Sábado, 28 de Setembro de 2024

Ponto de Vista: “Na escola, ter uma ação cultural que me proporcionou me emancipar foi muito importante”, revela ministra Margareth Menezes

2024-06-22 às 15:55
Foto: Divulgação

Em bate-papo exclusivo ao Ponto de Vista, programa apresentado por João Barbiero na Rede T de rádios do Paraná, na manhã deste sábado (22), a ministra da Cultura, Margareth Menezes, foi questionada se acreditava que poderia chegar ao cargo de ministra, sendo uma mulher negra, se não fosse uma renomada artista. “Da Cultura, a gente não sabe o que o futuro nos guarda. Mas, nunca imaginei, mesmo sendo artista, nos meus 36 anos de carreira, de em algum momento exercer um cargo público ou de destaque, como o de ministra. Por isso, agradeço ao presidente Lula, que conseguiu também me ver nesse sentido, de toda a minha história”, afirma.

A trajetória da artista, que acumula 17 obras lançadas, entre LPs, CDs e DVDs e já percorreu cinco continentes em 23 turnês internacionais nem sempre foi fácil. “Para chegar nesse lugar, não foi fácil. Chegou um período em que tiver que fazer minha própria gravadora, meu selo, que eu tenho há quase 15 anos. Vim também liderando uma organização social da Bahia, em Salvador, na periferia, de onde eu vim, há 20 anos, praticamente. Deixei o cargo para aceitar essa missão que o presidente [Lula] nos deu, uma organização que já tem um histórico, um reconhecimento, a Fábrica Cultural. Tudo isso foram travessias que, de alguma maneira, foram me preparando para esse momento”, relata.

Encontrei no Ministério da Cultura uma pasta bem desarticulada, muitas desconstruções das políticas, reduzida a uma Secretaria. Chegamos juntos lá eu, o Márcio Tavares [secretário executivo], o Cassius da Rosa [secretário executivo adjunto] e uma equipe e começamos a formatar toda essa renovação. Nesse sentido, acredito que ter tido a oportunidade de, na escola, naquele momento, ter uma ação cultural que me proporcionou me emancipar foi muito importante“, revela.

Para Margareth, se entendermos que a cada vez que se dá a oportunidade de alguém que já nasceu com algum talento ter a possibilidade de ter o fomento e de se emancipar, estaremos transformando não só a vida daquela pessoa, como da comunidade ao seu redor. “Toda vez que, por exemplo, alguém importante nasce numa cidade, a pessoa não nasceu importante, ela nasceu naquela cidade e, quando ele consegue se emancipar, ele transforma, leva toda aquela referência da cidade com ele. Todo mundo gosta de saber que aqui nasceu [alguém de renome artístico e cultural]. Quantas cidades, hoje, tiram possibilidades econômicas por alguém ter nascido naquela cidade, alguém importante?”, reflete. “O gestor deve entender o poder que a Cultura tem de fomentar a economia, transformar as vidas das pessoas e educar, porque a Cultura também educa”, emenda.

O Ministério da Cultura tem atuado com uma política para a economia criativa da indústria cultural. “Estamos fortalecendo esse olhar, para entender que a Cultura, fazer um festival, é trazer a oportunidade de circulação de renda e oportunidade para as pessoas trabalharem. Muitas pessoas vivem da cultura. Aquele pequeno grupo, aquele pequeno artista não está sozinho. Quando se fala em artista, entenda-se sempre que o artista é coletivo, o acontecimento artístico é coletivo”, enfatiza a ministra.

Margareth acredita que há uma perda muito grande no Brasil, diante da ausência de uma contrapartida econômica forte de um setor que emprega milhões de pessoas. “Mas estamos evoluindo bem, a partir desse momento, com fomento direto da Lei Aldir Blanc (lei 14.017/2020), que vai ficar até 2027. Todas as cidades que estão ligadas ao Sistema Nacional de Cultura recebem esse fomento direto, de uma ação do Governo Federal, por entendermos o valor que a cultura brasileira tem”, avalia.

A ministra destaca o desafio de envolver os mais jovens com a cultura, num momento em que a sedução do digital tem prejudicado a criatividade, até mesmo pelo advento das ferramentas que pretendem substituir a atividade artística pela inteligência artificial, que reproduz elementos diante de um repertório limitado tanto em imagens quanto em sons. “A Cultura tem muitas ferramentas que auxiliam na concentração, que auxiliam na concepção de você fazer com que a sua imaginação se materialize, porque é isso que o ensino da arte faz até o momento, quando você tem o talento, mas não sabe como materializar aquele talento, quando não sabe como fazer aquela poesia acontecer. Quando você começa a ter cursos de arte nas escolas, ou um curso de teatro, que mexe com figurino, com iluminação, com técnicas de vocal, tudo isso é ciência também e exige do ser humano que está na disposição de fazer aquele curso outras formas de pensar, fazer coligações, aprender a interpretar textos e aprender a se concentrar. Para você gravar uma música, um texto, você precisa se concentrar. Tudo isso são coisas que auxiliam na formação do ser humano”, analisa Margareth.

Segundo a ministra, esses cursos de arte e teatro são importantes na formação do indivíduo, mesmo para aquele que não venha a viver, profissional e financeiramente, da arte. “Ele vai levar essa organização mental, cerebral, para onde ele for”, complementa. Por isso, o Ministério da Cultura voltou a articular ações em conjunto com o Ministério da Educação – ambos foram uma pasta única entre 1953 e 1985, até que o MinC foi criado e separado do MEC. “A cultura é viva e é o próprio povo quem traz as transformações, as mudanças, as outras oportunidades, mas é necessário fazer essa ação para proteger, para fomentar a cultura popular, fomentar os ensinos de arte e cultura nas escolas.

Essa retomada do diálogo entre as pastas da Cultura e da Educação, para a ministra, é essencial porque, ao desmontar as possibilidades de uma formação artística, a Educação também perde um pouco. “A música comercial vai acontecer, porque independe disso, é todo um esquema que existe e as pessoas se preparam para isso. Não é à toa que uma Anitta e outras pessoas estão ali [em festivais internacionais], dançam, cantam. Mas a missão do governo é fomentar a Cultura de maneira geral, para que todos tenham oportunidades. Essa ação da retomada do Ministério da Cultura, recriando o que ficou durante seis anos sendo desconstruído, vai, com certeza, proporcionar que outros artistas também tenham a oportunidade de sair do Brasil”, afirma.

A participação do Brasil no G20 e no COP-30 atraem os olhos da comunidade internacional para a Cultura brasileira, na compreensão da ministra. “Para se ter uma ideia, lançamos uma linha de fomento para o cinema de ações bilaterais entre Brasil e produtoras internacionais, que quisessem fazer produções junto com produtoras nacionais, foi uma linha que lançamos no começo deste ano, junto com a Ancine, de R$ 300 milhões. Tivemos a procura de 47 países querendo fazer fomento com o Brasil. Isso fortalece outros aspectos da nossa cultura através do cinema. Acho que tudo isso vai finalizar fortalecendo toda essa nossa diversidade cultural, que é muito linda”, conclui.

Margareth cumpriu agenda em Ponta Grossa na sexta (21), onde participou 3º Encontro de Cultura do Interior do Paraná, no Cine-Teatro Ópera e também esteve na Santa Casa, que entregou a ela, simbolicamente, o Projeto Santa Arte, que proporciona aulas gratuitas de teatro para pacientes, familiares e colaboradores do Hospital Santa Casa. O projeto resulta de parceria entre a ABC Projetos Culturais e a Santa Casa de Misericórdia de Ponta Grossa, por meio da Lei de Incentivo à Cultura.

A Cultura foi uma pasta vinculada ao Ministério da Educação (MEC) até 15 de março de 1985, quando o então presidente José Sarney criou o Ministério da Cultura (MinC). Até essa data, o MEC era o Ministério da Educação e Cultura. Como a sigla já existia desde 1953 e estava consolidada, o C permaneceu em MEC. Quando Michel Temer assumiu como presidente interino, em 2016, extinguiu brevemente o MinC e o reincorporou ao MEC. Mas a decisão chegou a ser revista o ministério foi recriado. Ao ser eleito, o ex-presidente Jair Bolsonaro anunciou a extinção do MEC e incorporou suas atribuições ao recém-criado Ministério da Cidadania. A redução da pasta da condição de Ministério para Secretaria já tinha ocorrido em 1990, quando Fernando Collor de Melo vinculou a Secretaria diretamente à Presidência da República. Itamar Franco reverteu a mudança em 1992.

Confira a entrevista na íntegra

Ponto de Vista 

Apresentado por João Barbiero, o programa Ponto de Vista vai ao ar semanalmente, aos sábados, das 7h às 8h, pela Rede T de Rádios do Paraná.

A Rádio T pode ser ouvida em todo o território nacional através do site ou nas regiões abaixo através das respectivas frequências FM: T Curitiba 104,9MHz;  T Maringá 93,9MHz; T Ponta Grossa  99,9MHz; T Cascavel 93,1MHz; T Foz do Iguaçu 88,1MHz; T Guarapuava 100,9MHz; T Campo Mourão 98,5MHz; T Paranavaí 99,1MHz; T Telêmaco Borba 104,7MHz; T Irati 107,9MHz; T Jacarezinho 96,5MHz; T Imbituva 95,3MHz; T Ubiratã 88,9MHz; T Andirá 97,5MHz; T Santo Antônio do Sudoeste 91.5MHz; T Wenceslau Braz 95,7MHz; T Capanema 90,1MHz; T Faxinal 107,7MHz; T Cantagalo 88,9MHz; T Mamborê 107,5MHz; T Paranacity 88,3MHz; T Brasilândia do Sul 105,3MHz; T Ibaiti 91,1MHz; T Palotina 97,7MHz; T Dois Vizinhos 89,3MHz e também na T Londrina 97,7MHz.