Um diagnóstico do que ficou após as eleições para a Prefeitura de Ponta Grossa
As eleições de 2024 foram disruptivas em Ponta Grossa – não quando a comparamos com o histórico da cidade, mas sim quando a comparamos com outros municípios de médio e grande porte do Paraná e do Brasil. Ao contrário do que se viu pelo país, a Princesa dos Campos testemunhou quatro candidaturas competitivas e todas elas de “insiders”, ou seja, de políticos com carreira, e não de “outsiders” que, em maior ou menor medida, negam o sistema – o maior exemplo desse fenômeno em 2024 talvez seja Pablo Marçal, em São Paulo.
As quatro candidaturas foram capitaneadas por Aliel Machado (PV), Elizabeth Schmidt (União Brasil), Mabel Canto (PSDB) e Marcelo Rangel (PSD). O que há de comum entre todos (as) eles (as)? O fato de serem, cada um à sua maneira, frutos de grupos políticos já estabelecidos na cidade e não sujeitos externos à política – a vencedora, inclusive, não só é fruto de um grupo político estabelecido como conseguiu superar tal grupo e fundar o seu próprio.
Dito isso, a pergunta que move esse texto é: quem mais perdeu e quem mais ganhou? Como tudo na vida, começaremos pelos vencedores. De longe, quem mais faturou na campanha foi Elizabeth, Beth ou Betinha (como muito bem pregou o marketing da prefeita reeleita). Beth enfrentou os irmãos Oliveira, foi candidata contra tudo e contra todos, e chegou ao segundo turno com força, vencendo o pleito novamente de virada (como já havia feito em 2020) e ampliando os próprios votos em cerca de 14%.
E, como cereja do bolo, Betinha ainda fundou o próprio grupo político, elegendo seis vereadores e se tornando figura fundamental da política princesina – nada mal para quem flutuou entre o grupo de Wosgrau, Plauto e dos irmãos Oliveira, e para quem disputou a primeira eleição em 2002, ao lado de Carlos Tavarnaro. Betinha entrou na eleição como prefeita “questionada” e saiu como a grande vencedora.
Depois dela, quem também saiu forte do pleito foi Mabel Canto. Representando uma das poucas candidaturas competitivas do PSDB no país, Mabel repetiu o segundo turno de 2020 contra Beth. A deputada estadual mais votada da história da cidade escolheu como vice Sandra Queiroz, numa tentativa de se aproximar do agro e do empresariado. Apesar de ter ido ao segundo turno na frente, Mabel levou uma nova virada, assim como em 2020.
Pode parecer estranho colocar Mabel como “vencedora” do pleito, mas a deputada acumulou amplo capital político na cidade, fortaleceu-se e também fortaleceu a irmã, Joce Canto (PP), a vereadora mais votada da história da cidade, superada só por Geraldo Stocco. Com tal votação, Mabel pode sonhar em tentar uma vaga em Brasília em 2026 caso consiga se alocar em um partido de maiores condições, diante da falta de capilaridade do PSDB no Paraná.
Por fim, temos Aliel Machado e Marcelo Rangel. Por mais que Aliel tenha ficado em quarto no pleito, atrás de Rangel, acredito que ele saiu “maior” do que o ex-prefeito e explico o porquê. O deputado federal montou uma chapa de centro-esquerda (por mais que sua campanha ignorasse isso ao máximo) em uma cidade majoritariamente conservadora. Dito isso, Aliel conquistou pouco mais de 35 mil votos e manteve o capital político que o elegeu deputado em 2022. Além disso, ele sofre justamente por ser um ótimo deputado, motivo pelo qual parte do eleitorado não deseja perder sua representação política em Brasília.
Já Marcelo Rangel… de fato foi o maior derrotado. Ex-prefeito, segundo a se reeleger para o cargo na história da cidade e principal mentor da candidatura de Elizabeth e Capitão Saulo em 2020, Rangel não só foi derrotado pela sucessora como ficou de fora do segundo turno por uma quantidade considerável de votos. Tido como favorito e como o candidato do governador Ratinho Júnior (PSD), Rangel caiu já no primeiro turno e representou um dos raros insucessos do PSD de Gilberto Kassab na disputa por prefeituras pelo Brasil.
As explicações para a derrota de Rangel já no primeiro turno merecem um texto à parte, visto que, na minha visão, esse foi um acontecimento multifatorial. Mas aqui, de forma simplificada, cabe ressaltar a pecha de “mentiroso” que tanto Beth quanto os outros adversários impuseram ao ex-prefeito, além da incapacidade da campanha de Marcelo de defender os trunfos de suas duas gestões.
Dito isso, cabe também salientar a participação de Dr. Magno (Novo) na disputa pelo Palácio da Ronda. Por mais que não tivesse chances de vitória, Magno representou o Novo numa candidatura à Prefeitura pela primeira vez – como partido de nicho, a candidatura tinha como intuito dar visibilidade a Magno, além de ajudar o partido a eleger representantes para a Câmara Municipal, o que não chegou nem perto de acontecer. Além disso, quando se compara o desempenho de Magno à candidatura do PSOL (outro partido de nicho) em 2016, nota-se que o desempenho do médico nas urnas deixou a desejar.
Exposto isso, podemos entender que a eleição de 2024 em Ponta Grossa teve uma grande diferença quando comparada a outras cidades brasileiras: a já citada ausência de “outsiders” no melhor estilo Marçal. Dito isso, a corrida foi realmente disputada por quatro candidaturas que chegaram a convergir politicamente em algum momento da história recente da cidade, mas que este ano propuseram nomes distintos para o eleitor ponta-grossense.
Como principal saldo da disputa, fica a formação de quatro grupos políticos distintos, bem estabelecidos e, como disse, que já convergiram, mas que hoje parecem trilhar caminhos distintos. Um dos grupos tem Beth como líder; outro traz Mabel e a família Canto (Jocelito e a filha Joce); Aliel Machado segue liderando seu grupo de centro-esquerda; e, por fim, os irmãos Oliveira (Sandro e Marcelo) com seu grupo.
Para 2026, é provável que tais grupos apresentem candidaturas distintas ao cargo de deputado (a) estadual e deputado (a) federal, assim como apoiem projetos diferentes ao Palácio do Planalto. Mas, como já dizia o ex-deputado federal e ex-governador de Minas Gerais José de Magalhães Pinto, “a política é como nuvem. Você olha e está de jeito. Olha de novo e já mudou”. Talvez vente e as nuvens se embaralhem nos próximos anos na Princesa dos Campos.
Afonso Verner é doutor em Comunicação Política (UFPR) e coordenador de campanhas eleitorais
Conteúdo publicado originalmente na Revista D’Ponta #304