Já destaquei neste espaço a importância de recorrer a esquemas, desenhos e ilustrações para facilitar a compreensão dos fatos. O julgamento que começa hoje – o primeiro de um ex-presidente no banco dos réus por crimes contra a democracia – é uma dessas situações que exige a exposição do óbvio, para não permitir margem para tergiversações ou versões fantasiosas.
Convém lembrar: Jair Bolsonaro já havia sido condenado e se encontra inelegível por oito anos, em razão do abuso de poder político e do uso indevido dos meios de comunicação durante a reunião com embaixadores estrangeiros realizada no Palácio da Alvorada, em 18 de julho de 2022, quando mais uma vez espalhou mentiras sobre o sistema eleitoral e a segurança das urnas eletrônicas.
Agora, a partir deste 2 de setembro de 2025, quase três anos após ser derrotado por Lula nas urnas, Bolsonaro passa a responder por cinco crimes ainda mais graves: organização criminosa armada, dano qualificado contra o patrimônio da União, deterioração de patrimônio tombado, tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de Direito e tentativa de golpe de Estado.
O roteiro identificado pela Polícia Federal e corroborado pela Procuradoria-Geral da República demonstra, sem margem de dúvida, a construção planejada e sistemática da trama golpista. Nele se inscrevem o chamado Plano Punhal Verde e Amarelo, que previa o assassinato de Lula, Alckmin e Alexandre de Moraes; as barreiras da Polícia Rodoviária Federal que tentaram impedir eleitores de Lula de votar no Nordeste; a minuta de golpe que previa a instalação de um poder ditatorial; as manifestações em rodovias e diante de quartéis; e, por fim, os atos terroristas de 8 de janeiro de 2023 contra a sede dos Três Poderes.
São provas materiais e irrefutáveis: mensagens trocadas, documentos impressos e digitais, depoimentos de participantes das reuniões golpistas. A robustez da evidência é tamanha que há até desavisadas admissões de culpa em declarações de acusados. A condenação, portanto, não é apenas provável – é inevitável.
Tudo é claro, tudo é objetivo. Mas a história nunca se escreve apenas com objetividades. Daí a necessidade da disputa de narrativas – feita com técnica, forma, conteúdo e constância -, para que a verdade histórica reflita a história verdade de que os acusados tentaram impor uma ditadura no Brasil. Cabe ao campo democrático reafirmar, sem hesitação, que houve sim uma tentativa de golpe contra a democracia brasileira, contrapondo-se à inevitável tentativa, por parte dos condenados, de uma vitimização.
Oliveiros Marques é sociólogo, publicitário e comunicador político
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