há 12 horas
Rafael Guedes

A política catarinense, outrora marcada por um certo pragmatismo e foco no desenvolvimento, vive um momento de profunda transformação — e degradação. A trajetória do governador Jorginho Mello (PL) rumo à reeleição não é mais um projeto de governo para o estado, mas um espelho distorcido do pior do bolsonarismo nacional: um vale-tudo pessoal e ideológico que deixa Santa Catarina à própria sorte.
Assim como Jair Bolsonaro, em seu afã de permanecer no poder, adotou uma estratégia de queima de estoques — incluindo o envio de seus filhos aos Estados Unidos para atacar as instituições brasileiras e dinamitar a confiança na economia —, Jorginho Mello demonstra uma desconexão similar com o bem-estar da população que jurou governar. Suas ações recentes revelam um cálculo frio: o estado e seu povo são meros peões em um jogo cujo único prêmio é a sua reeleição.
O primeiro movimento do governador, e talvez o mais revelador, foi a abertura da chapa para Carlos Bolsonaro, o filho do ex-presidente, como candidato a senador. O gesto não é uma aliança estadual, mas uma submissão. É a anuência a um projeto nacional de poder que usa Santa Catarina como plataforma. A mensagem é clara: a lealdade à cúpula bolsonarista em Brasília vale mais do que qualquer nome local que pudesse agregar de fato ao desenvolvimento catarinense.
Essa subordinação tem um custo. Desvia o foco das reais necessidades do estado — como a crise no Programa Universidade para Milionário, os problemas na saúde e o atraso na infraestrutura logística — para um palco de guerras culturais e disputas ideológicas que pouco resolvem os problemas do cidadão comum.
Se a lealdade externa é ao clã Bolsonaro, internamente não há lealdade alguma. O governador tem deixado de lado aliados históricos com uma frieza que assusta até os mais veteranos da política local. Partidos que compunham sua base de sustentação foram ignorados no loteamento de cargos, que foi direcionado para criar um curral eleitoral fiel apenas a sua pessoa, não a um projeto de estado.
Enquanto o governador se dedica integralmente a costurar alianças nacionais, acalmar a base radical e garantir sua sobrevivência política, quem governa Santa Catarina? A resposta parece ser: ninguém. O estado navega à deriva, com questões urgentes sendo negligenciadas. A sensação que fica para a população é a de abandono. O barco está sem timoneiro porque o capitão está mais preocupado em garantir seu próprio assento no comando do que em traçar a rota mais segura e próspera para os passageiros.
O projeto de reeleição de Jorginho Mello é, portanto, um projeto de poder puro e simples. É um empréstimo da pior faceta da política nacional, que privilegia o personalismo, o conflito e a lealdade sectária em detrimento do interesse coletivo. Santa Catarina, um estado que se orgulha de seu pioneirismo e capacidade de gestão, está sendo reduzido a um laboratório de táticas eleitorais de alto risco.
A pergunta que todo catarinense deve fazer é: vale a pena pagar o preço de ter seu estado abandonado, suas instituições loteadas e seu futuro hipotecado a um projeto que não é seu? A história recente do Brasil já mostrou o desfecho trágico desse roteiro. Cabe aos catarinenses decidir se vão permitir que a mesma peça, agora em versão estadual, tenha um final igualmente amargo.
Artigo assinado por Rafael Guedes, jornalista e analista político.