há 2 horas
Giovanni Cardoso
Pesquisadores chineses identificaram uma nova cepa do vírus influenza D, originalmente presente apenas em animais, que demonstra capacidade de adaptação ao organismo humano. A descoberta acende um sinal de alerta na comunidade científica, embora ainda não haja confirmação de transmissão sustentada entre pessoas.
O estudo, publicado em 10 de outubro na revista Emerging Microbes & Infections, analisou a cepa D/HY11, isolada em bovinos do nordeste da China em 2023. De acordo com a equipe do Instituto de Pesquisa Veterinária de Changchun, liderada por Hongbo Bao, o vírus demonstrou capacidade de se replicar em células das vias respiratórias humanas e de se espalhar pelo ar em testes com furões, espécie usada como modelo para infecções gripais em humanos.
Testes laboratoriais indicaram que o D/HY11 se multiplicou eficientemente em células de várias espécies de mamíferos, incluindo humanos, cães, bovinos e suínos. Em experiências com furões, o vírus foi transmitido de indivíduos infectados para saudáveis sem contato direto, sugerindo potencial para transmissão aérea — um fator considerado relevante em pandemias respiratórias.
O influenza D foi identificado pela primeira vez em 2011, nos Estados Unidos, em suínos com sintomas gripais. Desde então, tornou-se comum em rebanhos bovinos e já foi detectado em diversos animais como cabras, ovelhas, cavalos, camelos e cães, com registros de circulação em vários continentes, incluindo América do Sul e Europa.
Segundo o artigo, a nova cepa apresenta uma capacidade elevada de infecção e "exibe tropismo no trato respiratório", ou seja, possui afinidade com células das vias aéreas de diferentes espécies. Isso pode facilitar o salto do vírus entre animais e humanos. Os pesquisadores observam que a polimerase viral — enzima responsável pela replicação do vírus — está mais ativa nessa cepa, o que pode favorecer sua disseminação.
A pesquisa, de acordo com o Metrópoles, também incluiu análises sorológicas de 612 pessoas no nordeste da China entre 2020 e 2024. Os resultados indicaram que 73% da população geral testada apresentou sinais de exposição ao vírus, taxa que subiu para 96% entre pacientes com sintomas respiratórios. Para os autores, isso sugere que o vírus pode estar circulando de forma silenciosa há alguns anos. Eles afirmam que "infecções leves ou assintomáticas podem estar contribuindo para a disseminação sem detecção".
Além da possível adaptação ao organismo humano, os cientistas também verificaram que a cepa D/HY11 é resistente à maioria dos antivirais utilizados contra a gripe comum. No entanto, drogas que atuam diretamente sobre a polimerase viral mostraram maior eficácia. Ainda assim, a resistência observada reforça a preocupação com o controle do vírus em caso de uma eventual disseminação mais ampla.
Apesar dos sinais de alerta, os pesquisadores destacam que ainda não há evidências de que o vírus esteja sendo transmitido de forma sustentada entre humanos. Eles pedem, contudo, atenção internacional. “O influenza D (IDV) pode ter adquirido a capacidade de transmissão de humano para humano durante sua evolução em andamento. As cepas atualmente circulantes já representam uma potencial ameaça panzoótica”, conclui o estudo.
Os autores ressaltam a falta de programas de testagem específicos para o vírus em qualquer país, o que compromete o rastreamento de sua circulação. Eles recomendam a ampliação da vigilância epidemiológica e mais pesquisas para avaliar os riscos à saúde pública.