Em diversos sites de e-commerce é possível achar celulares de última geração a preços tentadores. Em um primeiro momento, a oferta hospedada em grandes marketplaces parece a oportunidade perfeita para a troca do aparelho. Mas as promoções na internet, cada vez mais frequentes (e suspeitas), entraram na mira da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) e de órgãos de defesa do consumidor.
Dados da indústria estimam que cerca de 4,5 milhões de celulares piratas serão vendidos pela internet em 2021, o que representa cerca de 10% de tudo que deve ser comercializado neste ano. O número é maior que os 3,8 milhões de aparelhos ilegais comercializados em 2020, segundo a consultoria IDC.
Os celulares, assim como outros produtos eletrônicos que necessitam de algum tipo de conexão à internet — de carregador, passando por roteadores, até cafeteiras com acionamento Wi-Fi —, precisam ser homologados pela Anatel. Os que não passam por esse processo são considerados ilegais ou piratas.
A homologação dá ao aparelho uma espécie de selo de qualidade. Isso porque os produtos são submetidos a avaliações de segurança elétrica, quando são verificados riscos de superaquecimento, explosão, choque e até limites de exposição a campos eletromagnéticos, explica a agência reguladora.
Para evitar que aparelhos ilegais cheguem ao consumidor, a Anatel vai lançar uma ferramenta para que os sites de comércio eletrônico façam uma consulta prévia ao código de homologação dos produtos antes que o anúncio seja veiculado na página. Se não estiverem cadastrados, não poderão ser ofertados.
Segundo Wilson Diniz Wellisch, superintendente de Fiscalização da agência, a expectativa é que esse sistema possa entrar em funcionamento ainda este ano, antes da Black Friday e do Natal.
“O vendedor, antes de exibir um produto na plataforma de e-commerce, terá que informar o código de homologação. A ferramenta vai confirmar se o número é válido. Se não for, o anúncio nem é veiculado no site. É uma medida preventiva. Estamos em discussões técnicas”, explica.
Na internet, a ilegalidade ganha slogans como “produto internacional”, de forma a confundir o consumidor. Para tentar dar um ar de legalidade, diz Wellisch, a descrição de algumas mercadorias traz observações como “item não homologado pela Anatel”, o que é proibido.
De acordo com fontes, marcas chinesas de celulares e sites americanos de comércio eletrônico são hoje os principais responsáveis por problemas envolvendo a venda de itens falsificados.
O maior cerco aos sites de e-commerce só foi possível após o parecer da Procuradoria Federal Especializada (órgão da Advocacia-Geral da União que presta aconselhamento jurídico à Anatel) em meados de agosto, que prevê a responsabilização administrativa de marketplaces que permitem a transação de item pirata entre vendedor e comprador, ainda que não tenham a posse do produto.
Na prática, o parecer vai permitir autuar as empresas que até então alegavam não ser responsáveis por produtos à venda em suas plataformas. A Anatel enviou 92 ofícios para 50 e-commerces comunicando o entendimento.
“Enviamos esses ofícios para que as empresas saibam desse parecer, que é um game changer (fator de virada no jogo). Antes disso, vínhamos fazendo um trabalho com os marketplaces para mostrar os riscos envolvidos na venda desses produtos. A comunicação agora serviu como um ultimato”, explica Wellisch.
Marcelo Silva, presidente do Instituto para Desenvolvimento do Varejo (IDV), que representa 76 varejistas, diz que as iniciativas de combate à ilegalidade são fundamentais para o setor.
“Infelizmente, ainda há empresas de comércio eletrônico que não aderiram nem às boas práticas do Conselho Nacional de Combate à Pirataria. Com esse novo parecer da Procuradoria, elas vão ter que reavaliar sua postura. Nossos associados já trabalham nessa direção”.
A consultora Ale Espírito Santo está sempre olhando as novidades em e-commerce. Ela costuma comprar diversos produtos pela internet, mas afirma que quando o assunto é smartphone fica preocupada. Seu medo é adquirir um produto ilegal e não conseguir reaver o seu dinheiro.
“Se, depois de comprar, eu descobrir que o produto não é homologado, como vou reclamar com o site? Se comprar em loja e pedir a troca já é difícil, imagina na internet”, questiona.
O Procon-SP está em fase final de elaboração de um termo de cooperação com a Polícia Civil de São Paulo e as empresas, que, entre outras coisas, garantirá reembolso total ao consumidor que comprar produto pirata.
“O termo prevê ainda a criação de um mecanismo de identificação de links com produtos ilegais e a obrigatoriedade de envio de notas fiscais junto com os itens”, antecipa Guilherme Farid, chefe de gabinete do Procon-SP.