Quinta-feira, 09 de Maio de 2024

Coluna Direito no Palco: ‘Epílogo Cinematográfico: Hollywood Encerra sua Greve Histórica’, por Gustavo Fortunato

2023-11-14 às 11:55
Foto: Reuters

Numa reviravolta histórica, após 118 dias de intensas negociações, a greve mais longa da história de Hollywood, protagonizada pelo Screen Actors Guild-American Federation of Television and Radio Artists (SAG-AFTRA), terminou com a assinatura de um acordo crucial com a Alliance of Motion Picture and Television Producers (AMPTP). O acordo, que encerra uma paralisação que afetou gigantes do entretenimento e tem implicações significativas para o mercado cultural.

No centro dessa greve, que começou em julho e se tornou a primeira paralisação dupla da indústria desde 1960, estavam as reivindicações dos atores por salários justos e a resistência ao uso crescente da inteligência artificial (IA) em suas performances. Enquanto a Writers Guild of America (WGA) já havia encerrado sua greve em setembro com um acordo histórico, o SAG-AFTRA continuava sua batalha, destacando a necessidade de proteções contra a interferência da IA em seus trabalhos.

Isso porque, em julho, os estúdios apresentaram uma proposta que, segundo eles, era revolucionária para proteger as representações digitais dos atores. No entanto, essa proposta não agradou ao SAG-AFTRA, que entendeu que a proposta, na verdade, era abusiva e permitiria que figurantes fossem digitalizados, pagos por um dia de trabalho, e transformados em personagens digitais usados “pelo resto da eternidade”. O impasse persistiu até o último fim de semana, quando o sindicato rejeitou a oferta final dos estúdios, especialmente devido às preocupações não resolvidas sobre a IA.

Na semana passada, a reviravolta aconteceu quando os estúdios concordaram, na terça-feira (07/11), em ajustar a linguagem de sua proposta. No geral, os atores conseguiram criar salvaguardas para proteger suas representações digitais e garantir compensação adequada pela reutilização de escaneamentos de IA, criando um precedente importante para a preservação dos direitos e interesses dos artistas num cenário audiovisual em constante transformação. Além da questão da IA, os atores conquistaram outras vitórias, como a reivindicação por pagamentos residuais mais justos em produções destinadas a serviços de streaming, bem como um reajuste de 7% na remuneração mínima da categoria.

Essas conquistas representam uma vitória significativa para os atores, que enfrentaram uma batalha não apenas por salários justos, mas também por proteção contra a crescente influência da IA em suas indústrias. Além disso, a greve foi um divisor de águas para o mercado cultural como um todo, demonstrando a disposição dos profissionais em lutar por condições de trabalho justas e atualizadas.

Olhando para o futuro, é possível que esta greve tenha repercussões duradouras. O setor do entretenimento, agora forçado a confrontar o impacto da IA em suas práticas, pode ver mudanças significativas nas políticas e regulamentações. A pressão exercida pelos sindicatos durante a greve, em meio a um cenário em que a inteligência artificial está cada vez mais presente, contribuiu para a assinatura de um acordo que pode influenciar futuras negociações e moldar o modo como a indústria lida com as transformações tecnológicas.

Com a retomada das produções, o acordo alcançado não apenas traz alívio imediato para a indústria cinematográfica, mas também lança luz sobre a necessidade de adaptação e equidade num cenário em constante evolução. A greve de 2023 pode ser lembrada não apenas como um episódio marcante na história de Hollywood, mas como um catalisador para mudanças mais profundas e progressistas na forma como os profissionais do entretenimento são tratados no futuro.

Coluna Direito no Palco

por Gustavo Fortunato

Advogado do Entretenimento, sócio fundador da FBC Consultoria Jurídica. Professor de pós-graduação e cursos livres sobre Propriedade Intelectual. Autor de livros e artigos sobre Direito Autoral. Mestre em Propriedade Intelectual e Transferência de Tecnologia para a Inovação pelo PROFNIT/UFPR. Pós-graduado em Propriedade Intelectual e Comércio Eletrônico pela Universidade Positivo e em Advocacia Contratual e Responsabilidade Civil pela EBRADI. Certificado nos cursos CopyrightX da Harvard Law School e U.S. Intellectual Property Law pela Stanford Law School. Pesquisador Sênior do Grupo de Estudos de Direitos Autorais e Industriais da UFPR (GEDAI/UFPR). Apaixonado por música e cinema.