Criado há 83 anos, o 2º Grupamento de Bombeiros (GB) de Ponta Grossa atende a 40 municípios paranaenses e presta atendimento diário a mais de 1,2 milhão de pessoas na região. Entre as ocorrências mais atendidas, estão acidentes de trânsito, afogamentos, quedas, incêndios e tentativas de suicídio. Somente no ano passado, os bombeiros fizeram quase 18 mil atendimentos. Desse montante, alguns foram mais marcantes, seja pela gravidade ou pela forma como ocorreram. Conheça a seguir três histórias que dão uma pequena ideia do trabalho heroico realizado por esses heróis.
Teste de paciência e de fé – Sargento Portela
Poucos meses antes de se aposentar, o sargento Portela passou por uma das experiências mais marcantes de sua carreira. É ele mesmo quem explica: “Alguns trabalhadores estavam executando uma obra de galeria pluvial. Eles abriram uma vala em todo o espaço da rua para fazer o manilhamento, com uma profundidade de aproximadamente seis metros. Devido à falta de escoramento, um trabalhador ficou soterrado”, conta.
Quando o 2º GB chegou ao local, os bombeiros identificaram o risco de um novo desabamento. A situação colocou o batalhão em uma encruzilhada: fazer o atendimento somente após um novo escoramento, pensando na segurança da guarnição, ou entrar para, ao menos, amenizar o sofrimento da vítima, mesmo com o risco de um novo desabamento? Portela relata que optou por dividir a equipe e fazer com que apenas ele e um companheiro entrassem para realizar o resgate.
“Eu joguei o meu companheiro para fora do buraco e ia sair também, quando um enorme bloco de terra caiu nas minhas costas” (Sargento Portela)
Quando estavam perto de concluir a operação, ocorreu um novo desmoronamento. “O pessoal começou a gritar para que saíssemos. Eu não lembro, foi tudo muito rápido, mas o meu companheiro conta que eu joguei ele para fora do buraco e ia sair também, quando um enorme bloco de terra caiu nas minhas costas”, relata.
O sargento permaneceu no buraco com a vítima até que novas escoras fossem providenciadas. “Para piorar tudo, de repente começou a chover. Tudo isso foi para testar a nossa paciência e a nossa fé. As pessoas pediam para arrancarmos ele, mesmo que perdesse o pé. Mas, para nós, bombeiros, essa é a última saída”, explica.
Após cinco horas de operação, a vítima foi resgatada com leves escoriações.
Trabalhando e rezando junto – Subtenente Avelar
Durante muito tempo, o subtenente Avelar trabalhou como salva-vidas nas praias do Paraná durante o verão. Certa vez, antes de descer para o litoral, ele convidou um cunhado para ir a um clube da cidade comemorar o final do ano antecipadamente. “Lá tinha um garotinho, de uns cinco anos mais ou menos, que sabia que eu era bombeiro e queria mostrar que sabia nadar”, conta.
Depois que o menino deu alguns pulos e mergulhos, o pai da criança correu em direção ao subtenente. Desesperado, ele estava com outra criança, inconsciente, no colo. “Eu perguntei o que tinha acontecido, e ele disse que seu filho tinha mergulhado na piscina e visto um menininho dormindo lá embaixo”, recorda.
“Ele me disse que o seu filho tinha mergulhado na piscina e visto um menininho dormindo lá embaixo” (Subtenente Avelar)
Rapidamente, Avelar e o cunhado começaram a ressuscitar a criança. “Ela já estava cianótica, com os lábios roxos, mas decidimos investir mesmo assim”, relata. Foram cerca de 30 minutos de angústia e de muito trabalho, até que o menino voltou a dar sinais de vida. “Você vai fazendo os procedimentos e rezando ao mesmo tempo para que a pessoa reaja”, confessa.
Quando o Serviço Integrado de Atendimento ao Trauma em Emergência (Siate) chegou, a criança já estava no colo do bombeiro, chorando, mas viva e bem. “Isso já tem uns 20 anos, e até hoje, quando ele me encontra, vem me agradecer por eu ter salvo a vida dele”, revela.
Controle emocional à prova – Cabo Mauro Pereira
Entre as várias ocorrências que já atendeu, foi uma recente a que mais marcou o cabo Mauro Pereira. Um jovem ameaçava suicidar-se do alto de uma máquina de perfuração. Segundo contou, ele tinha sido vítima de bullying no trabalho e dizia que queria se matar para acabar com aquilo e para fazer as pessoas que o incomodavam se sentirem culpadas.
A negociação com o rapaz foi difícil. Como ele estava no alto, o acesso teve que ser feito por baixo, exigindo um grande esforço físico do bombeiro. “Eu tinha que ficar olhando para cima o tempo todo. Foi muito cansativo. Até que ele aceitou que eu me aproximasse por meio de uma plataforma mecânica”, relembra.
“Em alguns momentos da conversa, eu fugia da minha parte profissional. Era a pessoa Mauro ali, pedindo para que ele desse mais uma chance a si mesmo” (Cabo Mauro Pereira)
Durante as várias horas de negociação, o bombeiro tentou estabelecer uma conexão com o rapaz. “Primeiro, você ouve, deixa que a pessoa conte toda a história. E, depois, você começa a direcionar a conversa, mostrar os pontos positivos e dissuadi-lo da ideia de se matar”, explica.
Depois de muito tempo de conversa, o cabo percebeu que era hora de ser mais incisivo na negociação. “Era um dia de inverno, mas o sol estava bem quente. Como fazia horas que ele estava lá sem comer, ele estava dando sinais de hipoglicemia. Além disso, faltava pouco para escurecer, o que ia dificultar ainda mais o trabalho”, narra.
Aos poucos, mostrando o quanto a família sofreria com aquela decisão, o cabo convenceu o rapaz a desistir do suicídio. “Em alguns momentos da conversa eu fugia da minha parte profissional. Era a pessoa Mauro ali, pedindo para que ele desse mais uma chance a si mesmo”, lembra. Após cinco horas de operação, o rapaz concordou em descer. “É preciso pensar positivo, ter o controle emocional e ir até o fim”, afirma.
Por Camila Delgado | Foto: Divulgação