há 4 dias
Giovanni Cardoso

O governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, como estrategista, é um perfeito Dick Vigarista da corrida presidencial brasileira. E nem dá para dizer que seja um azarado: recebeu de presente o governo do estado mais rico do País. Como militar, imaginar-se-ia que conhecesse ao menos um pouco de Teoria dos Jogos - cálculo de cenários, minimização de perdas, timing. Grande ilusão.
Tarcísio fracassou no impulso entreguista de aplaudir os movimentos de Eduardo Bolsonaro para, a partir dos Estados Unidos, impor um tarifaço que puniria empresas e empregos brasileiros, sabotando a economia nacional e, em especial, São Paulo, a qual deveria defender. Vestir o boné do MAGA naquele momento não foi apenas um gesto infeliz; foi um sinal de desalinhamento com os interesses objetivos do estado que governa.
Não satisfeito em tropeçar no mesmo tema, foi atrás de novos fracassos. Convidou um representante da Embaixada norte-americana para “negociar” o inegociável. Não avançou um milímetro e ainda levou esculacho público do Bananinha nas redes. O padrão se repetiu quando tentou, em Brasília, costurar anistia para golpistas do 8/1: outra aposta mal calibrada, outro desgaste profundo, outro recibo de ignóbil estratégico.
Agora, Tarcísio volta ao teatro dos erros ao exonerar, ainda que temporariamente, seu secretário de Segurança para devolvê-lo ao Congresso como relator do projeto federal que busca impor regras mais duras contra facções criminosas. Independentemente do desfecho da votação, um derrotado já há: o próprio governador. Ao deslocar seu auxiliar para uma missão política de alto risco, Tarcísio acoplou sua imagem a um relatório que nasceu torto e está sendo emendando sob constrangimento público.
Em menos de 24 horas, Guilherme Derrite apresentou um texto que, em essência, reeditava a lógica da PEC da Blindagem (ou da Bandidagem, para quem prefere chamar as coisas pelo nome): submeter a Polícia Federal ao crivo de governadores e deslocar o enfrentamento às facções para a Justiça Estadual, esvaziando a competência federal. Em termos práticos, para investigar facções no Rio - e as possíveis conexões de agentes públicos com esses grupos - a PF teria de pedir autorização justamente a quem poderia ser alvo. Uma piada, se não fosse suspeita.
A reação foi fulminante: instituições, especialistas e até aliados identificaram o retrocesso. Derrite já vai na quarta versão do relatório. Mude o verbo, ajuste a vírgula, nada apaga o espírito original: não era enfrentar o crime com inteligência, integração e asfixia financeira; era empurrar areia para o mecanismo federal que tem capacidade técnica e alcance interestadual e transnacional. O contraste com operações recentes - nas quais a cooperação entre PF, PRF, Receita e Ministério Público destravou trilhas de lavagem em setores como combustíveis, logística e serviços - só tornou o equívoco – ou o interesse -, ainda mais evidente.
No balanço, Tarcísio coleciona jogadas perdidas: o aceno à pauta MAGA contra a economia paulista; a ida conversa com secretário de negócios norte-americano sem resultado e com humilhação pública; a tentativa de anistia aos golpistas; e, por fim, o patrocínio a um relatório que fragiliza o enfrentamento nacional às facções.
Governar São Paulo exige menos dublê de vilão de desenho e mais estratégia de gente grande: calcular externalidades, proteger cadeias produtivas, fortalecer a coordenação com a União no combate ao crime organizado e parar de transformar política pública em palco de bravata. Porque, no fim, quem paga a conta das trapalhadas não é o personagem; é o povo paulista.
Oliveiros Marques é sociólogo, publicitário e comunicador político
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