarana. Foram cinco ciclos e mais dois e ainda existe uma população enorme de mosquitos na cidade e essa população continua transmitindo, de uma pessoa para outra. Agora cabe fazer um trabalho focado em resolver isso. Essa semana, inclusive, a equipe central de arboviroses e de entomologia, do nível central de Curitiba e de outras Regionais, que têm profissionais muito capacitados, foram para Apucarana e, na semana que vem, vão a Paranaguá, porque queremos induzir, incentivar e mobilizar equipes municipais a fazer o trabalho de campo, olho no olho. Caso contrário, vamos continuar tendo dificuldades no controle da epidemia nesse momento”, diz.

Vacinação

As vacinas estão chegando ao Paraná, mas numa quantidade muito inferior ao necessário, de acordo com o secretário de Saúde e, por isso, o Estado pediu mais doses à União. A compra deve se estender ao longo de todo ano, em quantidades pequenas, até pelo fato de que o laboratório japonês Takeda, que produz a QDenga, é de médio porte.

O Brasil todo deve receber 6,3 milhões de doses da vacina em 2024. Porém, cada esquema vacinal compreende duas doses, o que significa que 3,15 milhões de pessoas serão imunizadas. “O Paraná, normalmente, receberia 5% dessas doses, mas por ser hoje o Estado que está em epidemia mais forte, junto com São Paulo e Minas, deve receber perto de 10% desses esquemas vacinais. Veja, 300 mil esquemas vacinais para o Paraná é muito pouco. Temos que insistir no combate ao mosquito e manter todas as nossas ações de campo. Não dá para deixar para depois. Escolheram Londrina e Foz do Iguaçu e as regiões do entorno de cada uma dessas cidades [como prioridade da vacina] porque se levou em conta os 10 últimos anos da epidemia”, explica.

Na epidemia de 2024, os maiores focos se concentram em Apucarana, Jacarezinho e Ivaiporã. Em Londrina, tem crescido mais intensamente o número de casos. “Quem escolheu para onde as vacinas iam foi o Ministério da Saúde e nós continuamos cobrando“, justifica.

Beto Preto dá dois importantes alertas. O primeiro é que deve ser feito o trabalho de campo – limpeza dos terrenos e dos locais que possam gerar criadouros do mosquito – independente de ter ou não a vacina. O segundo ponto é que as vacinas só estarão à disposição de todos quando chegar a vacina do Instituto Butantan, que deve estar no mercado somente a partir da metade de 2025.

Ainda com relação à vacina QDenga, do Laboratório Takeda, Beto Preto afirma que “se as vacinas chegarem, ok”. “No meio do ano, as crianças de 10 a 14 anos serão vacinadas e vão receber a segunda dose no mês de maio. Elas só vão ter conferida sua imunidade lá pelo mês de junho, quando já temos um quadro de frio, a temperatura já baixou e diminuiu a infestação e o ataque dos mosquitos. Na verdade, neste momento, a vacina não terá o peso que estão esperando“, afirma.

Orientações

Beto Preto insiste que o combate à dengue é um esforço coletivo, comunitário, em que além de cuidar do próprio quintal e manter tudo bem limpo, cada um deve se ajudar mutuamente observando como está o vizinho, o terreno baldio que há nas proximidades, os vizinhos todos verificando as vias públicas e praças. “Se encontra uma poça d’água que não baixa e está juntando água parada numa via pública, numa passagem, numa calçada, tem que avisar e cobrar do poder público. Se você encontrou um copinho de água solto, virado para cima, uma garrafa com o bocal virado para cima, juntando água, isso imediatamente tem que ser removido, descartado corretamente”, comenta.

O secretário sugere, ainda, que o alerta seja dado nas igrejas, durante as missas e cultos, pois os padres e pastores, como líderes comunitários, têm grande poder de mobilização. Ele também pede que o combate à dengue seja assunto nas empresas e nas associações de moradores, que cinco minutos de conversa com os funcionários a respeito já ajuda. “Tenho encontrado, em Apucarana e outros locais, empresas com oito funcionários e dois ou três fora, de atestado, porque estão com dengue. A dengue atinge, inclusive, o potencial econômico da cidade”, pontua.

O secretário orienta a não deixar água parada e limpar bem o local onde a água ficava acumulada e o mosquito depositou ovos. “Às vezes, o mosquito deposita ovos e aquele local está úmido e depois seca. Os ovos ficam viáveis por cerca de 400 dias. Em ambiente seco, ficam preservados e viáveis por até 400 dias. Quando volta a chover e aquele local enche novamente, esse ovo dá vazão à presença da larva e a larva, depois, se transforma no mosquito”, alerta.

“Contamos com prefeitos e secretários de Saúde, equipes de vigilância em saúde, os agentes de combate às endemias. Tenho falado aos prefeitos e prefeitas para que juntem as equipes nesse momento. Os agentes de combate às endemias são um número menor do que os agentes comunitários de saúde, que é um número cerca de cinco vezes maior. Juntem todos esses profissionais de Saúde para fazer as visitas domiciliares, mas não apenas para orientar. Tem que entrar no quintal, tem que olhar o que está acontecendo, tem que tentar identificar a água parada e tomar decisão. Não pode parar o recolhimento geral de objetos inservíveis: o sofá que está jogado no fundo do quintal, pneu velho… Isso tudo tem que ser descartado corretamente e, por isso, pedimos a colaboração efetiva da população e dos órgãos públicos”, conclui.

Confira a íntegra da entrevista:

Ponto de Vista

Apresentado por João Barbiero, o programa Ponto de Vista vai ao ar semanalmente, aos sábados, das 7h às 8h, pela Rede T de Rádios do Paraná.

A Rádio T pode ser ouvida em todo o território nacional através do site ou nas regiões abaixo através das respectivas frequências FM: T Curitiba 104,9MHz;  T Maringá 93,9MHz; T Ponta Grossa  99,9MHz; T Cascavel 93,1MHz; T Foz do Iguaçu 88,1MHz; T Guarapuava 100,9MHz; T Campo Mourão 98,5MHz; T Paranavaí 99,1MHz; T Telêmaco Borba 104,7MHz; T Irati 107,9MHz; T Jacarezinho 96,5MHz; T Imbituva 95,3MHz; T Ubiratã 88,9MHz; T Andirá 97,5MHz; T Santo Antônio do Sudoeste 91.5MHz; T Wenceslau Braz 95,7MHz; T Capanema 90,1MHz; T Faxinal 107,7MHz; T Cantagalo 88,9MHz; T Mamborê 107,5MHz; T Paranacity 88,3MHz; T Brasilândia do Sul 105,3MHz; T Ibaiti 91,1MHz; T Palotina 97,7MHz; T Dois Vizinhos 89,3MHz e também na T Londrina 97,7MHz.