Não tropece na Língua
Ponta-grossense é feliz por natureza. Razão disso é a presença do hífen na composição do adjetivo. Isso mesmo, caro leitor. Ponta-grossense tem, e sempre teve, hífen, mesmo com tantas gafes cometidas por anúncios publicitários.
Mas, o bom mesmo é cravar que, diante do exposto, não estamos despercebidos. Ou seria desapercebidos? Qual a forma adequada, segundo a norma culta, presente nos manuais gramaticais de Rocha Lima e Celso Cunha?
De acordo com o saudoso jornalista Eduardo Martins, em seu “Com todas as Letras”, o termo despercebido significa aquilo que não foi notado. Vejamos um exemplo. A repressão passou despercebida.
Desapercebido, no entanto, é sinônimo de desprovido, desprevenido: Estou desapercebido de dinheiro.
Perceberam a diferença? Que falta nos faz a companhia de Machado de Assis em tempos de pós-modernidade! Ops! Aqui vai outra avença! Os termos pós e pré sempre virão acompanhados de hífen, senão vejamos: pré-vestibular, pós-graduação. Fácil, não é mesmo?
Poderíamos vasculhar uma vasta gama de curiosidades em Língua Portuguesa. Aqui vai mais uma: Pedir para e pedir que. A forma como falamos muda o sentido da frase? Sim! Ex. Pedir para é pedir permissão: pedirei para ir ao banheiro. Pedir que é dar ordem: pedirei que fiquem quietos etc!
Nova dúvida: perceberam que usei o termo etc sem uma vírgula que o antecedesse? Pois é! E isso está correto. A abreviatura etc deriva do latim et cetera, que significa “e as demais coisas”. Deste modo, acerta quem não usa a vírgula.
Torna-se impagável conhecer tantos detalhes, não é mesmo? Por isso, o verbo pagar também entra nesta crônica – com a devida vênia da exímia cronista Francielly da Rosa – como fugaz às regras na fala do dia a dia, que, aliás, não tem hífen.
Notemos: Quando devemos pagar algo, é sempre a alguém. Ponho de forma simplificada: Paguei a conta ao garçom. Notaram? O verbo em questão admite duas regências, uma direta, outra indireta.
Outro ponto importante: citei, no parágrafo anterior, o termo “ponho”, do verbo pôr. Isso está aplicado de forma correta, pois colocar é pôr ao lado. Sendo assim, o sentido encontra guarida na frase supracitada, com o verbo bem empregado conforme a norma culta.
Perguntaria, o prezado leitor, neste momento: – Onde o professor Edgar Talevi encontrou tantos adereços linguísticos para uma sexta-feira? Eu responderia gramaticalmente, citando que a pergunta feita está certíssima. Mas, por quê?
É simples. Onde designa lugares, apenas. Portanto: – Onde você mora? – frase correta. Agora, se disséssemos: – Li a carta onde ele pede um café com a pessoa amada – isso seria inadmissível aos olhos de um ávido leitor, pois o termo onde, no caso último, não equivaleria a lugar.
Neste momento, o leitor pode imaginar que, talvez, 50 por cento da população desconhece as regras apresentadas por este colunista. Esperemos um pouco: 50 por cento desconhece ou desconhecem: E, agora? Explico: As duas formas são defensáveis do ponto de vista gramatical, mas a grande maioria dos estudiosos defende a opção em que a concordância do verbo é realizada com a expressão que vem depois do numeral. Se fossem ditas as palavras: 50 por cento das pessoas desconhecem, o verbo, preferivelmente, ficaria no plural, como está.
Quanta imaginação há em nossa Língua Pátria! Salve o lusófono!
Mas, não posso encerrar o assunto sem agradecer sinceramente a todos e todas que leram até aqui. Aos Senhores e Senhoras, meu muito obrigado!
Ainda tem isso! Obrigado é adjetivo. Pela regra universal, os adjetivos concordam em gênero, número e grau com os substantivos a que se referem. O vocábulo obrigado, escrito por mim, está no singular e masculino. Mas, caso se tratasse de uma colunista, em vez de este que vos escreve? Aí o agradecimento ocorreria da seguinte forma: – Muito obrigada!
E, não para por aí – lembrando que o acento diferencial do verbo parar caiu com a nova reforma ortográfica – pois o termo obrigado admite plural.
Se fossem dois ou mais colunistas assinando este artigo, o correto seria dizer: – Muito obrigados! O mesmo vale para duas ou mais mulheres autoras: – Muito obrigadas!
Tudo isso não desvaloriza nossa deliciosa maneira cotidiana de falar, tal qual exuberantemente tratado por Marcos Bagno, em “O preconceito linguístico”, mas conhecer um pouco mais não custa caro, não é mesmo?
Faço valer os versos esplêndidos de um dos maiores haicaístas da Língua Portuguesa, a saber, Róbison Benedito Chagas:
pobre poeta
sem palavras nem rimas
apenas lamenta