O Paraná é um dos estados brasileiros que mais concentram empresas de fabricação de instrumentos musicais, peças e acessórios. A capital paranaense é a única cidade do país que oferece curso superior na área de luteria, que é a especialização para fabricação de instrumentos musicais. Isso explica a grande concentração de empresas do setor no Estado. De acordo com dados da Junta Comercial do Paraná (Jucepar), há 85 fabricantes de instrumentos, peças e acessórios – 21 delas em Curitiba.
Na reportagem da série Feito no Paraná desta semana vamos conhecer alguns luthiers instalados em Curitiba e que fabricam instrumentos de qualidade reconhecida nacional e internacionalmente.
FORMAÇÃO – O curso de tecnólogo em luteria da Universidade Federal do Paraná (UFPR) foi criado em 2009 e por um bom tempo se manteve como o único curso superior nesta área na América Latina. Atualmente, já existe uma formação semelhante na Argentina.
De acordo com o vice-coordenador do curso, Juarez Bergmann Filho, Curitiba tem uma vocação musical muito grande. “Faltava mão de obra mais especializada para fabricação e reparos de instrumentos. Criaram um projeto buscando informações com luthiers locais e surgiu a ideia do curso. São três anos de formação. Atendemos o ingresso de 30 alunos por ano”, afirma.
Bergmann conta que pessoas do Brasil inteiro vêm buscar na Universidade Federal qualificação em luteria. O perfil dos alunos é variado: desde aqueles que querem seguir carreira profissional na área até apaixonados por música, interessados em construir instrumentos por hobby.
Os alunos podem escolher uma entre três capacitações: instrumentos de corda elétricos (guitarras e baixos elétricos); instrumentos de corda (cordófonos) dedilhadas (violões e violas brasileiras) e instrumentos de corda a arco (da família do violino).
PIONEIRISMO – É curitibana a primeira luthier formada em instrumentos elétricos do Brasil. Rosanne Lemos é a fundadora da Mankato Guitarras, uma marca autoral que cria modelos únicos e confeccionados à moda antiga. “Gosto de dizer que somos uma marca de guitarras tropicais. Usamos apenas madeiras nacionais e todo nosso processo de confecção é igual àquele adotado na década de 1950, com um equipamento sendo produzido por vez”, conta.
Formada pelo curso de luteria da UFPR, Rosanne decidiu devolver à sociedade a oportunidade de formação que teve. Ela atuou como voluntária no projeto Girls Rock Camp, uma colônia de férias organizada por voluntárias visando o empoderamento de meninas de 7 a 17 anos através da música, desenvolvendo a autoestima e a liberdade de expressão. Rosanne viu a necessidade de fornecer às meninas equipamentos de qualidade.
“Eu fui voluntária neste projeto e fiquei encarregada de uma banda. E percebi que tinha muitas meninas de seis, sete anos, não conseguiam tocar porque o instrumento era grande, pesado. Pensei que era uma boa oportunidade de inserir a marca e fazer algo legal. Retornar às mulheres esta capacitação que eu adquiri”, conta.
Depois de recolher instrumentos velhos ou danificados, a Mankato criou seis instrumentos com design especial, reaproveitando peças. “Este foi o pontapé inicial da marca e, desde então, têm surgido encomendas”, explica Rosanne.
A empresa também produziu outros instrumentos para musicistas mulheres, que fizeram tanto sucesso que hoje há fila de espera. “Nossas primeiras encomendas vieram de fora do Brasil, então já começamos exportando. Fazemos cerca de seis guitarras por ano”, afirma Rosane. Os preços variam entre R$ 4 mil e R$ 9 mil. O valor, bem abaixo do praticado no Exterior, tem atraído as encomendas de fora do país.
PINHÕES E VIOLÕES – O engenheiro mecânico Marcello Rizzi viu na luteria uma oportunidade de guinada na carreira depois de ser dispensado da empresa onde trabalhou por três anos. “Depois que fui desligado, decidi passar uma temporada fora e fui para os Estados Unidos. Lá visitei um museu de instrumentos musicais e descobri uma escola de luteria. Como sempre fui ligado à música, resolvi aprender o ofício e já são sete anos de dedicação exclusiva à construção de equipamentos”, conta.
Especializado em violões de aço, ele leva de três a quatro meses para entregar uma encomenda. E seus instrumentos têm o paranismo literalmente incrustado na madeira. Pequenos pinhões delicadamente moldados enfeitam os violões que saem do ateliê, o que já virou marca registrada da Rizzi. Além disso, Marcello faz ajustes e reparos em equipamentos.
Para mostrar a qualidade musical dos instrumentos que produz, ele criou o projeto Ultrasonoros, um canal no Youtube que reúne músicos curitibanos que vão tocar utilizando os equipamentos que compraram da Rizzi ou que foram colocados à disposição pela marca. “Já gravamos 40 episódios. Isso se transformou num acervo da contemporaneidade da música curitibana e brasileira”, conta.
MÚSICA ERUDITA – O paulista João Burattiestá desde 2019 instalado em Curitiba. “Vim fazer algumas disciplinas isoladas no curso de luteria da UFPR. Já era luthier formado no Conservatório de Tatuí, em São Paulo, mas queria aprender mais. Vim estudar, fazer um estágio, mas as coisas evoluíram. Comecei a ter bastante demanda de trabalho e montei meu ateliê aqui”, conta. Diferente do curso da UFPR, o ofertado em Tatuí não é de nível superior.
Especializado em fabricação de violinos, Buratti dedica boa parte do seu tempo para manutenção e reparos de instrumentos. “Hoje é isso que toca o ateliê e paga as contas. E a construção dos equipamentos faço por amor”, afirma.
Ele conta que grande parte do seu público é formada por músicos das orquestras de igrejas evangélicas da cidade, além de outros músicos profissionais. A maior parte dos instrumentos que chega ao seu ateliê vem da China e precisam de restauro completo para uma boa sonoridade. “Meu maior prazer é fazer com que a pessoa se surpreenda com o instrumento que tem. Então eu faço todas as substituições e adaptações necessárias para que eles saiam daqui com um instrumento de boa qualidade”, conta.
VIOLINO – Paralelamente, João se dedica à fabricação de violinos. Ele produz no máximo dois por ano. Além do processo ser completamente manual – e igual àquele usado há 300 anos – toda a matéria-prima é importada. Desde a madeira até os vernizes, cola e cordas. Um instrumento feito por ele não sai por menos de R$ 15 mil, mas ainda é bem mais barato que qualquer instrumento feito de forma artesanal na Europa, por exemplo.
FEITO NO PARANÁ – Criado pelo Governo do Estado, e elaborado pela Secretaria estadual do Planejamento e Projetos Estruturantes, o projeto Feito no Paraná busca dar mais visibilidade para a produção estadual. O objetivo é estimular a valorização e a compra de mercadorias paranaenses, movimentar a economia e promover a geração de emprego e renda.
Empresas paranaenses interessadas em participar do programa podem se cadastrar AQUI.
da AEN