Domingo, 05 de Maio de 2024

D’P Pessoas: José Biuca

2023-06-11 às 11:56
Foto: Paola Antunes

Há 59 anos, o garçom José Biuca é o primeiro a chegar e o último a sair da churrascaria Expedicionário do Cogo, em Ponta Grossa.
Sempre alegre e bem-humorado, ele se tornou uma figura reconhecida e muito querida pelos clientes do local – algumas pessoas chegam a fazer questão que a sua mesa seja servida por ele. Os versinhos que Biuca costuma declamar de improviso entre um corte de carne e outro lhe renderam o apelido “Poeta” e o ajudaram a conquistar boas amizades em todos esses anos de trabalho.

A história dele quase se confunde com a do próprio Expedicionário, pois Biuca foi contratado poucos meses após o início das atividades da churrascaria. Hoje, aos 73 anos de idade, ele esbanja disposição e garante que nem pensa em parar de trabalhar. Na entrevista a seguir, Biuca fala sobre o dia a dia no trabalho, a amizade com os clientes e o carinho que sente pela profissão.

A sua rotina é servir as pessoas. O que atraiu o senhor para essa profissão?

Uma das minhas tias era proprietária de um restaurante e eu achava muito bonito vê-la trabalhando nessa área. Eu comecei a ajudá-la ainda muito jovem, mas eram outros tempos e naquela época os menores de idade podiam trabalhar. Eu ingressei aqui na churrascaria no dia 22 de dezembro de 1954 e dessa profissão eu vivo até hoje.

O senhor atende a todos com um sorriso no rosto. De onde vem tanta alegria e bom humor?

Eu sou assim mesmo. O cliente entra, eu o convido para sentar e de repente a gente já fez amizade. Eu me sinto honrado, porque muitos deles voltam só por minha causa. Esses dias, esteve aqui um general da primeira divisão do Exército, e a recepcionista estava arrumando a mesa, mas ele a interrompeu, apontou para mim e disse: “Quem vai arrumar a minha mesa é o Poeta. É ele quem vai me atender.”

Qual é o segredo para tanta disposição?

Alguns clientes perguntam a minha idade e se surpreendem quando eu digo que estou com 73 anos. “Mas com essa disposição toda?” Acho que eu trabalho rápido e com disposição porque eu gosto de fazer o que faço.

Em todos esses anos de profissão, qual foi o momento mais marcante?

Para nós, todo cliente é um prazer, o cliente é sempre o rei. Mas, durante todos esses anos, eu já atendi a mais de 80 pessoas da televisão. Já servi o falecido José Wilker, a Regina Duarte, o Lima Duarte, o Sérgio Reis, e recebi muitos elogios desse pessoal.

Qual é a história mais divertida que o senhor já viveu na churrascaria?

Ah, tem muita história boa. Teve um dia que a casa estava cheia e uma senhora se abaixou no meio do corredor. Eu estava andando rápido e não a vi, e acabei derrubando a cliente e ainda caí em cima dela. Como não aconteceu nada, foi o maior barato para a freguesia. Outra vez, dois casais de amigos meus estavam aqui e uma das senhoras me pediu um limão. Quando eu fui entregar, derrubei o limão e ele rolou bem embaixo do meu pé. Eu escorreguei e caí sentado no colo da cliente. Deu para rir muito, porque eu não me machuquei, nem machuquei ela.

O que a profissão de garçom te ensinou?

Tudo. Ser garçom me ensinou tudo, e tudo o que eu tenho, eu devo a essa profissão. Eu tenho uma boa família, a minha esposa é aposentada e a minha filha é funcionária pública. Nós temos casa própria, de dois andares, bem localizada. Eu fico até emocionado, pois muitos garçons que começaram comigo morreram pedindo esmola.

O senhor já teve vontade de seguir outra carreira?

Eu trabalhei como sapateiro e já fiz muita barra de calça. Eu fiz esse trabalho nas horas vagas por um bom tempo, enquanto a saúde aguentou. É um serviço que dói demais o ombro, então eu parei. Além disso, machuca a mão e derrama muito suor do corpo.

Pensa em aposentar a bandeja um dia?

Eu tentei parar de trabalhar, mas não deu certo. Eu gosto do contato com as pessoas, não aguento ficar parado, nem ficar sozinho. O serviço de casa – limpar vidro, arrancar mato, varrer a calçada, lavar o carro – não me preenche. Aqui eu trabalho conversando e dando risada. Enquanto Deus estiver me dando saúde, eu não pretendo parar.

Conteúdo publicado originalmente na Revista D’Ponta #295